quarta-feira, 23 de julho de 2014

[25] MARANHÃO - MEMÓRIA DA INDUSTRIALIZAÇÃO - DE VOLTA À MANCHESTER DO NORTE. Autor: Marcos Fábio Belo Matos [23jul2014]

Edição pedagógica: Ronald de Almeida Silva; e-mail: ronald.arquiteto@gmail.com
revisão_02

SÉRIE MEMÓRIA MARANHÃO INDUSTRIAL

Nota do Editor: Os textos originais (que podem ser consultados nos endereços eletrônicos citados) não contém (i) numeração de capítulos, (ii) negritos, (iii) textos entre [colchetes]; (iv) tabelas e (v) destaques de palavras na cor amarela, os quais foram acrescidos para maior facilidade de leitura e melhor fixação mnemônica.

"Maranhão Industrial" em discussão


O professor doutor Marcos Fábio apresentou, na última quinta-feira (18/10/2012), na UFMA - Campus Imperatriz - seu projeto de pesquisa:
"De volta Manchester do Norte: Apagamentos e reiterações do "Maranhão Industrial"
no I Seminário Local do PET/Conexões e I Simpósio do NUPFARQ.
O projeto visa analisar as estratégias discursivas empreendidas nessa nova 'retomada' do crescimento industrial do Maranhão. Com este trabalho, o professor de comunicação, quer mostrar as semelhanças e diferenças entre o discurso da primeira fase da industrialização no Maranhão, ocorrida no final século XIX e esta nova fase, iniciada em 2010.

TEXTO 1: ARTIGO ACADÊMICO
DE VOLTA À MANCHESTER DO NORTE: APAGAMENTOS E REITERAÇÕES DO MARANHÃO INDUSTRIAL

Marcos Fábio Belo Matos [edição 2013]
Universidade Federal do Maranhão - UFMA
[Nota 1] Professor do Curso de Comunicação Social – Jornalismo, da UFMA – Campus Imperatriz.
Doutor em Lingüística  e Língua Portuguesa pela Unesp-Araraquara. Coordenador do Grupo de Pesquisa de Mídia Jornalística (G.Mídia), desenvolvendo o projeto de pesquisa “Representações Discursivas na Mídia”.
FONTE 1: http://pt.scribd.com/doc/124544703/artigo-mfabio1
RESUMO:
Este trabalho busca analisar as estratégias discursivas empreendidas nessa nova “retomada” do crescimento industrial do Maranhão, tentando perceber como se dão tanto o apagamento do malogrado epíteto de “Manchester do Norte”, atribuído à cidade de São Luís no final do século XIX, quanto a reiteração das estratégias de positivação do discurso do industrialismo: a deificação da máquina e das estruturas industriais, o tom ufanista e redentor dos discursos pró-industrialização e o descritivismo empregado nas referências às indústrias que chegam ou chegarão, exatamente as mesmas características verificadas no primeiro ciclo de industrialização do estado.
PALAVRAS-CHAVE: Manchester – Discurso - Industrialização - Maranhão.
ABSTRACT:
KEY-WORDS:
FONTE 2: http://www.scribd.com/fullscreen/124544703?access_key=key-206k20cokt72p44x59g0&allow_share=true&escape=false&view_mode=scroll



  1. INTRODUÇÃO:

1.1. No final do século XIX, o Maranhão viu surgir, de forma bastante repentina, uma nova formatação para a sua realidade: de estado agrícola, escravocrata e dependente das exportações, ele passou, como num passe de mágica, a ser considerado um estado industrial. Foi tão repentino esse movimento que o historiador Jerônimo de Viveiros cunhou duas expressões célebres para designá-lo: “loucura industrial” e “vertigem das fábricas”. No seu canônico [livro/compêndio] História do Comércio do Maranhão (volume 2), ele registrou o cenário para que isso acontecesse:
“Por tudo isso, no próprio ano de 1888, a desvalorização da fazenda agrícola maranhense atingia 90%.(...) Das fazendas afastavam-se os senhores com a mesma ansiedade com que os ex-escravos deixavam os ranchos do seu cativeiro. Êstes tinham horror do passado; aqueles, mêdo do presente.”
(...) A maioria [dos donos de fazendas] desertou da luta, aceitando os 10% do valor da propriedade, que lhe oferecia o vendeiro de encruzilhada ou o negociante da povoação. Fixou-se em São Luís, onde se deixou arrastar na vertigem das fábricas, empregando nelas o dinheiro apurado.Foi vítima da loucura da época – transformar o Maranhão agrícola em Maranhão industrial. (VIVEIROS, 1954, v.2, p.558)

1.2. Outro intelectual, este inserido diretamente no cenário daquela “revolução‟, Fran Pacheco, num tom jocoso e satírico, também designou a enxurrada de fábricas que se espalharam pela capital do Maranhão; chamou-a de “disenteria fabriqueira” (PACHECO, 1922). Fran Pacheco foi um intelectual que participou do que a história cultural maranhense denomina de “Novos Atenienses”, um grupo de professores, jornalistas, funcionários públicos, poetas e outros intelectuais, que viveram no Maranhão do início do século XX, e é considerada a terceira geração dos intelectuais revestidos pelo beletrismo e pela cultura do que restou da Athenas Brasileira (MARTINS, 2006). [ver nota 2].

1.3. Este cenário que o Maranhão (notadamente, com mais ênfase, a sua capital) viu se apresentar mudou a sua geografia, alterou a sua concepção de diversão, a sua relação com os beneficiamentos pessoais, enfim transformou-o de bucólico em moderno. Mas essa transformação, como uma prestidigitação, durou pouco, muito pouco.

1.4. Todo o primeiro ciclo da industrialização maranhense não passou de poucas décadas: iniciou-se no final da década de 1880 e apagou-se antes de iniciarem-se os anos de 1920.

