LULA
MINISTRO: como a nomeação pode ajudar ou atrapalhar mais o governo [16mar2016]
Fonte: BBC Brasil
Mariana SchreiberDa BBC Brasil
em Brasília
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2016/03/160316_lula_nomeacao_ministro_ms_rm
Acuada por uma série de notícias negativas nas últimas
semanas, a petista tenta, com a nomeação do ex-presidente para o cargo mais
importante de seu gabinete, salvar seu mandato de um processo de impedimento
que parece cada vez mais iminente.
A expectativa é de que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), destrave novamente o trâmite do impeachment com o anúncio, até o fim
desta semana, da formação da Comissão Especial que emitirá um parecer a favor
ou contra a abertura de um procedimento contra Dilma.
Diante desse cenário, a entrada oficial de Lula tem potencial
para causar impactos positivos e negativos para o governo.
De um lado, o ex-presidente agrega ao governo sua enorme
capacidade de articulação política e de se comunicar com as classes mais pobres
e os movimentos sociais – habilidades fundamentais para enfrentar a crise
política, que faltariam em Dilma.
De outro, abre espaço para críticas de que o líder petista
esteja buscando proteção contra eventuais decisões do juiz Sergio Moro –
responsável por julgar ações da operação Lava Jato na primeira instância. Ao
virar ministro, Lula passa a ter foto privilegiado e a ser as acusações contra
si avaliadas pelo Supremo Tribunal Federal.
O ex-presidente está sendo investigado por supostamente ter
sido beneficiado com recursos desviados da Petrobras – o que ele nega.
Image 2: copyrightReuters:
Teria contribuído para Lula aceitar o convite o
fato de a juíza Maria Priscilla Veiga Oliveira, da 4ª Vara Criminal de São
Paulo, ter transferido a Moro a decisão sobre o pedido de prisão preventiva
apresentado pelo Ministério Público paulista contra o petista, sob a
justificativa de que Moro teria mais competência para decidir a questão
(entenda melhor abaixo).
O pedido de prisão foi muito criticado por diversos juristas
– até mesmo pessoas ligadas à oposição viram falta de fundamento jurídico na
peça. Um manifesto de promotores e procuradores, porém, defendeu a medida.
Vale lembrar que pairam ainda sobre Lula e Dilma fortes
acusações (que ainda precisam ser investigadas) de suposta interferência na
Lava Jato, feitas por Delcídio em sua delação premiada – a homologação do
acordo, aliás, teria sido responsável pelo adiamento do anúncio da nomeação do
ex-presidente, que teve uma longa reunião com sua sucessora para tratar do
assunto nesta terça.
Segundo o senador, o ministro Aloizio Mercadante (Educação),
um dos auxiliares mais próximos de Dilma, lhe ofereceu ajuda financeira e
interferência junto a ministros do STF em troca de que ele não colaborasse com
as investigações.
Mercadante afirmou que "jamais falou com qualquer
ministro do Supremo sobre o assunto".
Delcídio alega ainda que Dilma mente ao dizer que não sabia
de cláusulas prejudiciais à Petrobras na compra da refinaria de Pasadena, nos
EUA, e de tentar, ao procurar integrantes do STF e indicar um novo ministro
para o STJ (Superior Tribunal de Justiça), interferir em decisões judiciais
relacionadas à Lava Jato.
Já Lula é acusado ainda de várias outras coisas – entre elas
de comprar o silêncio do publicitário Marcos Valério durante o escândalo do
mensalão e de impedir a convocação de depoimentos que poderiam ser prejudiciais
a seus filhos na CPI do Carf (que investiga suposta manipulação em decisões
para favorecer empresas investigadas por crimes fiscais). Lula, Dilma e
Mercadante refutam todas as denúncias.
'Choque político'
Analistas políticos ouvidos pela BBC Brasil no domingo, após
os enormes protestos, já apontavam a nomeação de Lula como um possível caminho
para o governo se rearticular.
"O Planalto precisa de um choque político, e a única
ação mais forte que me parece disponível é a presença do Lula no
ministério", disse Rafael Cortez, da Consultoria Tendências.
"A rejeição a Lula já é extremamente elevada entre os
apoiadores do impeachment, assumindo ou não um cargo de ministro.
Eventualmente, a presença dele pode servir para mobilizar o governismo, que
hoje é minoritário e desarticulado porque Dilma não tem uma liderança relevante
mesmo dentro de seus apoiadores", acrescentou.
A questão que fica, no entanto, é sobre qual será o poder
decisório de Lula dentro do governo – ou seja, se Dilma abrirá mão de sua
autoridade.
