São Paulo
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Canteiro de obra no Rio de
Janeiro, em foto de abril de 2017. YASUYOSHI
CHIBA AFP
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Os vídeos das delações dos funcionários da ODEBRECHT,
divulgados após o fim do sigilo dos processos investigados pela Operação Lava Jato, revelam como a empresa
operava para pagar as propinas aos agentes públicos brasileiros. Eles contam
como o DEPARTAMENTO DE OPERAÇÕES
ESTRUTURADAS da empresa, responsável pelos pagamentos ilícitos, foi criado,
a forma como os codinomes eram escolhidos e de que maneira os encontros para a
entrega do dinheiro eram combinados.
[1] A CRIAÇÃO DO DEPARTAMENTO DA PROPINA
Em seu depoimento ao juiz Sérgio Moro, Marcelo Odebrecht, ex-presidente do grupo,
conta que tomou a decisão de criar um setor específico para fazer os pagamentos
ilegais aos políticos e aos fiscais.
"Até
a década de 80, os pagamentos não contabilizados eram feitos nas próprias
obras. Isso de certo modo contaminava toda a contabilidade da empresa, levava à
ineficiência fiscal e tinha um descontrole total", contou ele. Esse setor foi organizado da forma
como se conhece atualmente por volta de 2007, por Hilberto Mascarenhas, que
afirma ter sido avisado por Marcelo que seria o responsável por estruturar a
área que controla a saída das propinas.
"Essa área nunca havia existido de
forma organizada. [Antes] era uma operação muito insegura, baseada em trabalhar
com doleiros e estava gerando uma série de inseguranças para a empresa." A
área aparecia no cronograma da empresa como setor de Operações Estruturadas.
"Marcelo queria um nível de crescimento para a empresa. E ele sabia que
para que a empresa crescesse, na forma que operava, ia precisar aumentar esse
tipo de forma de trabalho."
[2] O SISTEMA DE CONTROLE DE PROPINA
Hilberto Mascarenhas conta que, em 2007, quando o volume de propinas
circulando começou a ficar muito alto, o departamento de Operações Estruturadas
teve de criar um sistema de controle. "Comecei achando que precisava de um
sistema de gestão de finanças e de tesouraria, onde tinha o controle do caixa,
o controle de contas a pagar e administração do saldo. Aproveitamos o sistema
de tesouraria da empresa", conta o delator.
O pedido de propina era
registrado, neste programa, como "contas a pagar". Quando o dinheiro
era entregue ao beneficiário, se transformava em uma ordem de pagamento.
O
beneficiário do pagamento irregular era registrado como "fornecedor",
local, onde em um sistema normal de gestão de finanças, entraria o nome de quem
prestou um serviço.
O equipamento era mantido em um datacenter na Suíça, onde
havia um backup. Todo ano, Mascarenhas mandava apagar o que era registrado no
semestre anterior.
[3] COMO O ESQUEMA ERA ORGANIZADO
Benedicto Barbosa Junior era o chefe de Hilberto Mascarenhas. Era ele
quem dava o aval para o pagamento das propinas, ao lado de Marcelo Odebrecht.
Ele conta como o esquema era organizado. Existiam sete executivos subordinados
a ele, que eram os diretores superintendentes. Eles dividiam a
operação de acordo com seus Estados de influência. Abaixo deles
existiam os diretores de contrato, responsáveis pelas obras da empresa. Eram
eles que pediam aos seus superiores a liberação da propina, que poderia ser
para um fiscal público, que em troca do dinheiro liberaria a obra, ou para um
político local, capaz de aprovar um aditamento de contrato.
"A gente não ficava discutindo se era muito ou pouco [o valor]. A
única condição é que cada executivo deveria manter um centro [de operação] que gerasse
resultado e não levasse prejuízo”, disse Benedicto. No caso das
propinas relacionadas a obras, ele diz que o dinheiro da propina saia do
próprio contrato. Nenhuma propina era paga a obras com dívidas com a Odebrecht,
por decisão de Marcelo. "O dinheiro saia de dentro do resultado da obra. E
isso era encaminhado para um sistema que alimentava e gerava autorizações para
que fossem, ou mensalmente ou quinzenalmente, feitos saques para os pagamentos
ilícitos."