1.5. O que ficou desses tempos foram, principalmente, as chaminés e as carcaças das fábricas, que se espalham principalmente pela capital, São Luís, algumas reformadas e destinadas a outros estabelecimentos; outras simplesmente abandonadas, como marcas de um tempo áureo [ver nota 3] ...que retorna agora!

1.6. Quase cem anos depois da “loucura industrial”, o Maranhão vem sendo, novamente, invadido por um surto de industrialização, que tem como carro abre-alas a instalação, no município de Bacabeira, a 58 km de São Luís, da refinaria Premium I, “a maior refinaria do Brasil e a quinta maior do mundo”, como informa o vídeo produzido pela Petrobrás, a proprietária do empreendimento e que será estudado neste trabalho.

1.8. Este trabalho tem, dessa forma, a intenção de analisar os dois discursos da industrialização do Maranhão e ver o que eles têm, à luz da Análise de Discurso, de convergentes e divergentes: descortinar os seus sujeitos, dimensionar as relações interdiscursivas que se verificam nesse novo discurso da industrialização maranhense, perceber como a memória discursiva da Manchester do Norte” é reiterada ou negada e apontar qual o tom com que ele é publicizado.

2. O NOVO “MARANHÃO INDUSTRIAL”: PASSADO E PRESENTE, MAS SEM METONÍMIA.

2.1. No final do século XIX, nascia um novo Maranhão. A partir de 1870, o estado passa a viver um processo de crise econômica. A quebradeira na agroexportação, culminada com a abolição da escravatura, fazem a economia maranhense desabar.

2.2. Como conseqüência, as propriedades rurais são abandonadas, vendidas por bagatelas a oportunistas e se verifica um êxodo do campo para a capital do Estado ou para o Rio de Janeiro, São Paulo e, num fluxo posterior, para o Norte (Belém e Manaus), atrás das riquezas proporcionadas pela borracha.

2.3. O capital levantado com a venda das propriedades é então empregado, de maneira despreparada e insipiente, na industrialização, seguindo a tendência nacional da época. Analisando tal situação, Reinaldo Júnior (1999, p. 69-70) explica:
Ao mesmo tempo em que [a industrialização] foi desafogo para os capitais ociosos que não viam na lavoura negócio rendoso, foi fruto do excesso de capitais, cuja raiz foi o “Encilhamento”, política econômica de fundo financeiro, posta em prática pelo governo republicano recém-instalado.

2.4. Esse surto industrial trouxe uma nova face ao estado. De uma hora para outra, surgiram fábricas, chaminés, maquinários, operários estrangeiros (sobretudo ingleses), equipamentos modernos como o telefone, o telégrafo, a máquina de costura, os bondes puxados a burro, a bicicleta, o fonógrafo, o cinematógrafo, a máquina de costura, o automóvel e tantos e tantos outros artefatos da modernidade.

2.5. E a pequena São Luís do Maranhão, que até então era conhecida como a Athenas Brasileira, a cidade dos poetas, escritores e jornalistas de esmerado beletrismo, passou a se chamar Manchester do Norte [ver nota 4]

2.6. Como registra Borralho (2009, p.40), nas notas da sua tese:
“Manchester do Norte foi uma expressão recorrente utilizado (sic) na segunda metade do século XIX durante a instalação do parque têxtil em São Luís em decorrência da crise da agroexportação.”

2.7. Nessa época, a cidade recebeu a imensa maioria das 27 fábricas que o Maranhão viu serem abertas, no período de 1888 a 1895, distribuídas da seguinte forma:
Ø  10 indústrias de fiação e tecidos,
Ø  1 de fiar algodão,
Ø  1 de tecido de cânhamo,
Ø  1 de tecido de lã,
Ø  1 de cerâmica,
Ø  4 de pilar arroz,
Ø  2 de pilar arroz e fazer sabão,
Ø  1 de sabão,
Ø  2 de açúcar e aguardente,
Ø  1 de meias,
Ø  1 de fósforo,
Ø  1 de chumbo e pregos,
Ø  1 de calçados. (TRIBUZZI, 2011,p. 47)

2.8. Dessas [27 indústrias] 17 eram Sociedades Anônimas e 10 de particulares. As mais importantes foram:
Ø  Companhia de Fiação e Tecidos Maranhense,
Ø  Companhia Progresso Maranhense,
Ø  Fabril Maranhense,
Ø  Industrial Maranhense,
Ø  Lanifícios Maranhense; e a
Ø  Companhia de Fiação e Tecidos Rio Anil, cuja notícia do lançamento da pedra fundamental é objeto deste estudo.

2.9. A rápida industrialização maranhense foi encampada, à época, por um discurso modernizador, empreendido principalmente pelo jornal “Pacotilha”, o mais importante novidadeiro‟ do estado, mas também verificado em sujeitos políticos, religiosos, professores, profissionais liberais e já demonstrado, com mais detalhe, em outro texto nosso (MATOS, 2011).

2.10. Fazendo uma alusão a esses sujeitos, o professor [doutor] e sociólogo José de Ribamar Caldeira, na sua tese de doutorado, “A implantação da indústria no sistema agro-exportador maranhense (1875 - 1895)”, (CALDEIRA apud CORREIA,2006) apelidou de “fabrilistas” os partidários da implantação das fábricas no Maranhão.

2.11. Os fabrilistas são um exemplo de sujeitos que implantam um discurso modernizador de natureza efusiva, servindo como anteparo àqueles que, por ventura, pudessem querer se contrapor a esse movimento do progresso em terras timbirenses.

2.12. Essa tão propalada industrialização do Maranhão no apagar do século XIX foi, na verdade, uma ação que se restringiu, quase que totalmente, à capital do estado, com poucas ocorrências em outros municípios. Talvez como São Luís, apenas o exemplo de Caxias, que também viveu uma era de prosperidade na mesma época, registrada no livro Entre a Tradição e a Modernidade: a Belle Époque Caxiense”, da professora Jordania Maria Pessoa, da Universidade Estadual do Maranhão.

