sexta-feira, 8 de maio de 2015

[73] JUSTIÇA& DIREITO: O advogado tem direito de mentir ? Aurinilton Leão Carlos Sobrinho - 29 de março de 2011

O advogado tem direito de mentir ?

 29 de março de 2011


  1. Um questionamento que sempre povoou a minha mente diz respeito ao “DIREITO DE MENTIR”. A mim isso sempre pareceu estranho. Mesmo assim, é recorrente a afirmação de que mentir faz parte do ministério do advogado.
  2. Todavia, é preciso levar em consideração as disposições do Código de Ética e Disciplina da OAB e da Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, para que se possa firmar opinião sobre o assunto.
  3. São deveres do Advogado, dentre outros, preservar, em sua conduta, a honra, a nobreza e a dignidade da profissão, zelando pelo seu caráter de essencialidade e indispensabilidade; atuar com destemor, independência, honestidade, decoro, veracidade, lealdade, dignidade e boa-fé; velar por sua reputação pessoal e profissional; contribuir ao aprimoramento das instituições, do Direito e das leis; aconselhar o cliente a não ingressar em aventura judicial; abster-se de emprestar concurso aos que atentem contra a ética, a moral, a honestidade e a dignidade da pessoa humana (Parágrafo único do art. 2º do Código de Ética e Disciplina da OAB).
  4. Além disso, o advogado, considerado pela Constituição indispensável à administração da Justiça, deve defender os valores do Estado Democrático de Direito, da cidadania, da moralidade pública, da Justiça e da paz social, subordinando a atividade do seu Ministério Privado à sua elevada função pública (art. 2º), cujo exercício exige conduta compatível com os preceitos do Código de Ética e Disciplina, do Estatuto, do Regulamento Geral, dos Provimentos e com os demais princípios da moral individual, social e profissional (art. 1º).
  5. Como se não bastasse, também segundo o Código de Ética e Disciplina da OAB o advogado deve ter consciência de que o Direito é um meio de mitigar as desigualdades para o encontro de soluções justas e que a lei é um instrumento para garantir a igualdade de todos (art. 3º) e que lhe é defeso expor os fatos em Juízo falseando deliberadamente a verdade ou estribando-se na má-fé (art. 6º). Não é demais lembrar que o advogado é obrigado a cumprir rigorosamente os deveres consignados no Código de Ética e Disciplina (Lei nº 8.906/94, art. 33).
  6. Por outro lado, a Lei nº 8.906, de 4 de julho de 1994, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia, em seu art. 7º, § 2º, determina que o advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria ou difamação puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em Juízo ou fora dele, mas sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer.
  7. Não obstante, em seu art. 31, o Estatuto da Advocacia prescreve que o advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia, e, em seu art. 32, que o advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa, sendo, inclusive, solidariamente responsável com seu cliente, em caso de lide temerária, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria.
  8. Ora, se o advogado é defensor dos valores do Estado Democrático de Direito; se é-lhe defeso expor os fatos em Juízo falseando, deliberadamente, a verdade ou estribando-se na má-fé; se deve manter conduta compatível com os princípios da moral individual, social e profissional, como conceber a existência de um “direito de mentir” assegurado ao Advogado?
  9. Sem dúvida, como afirmou o ministro Moreira Alves, no julgamento do habeas corpus nº 75.257-8 – Rio de Janeiro, perante o Supremo Tribunal Federal, o réu, no processo penal, possui o direito de permanecer em silêncio e até mesmo de mentir para não auto-incriminar-se. Eis a grande dificuldade que se descortina: se o réu cria uma estória fantasiosa, o advogado, como seu representante, mesmo sabendo disso, deve defendê-lo?
  10. Nesse caso, qual a extensão das prerrogativas do advogado? Sem dúvida, por suas opiniões e na defesa dos interesses de seu cliente, o advogado é inviolável. Entretanto, como inexiste qualquer direito absoluto, a inviolabilidade possui limites, de modo que o advogado poderá responder civil, penal e/ou administrativamente, se causar dano a alguém.
  11. Todavia, o problema é identificar a linha tênue que separa as prerrogativas do advogado e a sua responsabilidade. Precisamos todos refletir.

Aurinilton Leão Carlos Sobrinho é professor universitário e advogado

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