[4] O MAPA DAS DOAÇÕES
Os diretores superintendentes também traziam o pedido de pagamentos não
conectados especificamente a uma obra, como o de políticos proeminentes que
pediam doações para campanha, por exemplo.
Esses pedidos também eram feitos
pelos políticos diretamente a Marcelo Odebrecht ou Benedicto.
Havia uma
preocupação da empresa de não aparecer nos jornais como o maior doador de
campanhas do país.
Por isso, fazia uma mescla de tipos de doações: a oficial da
empresa, doações oficiais deitas por parceiros, como a cervejaria Itaipava, e a
feita via caixa dois.
"As três se completavam para que a gente ficasse com
nosso volume atendido, mas sem ficar com a doação oficial totalmente
exposta". Existia um limite de doações por candidato, que era nacional.
Assim, um candidato de um Estado não receberia mais do que o de outro Estado.
Se o candidato pedisse acima desse limite, o valor teria que ser repassado ou
por meio de um parceiro ou por caixa dois.
Ele afirma que, dos casos que ele
cuidou, nunca houve caso de político que recusasse a proposta de receber via
caixa dois.
Ele diz ainda que todas as doações eram feitas a pedido dos
próprios políticos e nunca voluntariamente pela empresa.
[5] O CAMINHO DA AUTORIZAÇÃO
Benedicto ou Marcelo Odebrecht autorizavam o pagamento. E ele era
encaminhado para Isaías Ubiraci, outro executivo do departamento de Operações
Estruturadas. A autorização era feita por email, geralmente, ou por telefone.
Depois de autorizado, o funcionário que combinara a propina com o agente
público entrava em contato com uma secretária, chamada Lúcia, para combinar o
pagamento.
"A Lucia passava um endereço e uma senha para o meu executivo,
que passava para a autoridade ir buscar o dinheiro", conta Benedicto.
[6] A ESCOLHA DOS APELIDOS
Apesar de toda organização do esquema, um beneficiário da Odebrecht
poderia ter dois ou mais codinomes, assim como um codinome poderia se referir a
mais de uma pessoa, já que o codinome era, geralmente, dado pelo funcionário da
Odebrecht que tinha contato com o recebedor da propina.
E esses agentes não se
conversavam. Segundo o executivo, os codinomes podem variar de acordo com
características físicas, local de atuação do político ou qualquer outra
informação que os executivos tivessem sobre o beneficiário.
O apelido foi
escolhido por causa de um parentesco distante entre Moreira Franco e o
ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht, Cláudio Melo Filho,
que intermediava os contatos com políticos no Rio de Janeiro.
Nas planilhas da Odebrecht constam apelidos insólitos, como Viagra (Jarbas
Vasconcelos, deputado federal) ou Amante (Gleisi
Hoffmann, senadora).
Alguns políticos são identificados por mais de um
codinome, casos do senador Lindbergh Farias (Lindinho e Feio), do governador de Goiás, Marconi Perillo (Patati e Padeiro), do
ex-senador Sérgio Guerra (Batalha e Chorão) e GLEISI HOFFMANN, que, além de Amante, também era chamada de Coxa.
[7] A ENTREGA DO DINHEIRO
Benedicto Junior conta que após o executivo ISAÍAS UBIRACI receber a autorização do pagamento por parte dele ou
de Marcelo Odebrecht, uma secretária era avisada. Ela programava o pagamento e
era passava uma senha para o responsável da Odebrecht por
combinar a propina.
Hilberto Mascarenhas, responsável pelo departamento de
Operações Estruturadas, conta que no início a entrega era feita numa espécie de
escritório gerida por uma pessoa da própria empresa.
Mas o esquema mudou depois
que houve um assalto no local. "Começou a ter problema, porque tinha gente
que não aparecia [para retirar a propina] e o dinheiro sobrava. Aí teve um
assalto, em que esse funcionário perdeu mais de 7 milhões e teve que
pagar", conta.
Depois, o próprio beneficiário do dinheiro passou a
escolher o local. Quando o portador do dinheiro chegava, o receptor tinha que
dizer a senha combinada, ou não recebia.
[8]
SETE HOMENS E NENHUM SEGREDO
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