2.13. Segundo a autora, no momento em que se dava o surto industrial na capital, também a pequena Caxias via aparecer uma fábrica têxtil, a Companhia Industrial Caxiense, fundada em 1883 e cujos trabalhos começaram em 1887-1888, com 50 teares e 68 operários, treinados por um técnico inglês, William Card (PESSOA, 2009).

2.14. Mais outros beneficiamentos modernos surgem na paisagem caxiense, como registra Pessoa (2009, p. 54):
Decorrente dessa nova mentalidade, o fim do século em Caxias foi circundado de inúmeras iniciativas empreendedoras. Foram criadas mais três fábricas de tecidos, uma Companhia Industrial Agrícola e uma de bondes, uma Companhia para Navegação do Alto Itapecuru, a Usina Agrícola Caxiense, Companhia para exploração de linha telegráfica e de telefone e uma Companhia das Águas.

2.15. Essa como que “industrialização por metonímia” não é o que promete o Governo do Estado do Maranhão, nesse novo surto industrial [pós-2009]. (...) estão anunciados empreendimentos nos municípios de:

1.AÇAILÂNDIA (que vai receber a Aciaria do Grupo Ferronorte),
2.ALDEIAS ALTAS (onde está sendo instalado o Grupo TG Agro, produtor de álcool),
3. BACABEIRAS (Refinaria Premium I, da Petrobras) [lançada em 15/01/2010; ver item 4.1.]
4.BALSAS (com a implantação da Notaro Alimentos, empresa do ramo avícola),
5.CAPINZAL DO NORTE (de exploração de gás natural),
6.CAXIAS (que vai ter a fábrica da Schincariol, já existente, ampliada),
7.CENTRO NOVO DO MARANHÃO (que vai ser a sede da mineradora Jaguar Mining, produtora de ouro),
8.GODOFREDO VIANA (recebedor da Mineradora Aurizona, de extração de ouro),
9.IMPERATRIZ (com a implantação da fábrica da Suzano Papel e Celulose),
10. SÃO RAIMUNDO DO MARANHÃO (ampliação da indústria do Grupo Agro Serra, produtor de álcool).
OBS: Tabela inserida pelo Editor para registro dos municípios em ordem alfabética. Texto conforme original.

2.16. Há outros empreendimentos de menor envergadura também prometidos para o estado. Ao todo, os recursos a serem injetados nessa “nova revolução industrial” que afetará o Maranhão são da ordem de R$ 100 bilhões [ver nota 5].

2.17. Na mensagem encaminhada à Assembleia Legislativa [em 2011], em que faz um balanço da sua gestão, a governadora do estado, Roseana Sarney, registra este momento auspicioso que o Maranhão vive:
O cenário delineado para atuação do governo se organiza numa perspectiva de um maior crescimento econômico e social do Estado, tendo como fundamento a implementação de uma estratégia que vai intervir nas relações entre duas grandes forças que dinamizam a economia estadual.
A primeira força terá como resultante da ação governamental os aportes de grandes empreendimentos econômicos, realizando investimentos estruturantes, que vão alavancar o crescimento estadual. Muitos desses empreendimentos se encontram em fase de implantação ou já implantados, enquanto outros cogitam construir complexas plantas industriais nos mais diversos segmentos dos negócios, em todo o território estadual.
Os números previstos para esta primeira década são superlativos – cerca de 100 bilhões de reais, em investimentos públicos e privados com capacidade de ofertar até 237 mil empregos nos próximos cinco anos. Por este caminho o Maranhão se coloca diante de uma rara oportunidade de estabelecer uma conexão com o futuro.
Para isso o governo terá que empreender um esforço vigoroso na captação de novos investimentos e na criação de um forte mercado consumidor, capaz de gerar muitos empregos, renda e trabalho para os maranhenses. (MARANHÃO, 2011, p. 14)

2.18. Será que este novo Maranhão que se descortina, muito vinculado à força da industrialização, tem alguma relação, em termos de discurso, com aquele outro Maranhão oitocentista, que viu chegarem fábricas e toda a simbologia que as rodeava?

3. A MANCHESTER DO NORTE: APAGAMENTO E REITERAÇÃO

3.1. Quando ocorreu a primeira industrialização maranhense, os sujeitos discursivos revestiram seus enunciados de um tom efusivo, ufanista. Capitaneados pela Pacotilha, cada passo dado rumo à concretização das fábricas era coberto de entusiasmo, numa espécie de eco dos muitos discursos dos fabrilistas, que se distribuíam por todos os cantos da sociedade (no serviço público, na docência, na política, na literatura, na religião, no comércio e, claro, na indústria recém-chegada).

3.2. É o que fica comprovado nesse fragmento do jornal, registrando o que seria, no dia seguinte, a cerimônia de lançamento da pedra fundamental da Companhia de Tecidos Rio Anil, a maior empresada capital e de todo o estado, nessa época:
“Uma era de prosperidade para a Pátria Maranhense que de há certo tempo para cá vai despertando do marasmo, da indiferença em que permaneceu longos anos, da atrofia, com o organismo depauperado pelos vícios da escravidão.As fábricas surgem de toda a parte e com elas o despertar de uma vida nova, cheia de atividades, urgida pelo progresso, prometendo-nos um futuro bonançoso que compense a esterilidade do passado.O dia de amanhã [do lançamento da pedra] ficará para sempre nos anais do nosso Estado.” (Pacotilha, de 23.08.1891; apud ITAPARY,1995, p. 27)

3.3. Como se pode perceber é um discurso de tom profético, apontando para um “futuro bonançoso” sem as marcas da pobreza e da escravidão – depois de 1870, o Maranhão mergulhou numa profunda crise econômica, e esse rasgo de esperança está prenhe de todos os traumas recentes.