A vinda da maior liderança petista para dentro da gestão pode
sinalizar, por exemplo, uma guinada na política econômica, já que a
administração federal vem sendo duramente criticada pelo PT e movimentos
sociais ao adotar medidas de ajuste fiscal, com consequente corte de gastos
públicos.
A crise econômica é um dos motivos do forte desgaste da
presidente – a economia brasileira recuou 3,8% em 2015, segundo o IBGE, e
caminha para tombo semelhante neste ano, segundo projeções de economistas.
O cientista político Milton Lahuerta, professor da
Unesp, alerta porém que a presença oficial de Lula está longe de ser uma
solução.
"Acreditar que vai ser simples, que o Lula indo para lá
levará a uma espécie de emulação das forças, que todo mundo vai se unir... isso
pode ter sentido para o público interno do PT. Mas, na realidade, não é algo
razoável, dadas as dificuldades tanto políticas quanto econômicas",
avalia.
“E mais: ele não vai resolver o problema do governo porque,
no fundo, vai se explicitar aquilo que a boca pequena, que a população fala,
desde sempre: que a Dilma não tem autonomia."
Desgaste e reação
As suspeitas que recaem sobre Lula, segundo as investigações
da Lava Jato, são de que empreiteiras que participavam do esquema de corrupção
da Petrobras teriam feito pagamentos irregulares a ele por meio de contratações
de palestras e doações a seu instituto.
Além disso, os investigadores dizem que essas empresas teriam
bancado obras em imóveis do ex-presidente – uma cobertura tríplex no Guarujá e
um sítio no interior paulista. Ele nega as acusações e diz que não é dono
desses imóveis.
As investigações têm causado enorme desgaste à sua imagem.
Por outro lado, o fato de duas ações recentes contra ele terem sido alvo de
críticas de juristas deu fôlego ao discurso de que o líder petista estaria
sendo perseguido, com intuito de inviabilizar sua possível candidatura
presidencial em 2018.
Há dez dias, Lula foi alvo de uma condução coercitiva para
depor à Polícia Federal. A medida provocou controvérsias entre juristas –
alguns consideraram a medida exagerada, já que o ex-presidente não havia sido
previamente convocado a prestar depoimento, enquanto outros a defenderam
dizendo tratar-se de um instrumento de investigação previsto na lei.
Simultaneamente, foram feitas ações de busca e
apreensão na residência de Lula e em seu instituto. A operação, denominada
Aletheia, atingiu também familiares, amigos e funcionários do ex-presidente.
No mesmo dia, Lula deu uma entrevista coletiva com fortes
críticas à Lava Jato e à grande imprensa nacional. Três promotores do
Ministério Público de São Paulo que também investigam o petista entenderam que
o discurso de Lula representou "efetiva afronta ao princípio da garantia
da ordem pública" e solicitaram sua prisão preventiva na última
quinta-feira.
Ao mesmo tempo, os promotores apresentaram uma denúncia
contra Lula, pedindo a abertura de um processo contra ele no caso do tríplex do
Guarujá, sob acusação de falsidade ideológica e ocultação de patrimônio, uma
modalidade do crime de lavagem de dinheiro.
Na segunda-feira, a juíza Maria Priscilla Veiga Oliveira
disse em sua decisão sobre o caso que a denúncia não apontava a origem dos
recursos da suposta lavagem de dinheiro e que isso já está sendo investigado pela
Lava Jato. Por isso, afirmou também que não se considerava competente para
julgar a questão e que o caso devia ser remetido para a vara de Moro, em
Curitiba.
Em entrevista à BBC Brasil, o ex-procurador-geral da
República Claudio Fonteles disse que a decisão de Oliveira é muito usual no
mundo jurídico, já que uma pessoa não pode ser julgada duas vezes pelo mesmo
crime.
Se Moro aceitar a competência, destacou, os pedidos da
Promotoria de São Paulo "deixam de existir juridicamente". Se ele
recusar, caberá ao Supremo Tribunal de Justiça decidir de quem é a competência.
Outras ameaças
Além do processo de impeachment, outras duas ameaças pairam
sobre o mandato de Dilma.
No Congresso, parlamentares começam a articular uma proposta
de mudança do regime presidencialista, com objetivo de limitar os poderes da
presidente e instaurar uma espécie de semipresidencialismo.
Já o Tribunal Superior Eleitoral analisa ação proposta pelo
PSDB pedindo a cassação da presidente e de seu vice, Michel Temer (PMDB), sob a
justificativa, entre outras, de que sua campanha teria recebido recursos
desviados da Petrobras.
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