3.4. Esse discurso não ficava só nos jornais nem era apenas verbal, mas se ampliava, reforçado com ações práticas, como a de permitir a visitação da população às fábricas durante as “festividades de inauguração”, verdadeiras apoteoses ao progresso. É o que registra Correia (2006, p. 183):
“Enfim, chegava-se ao tempo das inaugurações, sendo largamente divulgados os convites ao público em geral‟, para que comparecesse a elas. Benzimentos, discursos, foguetes e bandas de música eram partes integrantes dessas solenidades, que contavam com a presença de todos que se interessavam pelo progresso e prosperidade do Maranhão como os jornais apregoavam. Assim é que, abarrotados de grande quantidade de povo‟, do Largo do Carmo, que era o coração da cidade, partiam os bondes, em serviço extraordinário, desde às seis horas da manhã até as oito horas da noite, tempo em que os ‘Templos de Trabalho’ ficavam franqueados à visitação.”

3.5. E, em outro trecho:
“Para aqueles que compareciam a essas solenidades, por curiosidade ou na expectativa de se engajarem no trabalho das fábricas, constituíam essas solenidades verdadeiras apoteoses, triunfais espetáculos da modernidade, que chegavam ao clímax quando as operárias tomávamos seus respectivos lugares e punham as máquinas para funcionar,aureoladas por uma positividade de uma nova concepção de trabalho.”

3.6. Que memória pode ser resgatada dessa época tão apoteótica do Maranhão nesse novo momento da industrialização? Na perspectiva de que a memória discursiva é sempre recorrente, de que ela representa “toda formulação [que] possui, em seu domínio associado‟ outras formulações que ela repete, refuta, transforma, nega, enfim, em relação às quais produzem-se certos efeitos de memória específicos” (GREGOLIN,2007, p.159), é possível resgatar daquele momento longínquo alguns aspectos interessantes.

3.7. Aqui, como lá, também há os “fabrilistas” – os sujeitos discursivos entusiastas desse momento redentor‟ que o Maranhão vive: políticos, empresários, intelectuais e, principalmente, a chamada grande imprensa local, capitaneada pelos veículos noticiosos do Sistema Mirante de Comunicação, empresa de propriedade da família Sarney, de cujo seio a governadora do Estado, Roseana Sarney, é, literalmente, filha.

3.8. O Sistema Mirante é formado por um (i) jornal impresso (O Estado do Maranhão), tido como o mais empresarial do estado e o de maior status e importância, (ii) um portal na internet (Portal Imirante), (iii) diversas emissoras de televisão (na capital e em vários outros municípios), que retransmitem a programação da Rede Globo de Televisão e geram programação local, especificamente jornalismo, e (iv) um rol de emissoras de Rádio (AM e FM), também espalhadas por alguns dos municípios maranhenses.

3.9. Todos os veículos do Sistema Mirante, por razões políticas e econômicas, apoiam efusivamente este novo processo de industrialização maranhense. Para ratificar essa asserção, tome-se o editorial que o Jornal O Estado do Maranhão publicou, em 08 de setembro passado [2012], dia do aniversário de 400 anos da capital do Maranhão, a propalada festa do quadricentenário que o Jornal O Estado do Maranhão publicou, em 08 de setembro passado, dia do aniversário de 400 anos da capital do Maranhão, a propalada festa do quadricentenário:
(...) A São Luís do Maranhão é uma cidade madura, admirada, consagrada e merecedora de todas as honras. É honroso saber que a cidade originada por um projeto francês no século XVII suportou uma invasão holandesa e foi formada pelos portugueses, que sentaram praça e lhe moldaram a feição arquitetônica, cultural e o futuro. É honroso lembrar que São Luís foi um centro industrial importante para o país, fruto da economia algodoeira. (...) É igualmente honroso noticiar que São Luís vem se transformando num dos polos de desenvolvimento econômico mais promissores da região e do país, tendo como suporte um complexo portuário que faz conexão direta com todos os continentes. É honroso anotar que São Luís exporta alumínio e alumina e que por um dos braços do seu porto distribui o minério de ferro de Carajás, pelotas e gusa para todos os grandes centros do planeta. É honroso prever que São Luís será um centro de atração de grandes empresas e que os próximos tempos a transformarão numa metrópole grandiosa, economicamente dinâmica e rica e socialmente mais justa e equilibrada.(...) (O ESTADO DO MARANHÃO, 08.09.12, p.04)

3.10. O editorial, como ensina o mestre José Marques de Melo, na sua obra “A Opinião no Jornalismo Brasileiro” (MELO, 1994), é o gênero de texto opinativo que, na geografia de qualquer jornal, guarda em si as opiniões institucionais, aquilo que a empresa defende como ideário e pelo qual luta.

3.11. Não por acaso, então, para marcar o aniversário de 400 anos da capital, o editorial reserva um espaço tão grande da sua argumentação para fazer um balanço do potencial industrial, empresarial e comercial que a cidade já possui e daqueles que ainda advirão e a transformação “numa metrópole grandiosa, economicamente dinâmica e rica”.

3.12. Outro exemplo: o livro que o jornal O Estado do Maranhão encartou nesta mesma edição de aniversário, feito de vários textos enfocando aspectos diversificados da capital do Maranhão, numa espécie de panorama do que a ilha foi, é e será, diz textualmente sobre o cenário industrial:
“Nos seus 400 anos de fundação, São Luís vive um momento econômico de franco crescimento. São obras espalhadas por toda a cidade, que abrangem empreendimentos imobiliários e grandes projetos industriais.” (O ESTADO DO MARANHÃO, 2012, p. 62).

3.13. Sem reduções nem generalismos, é possível observar, nesses textos do jornal, o mesmo tom profético e ufanista do texto da Pacotilha, quando do lançamento da pedra fundamental da Companhia de Tecidos Rio Anil, um século antes. Mas aqui cabe uma observação interessante:

3.14. Mas aqui cabe uma observação interessante: por uma ação excepcional, essa “memória discursiva” não deixou aparecer na superfície dos enunciados sobre essa industrialização o termo “Manchester do Norte”, tão bem recebido na época da “primeira revolução industrial” maranhense.

3.15. Pensamos que, ao contrário do epíteto de Athenas Brasileira, que nos traz, como maranhenses e/ou ludovicenses, uma memória de um passado de glórias, de conquistas memoráveis, de panteões que alçaram apequena província do norte do Brasil ao topo das artes, da literatura e da cultura clássica brasileira, a perífrase de “Manchester do Norte” não ganhou o imaginário coletivo [ver nota 6], ao ponto de tornar-se identidade nos nossos dias e hoje, além de não ser significado socialmente, ainda guarda a lembrança de um momento que, ao fim e ao cabo, não deu certo.

3.16. Depois da “disenteria fabriqueira”, é bom lembrar, o Maranhão mergulhou em profunda crise econômica, para apenas se levantar depois dos anos 1950. Desse modo, avaliamos que a “Manchester do Norte” sofreu, discursivamente, um apagamento (natural ou deliberado, há que se investigar mais ainda, na continuação deste trabalho). Esta expressão não aparece em nenhum dos discursos relativos a essa nova fase industrial do estado. É um nome que dorme no esquecimento, talvez motivado pelos engendramentos discursivos – pois, como afirma Eni Orlandi (1995), silenciar também é dizer...

4. O DISCURSO REDENTOR: MAQUINISMO E UFANISMO

4.1. Este trabalho, para efetivar sua análise das estratégias discursivas elencadas pelos sujeitos do discurso deste “novo Maranhão industrial”, debruça-se sobre o vídeo, produzido pela Petrobrás e usado como divulgação no momento do lançamento da pedra fundamental da Refinaria Premium I, ocorrida no dia 15 de janeiro de 2010, na cidade de Bacabeira, que será a sede do empreendimento. A escolha deste vídeo se deu pelo fato de ser ele um documento que, assim como fez jornal Pacotilha, em 1891, registra um momento importante para o cenário da industrialização do estado.

4.2. A Pacotilha, anunciando a construção da Fábrica de Fiação e Tecidos Rio-Anil, registrava a emersão do maior empreendimento da fase oitocentista da industrialização maranhense, um ícone da Manchester do Norte. O vídeo, produzido pela Petrobrás, anunciando a construção da Refinaria Premium I, um investimento de quase 20 bilhões de dólares e o maior empreendimento desta industrialização maranhense deste início de século XXI, também registra o nascimento de um ícone dos novos tempos.

4.3. Neste caso, analisando compararativamente os dois discursos, é interessante perceber como ambos estão carregados de um sentimento de redenção.Se o jornal diz que a Rio-Anil é um marco para “Uma era de prosperidade para a Pátria Maranhense que de há certo tempo para cá vai despertando do marasmo, da indiferença em que permaneceu longos anos, da atrofia, com o organismo depauperado pelos vícios da escravidão”, a Petrobrás afirma que a Refinaria Premium será a fonte do novo desenvolvimento do Maranhão. Porém, ao contrário do jornal, que usa sua própria fala para fazer-se pronunciar, a Petrobrás não faz isso diretamente, faz por intermédio dos moradores, pessoas comuns, que falam no vídeo, em entrevistas.

4.4. Ao todo, o vídeo, de 5‟48”, traz 16 entrevistas, todas com pessoas comuns, sendo 4 de Rosário, 8 de Bacabeira e 4 de São Luís, as cidades mais diretamente envolvidas e beneficiadas com a construção da empresa. Entre homens, mulheres, jovens, adultos e idosos, todos os depoimentos destacam as benesses da refinaria e a expectativa de melhorias na vida da comunidade,em vários aspectos. Como dizem:

Ø  José Ribamar Gonçalves, morador de Bacabeira: “Maranhão vai se desenvolver, um dos maiores estados do norte-nordeste”;
Ø  Maria de Fátima Guimarães, moradora de Rosário: “Temos muito a ganhar com essa vinda da refinaria para o nosso município”
Ø  Antônio Rubens Carvalho, morador de São Luís: “O maior investimento da Petrobrás vai ser aqui no nosso estado, e a gente tá torcendo pra que isso aconteça de verdade”.

4.5. O vídeo adota, para se pronunciar sobre a Refinaria, a estratégia discursiva do documentário, que tem como um dos seus pontos fortes de apoio na exposição da verdade a recorrência a falas comuns, com as pessoas inclusive no seu contexto diário, sem “maquiagem”.

4.6. As pessoas que aparecem no vídeo estão sem arrumações de roupa, cabelo, até sem camisa, de boné, na frente das suas casas, no meio da rua, na porta do seu trabalho etc., o que dá a dimensão de naturalidade da coleta do depoimento e reforça a verossimilhança dos seus pronunciamentos. Outro recurso discursivo das entrevistas é a construção de metonímias [ver nota 7], na medida em que aquelas pessoas passam a representar, por uma figura de estilo e discurso, o todo da população e, neste caso, o todo comum.Outro ponto importante que aproxima as falas da Pacotilha e do vídeo da Petrobrás é a recorrência à adjetivação ou às expressões adjetivas para designar o que os dois empreendimentos farão com o estado. Diz a Pacotilha:
“As fábricas surgem de toda aparte e com elas o despertar de uma vida nova, cheia de atividades, urgida pelo progresso, prometendo-nos um futuro bonançoso que compense a esterilidade do passado” (grifos nossos).

4.7. Já o vídeo da Petrobrás registra na fala do locutor e dos entrevistados, uma série de expressões adjetivadoras e de adjetivos para qualificar tanto a empresa em si quanto o cenário de positivação que ela vai promover. Sobre a empresa, diz o vídeo: “
“A Petrobrás (...) dá início no Maranhão à implantação de um mega-empreendimento: a Refinaria Premium I (...) com investimentos da ordem de 20 bilhões de dólares, a Premium I será a maior refinaria do Brasil e a quinta maior do mundo (...) a Petrobrás estará enfrentando um enorme desafio (...) o empreendimento contará com processos que utilizam as mais avançadas tecnologias (...) é assim que a Petrobrás, através da implantação deste mega-empreendimento, e atuando com responsabilidade social e ambiental, possibilitará o desenvolvimento sustentável da região, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida da população do Maranhão e do Brasil.”

4.8. E novamente nas falas:
“Eu faço curso profissionalizante e os professores têm falado muito da refinaria que está vindo e pra nós que estamos nos preparando profissionalmente, está sendo ótimo” (Daiane Barbosa de Souza, moradora de São Luís);
Com certeza a geração de emprego vai ser tamanha , né?” (Ciro Jorge Pereira,morador de São Luís).

4.9. A adjetivação, neste caso, é um reforço discursivo de consolidar o pronunciamento a favor da Refinaria – neste particular, com o efeito hiperbólico da polifonia marcada nas dezenas de vozes da “comunidade” maranhense.

4.10. Uma terceira estratégia que marca bem o discurso sobre a industrialização (neste caso, a industrialização em si) é o forte tom de descritivismo que os textos trazem. No registro que colhemos sobre o lançamento da pedra fundamental da [Fábrica] Rio-Anil, por ser breve, não ficou marcado, mas em outros textos da Pacotilha sobre máquinas ou beneficiamentos industriais, durante todo o período da industrialização de São Luís, isso pode ser verificado bem fortemente, como registramos na nossa tese “Ecos da Modernidade: uma análise do discurso sobre o cinema ambulante em São Luís” (MATOS, 2010).

4.11. No caso do vídeo, o tom descritivista está associado tanto ao texto quanto à imagem. Toda a construção imagética do vídeo foi feita para mostrar máquinas e equipamentos de uma refinaria, plataformas de petróleo, mapas de localização do Maranhão, São Luís e Bacabeira, profissionais em atividade na Petrobrás (possivelmente imagens de arquivo ou de outras filmagens), como a demonstrar, por meio da imagem, como “será” a refinaria, no futuro.
E o texto também reforça essa “mostração”, pois ele é fortemente descritivo. Alguns trechos: “...localizada no município de Bacabeira, a cerca de 60 km de São Luís, a refinaria se conectará com a capital através do seu terminal portuário (...)esses derivados [de petróleo] serão transportados através de uma faixa de dutos de 60km, que também transportarão o petróleo bruto até a refinaria. O empreendimento contará ainda com um parque com tanques que armazenamento, a ser construído no Porto do Itaqui (...) estima-se que no período de pico a obra contará com um contingente de cerca de 26 mil trabalhadores...”.
A natureza descritiva faz parte da estratégia discursiva de apresentar o novo, o desconhecido (como o manual de instruções de um produto que acabamos de adquirir). No caso específico da Refinaria Premium, a descritividade, verbo-visual, aliada às estratégias próprias de um documentário com fins publicitários, também serve para projetar uma imagem, a mais verossimilhante possível, da grandiosidade da refinaria num futuro bem próximo (o vídeo afirma que ela ficaria pronta em 2015!).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS:

5.1. O que fica evidenciado neste trabalho, que ainda está no começo, pois outros documentos precisam ser ainda analisados, o arquivo aumentado com novos sujeitos discursivos, inclusive midiáticos (jornais, revistas) é que, neste novo momento da industrialização do Maranhão, há um resgate da memória discursiva do Maranhão da “Manchester do Norte”, sem no entanto aparecer este epíteto, que cheira a malogro.

5.2. E as estratégias engendradas para forjar este discurso redentor são, em muitos casos, as mesmas do período oitocentista: um discurso efusivo, proferido por sujeitos discursivos diversos (“os neofabrilistas”), fortemente adjetivado positivamente e com um a grande carga de descritivismo, como que para apresentar o novo – afinal, “nunca na história deste estado” – para parafrasear um ex-presidente dado a efeitos retóricos e discursivos – se teve um empreendimento tão grandioso.



REFERÊNCIAS [bibliográficas]:

BORRALHO, José Henrique de Paula. A Athenas equinocial: a fundação de um Maranhão no império brasileiro. Tese de doutorado: Niterói-RJ: UFF, 2009.

CORREIA, Maria da Glória Guimarães. Nos fios da trama: quem é essa mulher? Cotidiano e trabalho do operariado feminino em São Luís na virada do século XIX. São Luís: Edufma, 2006.

GREGOLIN, Maria do Rosário Valencise. Formação discursiva, redes de memória etrajetos de sentido: mídia e produção de identidades. In: BARONAS, Roberto Leiser(org.). Análise do discurso: apontamentos para uma história da noção-conceito deformação discursiva. São Carlos: Pedro & João Editores, 2007.

ITAPARY, Joaquim. A falência do ilusório: memória da companhia de fiação e tecidos Rio Anil. São Luís: Alumar, 1995.

JORNAL O ESTADO DO MARANHÃO. Parabéns, São Luís. São Luís: 08 de setembro de 2012, p. 04.

JORNAL O ESTADO DO MARANHÃO. São Luís 400 anos. (livro-homenagem). São Luís: Gráfica Escolar, 2012.

LANÇAMENTO DA PEDRA FUNDAMENTAL DA REFINARIA PREMIUM. Disponível em Youtube: http://www.youtube.com/watch?v=QWp9nKeFz-4). Acesso em 20 de setembro de 2012.

MARANHÃO, Governo do Estado, Secretaria de Estado de Planejamento, Orçamento e Gestão. Mensagem da Governadora à Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão, 2011: apresentada na reunião de abertura da 1ª sessão Legislativa da 17ª Legislatura. São Luís, 188 p.

MARTINS, Manoel de Jesus Barros. Operários da saudade: os novos atenienses e a invenção do Maranhão. São Luís: Edufma, 2006.

MATOS, Marcos Fábio Belo. ...E o cinema invadiu a Athenas: a história do cinema ambulante em São Luís (18981909). São Luís: FUMC, 2002.

______. Modernidade, imprensa e discurso: de como a imprensa escrita efetivou o discurso modernizador. In: MATOS, Marcos Fábio Belo, GEHLEN, Marcos (org.). Comunicação, jornalismo e fronteiras acadêmicas. São Luís: Edufma, 2011.

MELO, José Marques de. A opinião no jornalismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1994.

ORLANDI, Eni Pulcinelli. As formas do silêncio no movimento dos sentidos. Campinas, S. R: Editora da Unicamp, 1995.

PACHECO, Fran. Geografia do Maranhão. São Luiz: Tipografia Teixeira, 1922.

PESSOA, Jordânia Maria. Entre a tradição e a modernidade: a belle époque caxiense. Imperatriz: Ética, 2009.

REINALDO Jr, José. Formação do espaço urbano de São Luís. São Luís: Edições FUNC, 1999.

SPERANDIO, Natália Elvira. O sentido resultante da interação metafórica e metonímica. Capturado em:

TRIBUZZI, Bandeira. Formação econômica do Maranhão: uma proposta de desenvolvimento. 2 ed. São Luís: Conselho Regional de Economia do Maranhão, 2011.

VIVEIROS, Jerônimo de. História do comércio do Maranhão: 1612-1895. 2.v. São Luís: Associação Comercial do Maranhão, 1954.



NOTAS DE RODAPÉ [repaginadas nesta para última seção do artigo]

Nota 1: Autor - Marcos Fábio Belo Matos; Universidade Federal do Maranhão – UFMA; Professor do Curso de Comunicação Social – Jornalismo, da UFMA, Campus Imperatriz. Doutor em Lingüística e Língua Portuguesa pela Unesp-Araraquara. Coordenador do Grupo de Pesquisa de Mídia Jornalística (G.Mídia), desenvolvendo o projeto de pesquisa “Representações Discursivas na Mídia”.

Nota 2: A primeira geração de atenienses é a da primeira metade do século XIX, com Gonçalves Dias, Sotero dos Reis, João Lisboa. A segunda geração surge na segunda metade do final do século XIX, com nomes como Arthur e Aluísio Azevedo, Coelho Neto, Graça Aranha, Raimundo Corrêa. E a terceira geração é representada por Manoel de Bethéncourt, Astolfo Marques, Nascimento Moraes, Raimundo Lopes,Antônio Lobo, Fran Pacheco, dentre outros, enfeixado no grupo que se autodenominou Novos Atenienses'.

Nota 3: Como exemplos, temos:
Ø  Companhia de Fiação e Tecido do Cânhamo (Fábrica São Luís), prédio transformado no Centro de Produção Artesanal do Maranhão (Ceprama), no bairro da Madre Deus;
Ø  Companhia de Fiação e Tecidos Rio Anil, prédio transformado no Centro Integrado Rio Anil (Cintra), uma escola de ensino fundamental e médio, no bairro do Anil;
Ø  Fábrica Santa Amélia, prédio tombado pelo Iphan e que está sob a responsabilidade da Ufma, localizada no centro da cidade, ainda sem uso.

Nota 4: Esse processo de metaforização, que redundava na criação de epítetos, parece ser uma lógica nacional. Borralho (2009) arrola alguns: Veneza Brasileira (Recife); Athenas Mexicana (Vera Cruz); Atenas Americana (Santa Fé de Bogotá); Esparta Brasileira e/ou também Athenas Brasileira (Rio Grande de São Pedro/RS), Ateneida Baiana (Salvador). E Pessoa (2009) identifica, no interior maranhense, a designação da cidade de Caxias, que então também efetivava um processo semelhante de industrialização, de Manchester Maranhense

Nota 5: O livro-homenagem que o jornal O Estado do Maranhão publicou em reverência aos 400 anos de São Luís registra, na página 62: “Em todo o estado, estão em andamento 65 projetos [industriais], dos quais 38 no interior e 27 na capital”.

Nota 6: O editorial do primeiro número do jornal A Idéia, de 1893, provando que o epíteto de Manchester tinha ganhado o conhecimento popular, conclamava a mocidade: “(...) abraçada com os livros trabalhai para que o Maranhão além de Manchester, possa continuar a ser a Athenas Brasileira.” (apud BORRALHO, 2009, p. 40).

Nota 7: De acordo com Sperandio (2012, p. 353): “Lakoff e Johnson (2002) advogam que, enquanto a metáfora é uma forma de conceber uma coisa em termos de outra, tendo como função primária o entendimento/compreensão, a metonímia possui uma função referencial, ou seja, ela nos permite utilizar uma entidade para representar outra.”


TEXTO 2: DIVULGAÇÃO EM BLOG
CINTRA -  CENTRO INTEGRADO DO RIO ANIL
Projeto do arquiteto FABRICIO PEDROZA
[Centro Educacional – Colégio da Fábrica do Rio Anil; São Luís, MA]
Gerido pela FNL - Fundação Nice Lobão, vinculada à Secretaria de Estado da Educação do Maranhão.

COMPANHIA DE FIAÇÃO E TECIDOS DO RIO ANIL




São Luís já foi um polo industrial têxtil. No final do século XIX, pelo menos dez fábricas de tecidos e fiação se instalaram na cidade, anunciando o progresso e mudança da vida social da região. A antiga Companhia de Fiação e Tecidos do Rio Anil (Rua da Companhia, 1, Anil), construída em 30 de junho de 1893, por exemplo, foi responsável por mudar o modo de vida do bairro do Anil. Pertenceu a seis empresários de São Luís: Antônio Cardoso Pereira, Francisco Xavier de Carvalho, Manuel José Francisco Jorge, José Francisco de Viveiros, Jerônimo Tavares Sobrinho e o Cônsul da Grã-Bretanha no Maranhão, o escocês Henry Airlie, idealizador da Companhia.


Ocupou uma área de 9.991m², sendo edificada em pedra, cal e alvenaria de tijolo. E como era comum acontecer nos entorno das fábricas, uma vila operária prosperou na região e com isso diversos serviços foram sendo instalados nas proximidades do pátio fabril.
A vila operária foi construída pelos empresários da fábrica com intuito de assegurar a assiduidade dos empregados, que chegou a 100 em época áurea.
Dada a importância do bairro na época, a Companhia Ferro-Carril do Maranhão construiu dez quilômetros de trilhos até o Anil, por onde circulariam bondes animálicos, que mais tarde tornou-se um dos principais trechos da malha ferroviária da cidade. Isso propiciou também o deslocamento dos operários que seguiam para o trabalho logo ao soar do apito da fábrica e também o escoamento da produção fabril que teve como apogeu a década de 1930, quando atingiu o ponto mais alto da produtividade (1 milhão metros/ano).

Desenvolvimento – Entre as décadas de 1940 e 1950, o Anil desenvolveu-se grandemente, passando a ter uma boa estrutura social e de lazer, como educandários, colégios, igrejas, além de mercado público, onde funcionou mais tarde a superintendência do Anil e hoje abriga o Posto Médico, e várias lojas de tecidos. Para o lazer, dois cinemas, o Rivoli e o Anil, do campo do Botafogo, pertencente à fábrica, os banhos no Rio Anil (quando ainda era propício a tal atividade) e os famosos bailes populares.


Na fábrica, acidente tinha quase todo dia. “As linhas se soltavam e os teares voavam. Em 1959, a tubulação de uma caldeira explodiu e matou três funcionários. Outra vez, o fundo de um barril de ácido sulfúrico se rompeu, queimando os três carregadores que o transportavam. Eles foram enrolados em folhas de bananeira e levados ao hospital”, relatou João Pereira Carramilo, ex-funcionário da fábrica, à jornalista Yane Botelho.

RECUPERAÇÃO [RESTAURAÇÃO]
1.      Como boa parte das fábricas da época, a Companhia de Fiação e Tecidos do Rio Anil não resistiu aos entraves e pediu falência em 1961. Abandonada por muito tempo, foi somente um século depois do lançamento de sua pedra fundamental que o local foi recuperado e deu espaço ao Centro Integrado Rio Anil (Cintra), com projeto do arquiteto Fabrício Pedroza.
2.      Adotou-se para o novo Centro a mesma cor azul da antiga Fábrica, segundo a lembrança dos velhos moradores do bairro.
3.      O prédio tem cobertura composta por uma estrutura forjada na Inglaterra e telhas francesas. A fachada principal apresenta 14 módulos, com cobertura em duas águas, formando pequenos frontões com óculos centralizados.
4.      O interior foi reestruturado em dois pavimentos de salas de aula e administrativo com circulação em forma de mezaninos e largas escadas em madeira, com alguns pilares em troncos retorcidos. Antes imensas salas abrigavam os teares.
5.      O desafio era compartimentar essas grandes áreas sem deixá-las escuras. Para isso aproveitaram-se as grandes janelas de guilhotinas em madeira e vidro que rasgam toda a extensão da antiga fábrica, além de telhas de vidro localizadas estrategicamente nas circulações internas que garantiram a ventilação e iluminação.
6.      Em alguns pontos há jardins de inverno, iluminados por abertura no telhado, sem nenhum prejuízo às formas originais. Ainda é possível encontrar corredores revestidos com ladrilhos hidráulicos e alvenaria em pedra aparente que destaca a qualidade da mão de obra da construção civil do século XIX no Brasil.


Nota do Editor [RAS]:

O mais importante documento sobre a gênese e débâcle da COMPANHIA DE FIAÇÃO E TECIDOS DO RIO ANIL [hoje CINTRA, desde 1993] é o livro citado abaixo:

ITAPARY, Joaquim. A falência do ilusório: memória da companhia de fiação e tecidos Rio Anil. São Luís: Alumar, 1995.


RONALD ALMEIDA-016-PARA J_ITAPARY E NAPÔ-  MEMÓRIA DA INDÚSTRIA MARANHENSE-2CINTRA-FABRICA RIO ANIL


Ronald de Almeida Silva <ronald.arquiteto@gmail.com>
23 de julho de 2014 19:15
Para: Joaquim Itapary

Caro Mestre ITAPARY
Cópia para Napô

1)      CINTRA, COMPANHIA DE FIAÇÃO E TECIDOS DO RIO ANIL e a FALÊNCIA DO ILUSÓRIO:
A propósito, deparei-me esses dias com o desafio de entender melhor e me atualizar sobre o grande empreendimento e complexo educacional do CINTRA – Centro Integrado do Rio Anil, hoje com 7.500 alunos; população estudantil esta maior que a população total de muitos municípios maranhenses!!.
Pesquisei na internet e achei um texto que editei em 13 páginas [artigo acadêmico do Prof. Marcos F. B. Matos, UFMA, com original em pdf] muito interessante como abordagem histórica e Aide-Mémoire da Industrialização do Maranhão.
Nesse artigo, lançado em 2012, o seu livro seminal A FALÊNCIA DO ILUSÓRIO é obviamente citado e, portanto, acho que esse tema pode lhe interessar, assim como ao nosso companheiro Sabóia.
Ao final desse artigo segue uma sinopse informativa sobre o projeto do CINTRA.

Saudações e continue me enviando suas pérolas de arte e humor.
Seu admirador
Ronald Almeida

MARANHÃO-INDUSTRIALIZAÇÃO-MANCHESTER_DO_NORTE-Artigo-MARCOS_F_B_Matos-rev_03-23jul2014.doc
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