História da urbanização; formação da rede
urbana.
Ensaio analisa a formação da rede urbana das capitanias de São Vicente e Santo Amaro, depois unidas na Capitania de São Paulo.
Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material
Print version ISSN 0101-4714
An. mus. paul. vol.17 no.2 São Paulo July/Dec. 2009
http://dx.doi.org/10.1590/S0101-47142009000200013
[1] Sobre o conceito de território e suas vinculações com a rede urbana
Ensaio analisa a formação da rede urbana das capitanias de São Vicente e Santo Amaro, depois unidas na Capitania de São Paulo.
Mapa 1: Capitania de São Vicente
Dilatação
dos confins: caminhos, vilas e cidades na formação da Capitania de São Paulo
(1532-1822)
Beatriz Piccolotto Siqueira Bueno
Docente
da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.
E-mail: <beatrizbueno@terra.com.br>
Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material
Print version ISSN 0101-4714
An. mus. paul. vol.17 no.2 São Paulo July/Dec. 2009
http://dx.doi.org/10.1590/S0101-47142009000200013
ESTUDOS DE
CULTURA MATERIAL
Disponível em:
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-47142009000200013
Acesso RAS em
12fev2016
Artigo apresentado em 8/2008.
Aprovado em 3/2009.
RESUMO
Este
ensaio analisa a formação da rede urbana das capitanias de São Vicente e Santo
Amaro, depois unidas na Capitania de São Paulo. Discute o processo de
apropriação do sertão, a pulsação e dilatação dos confins ao sabor dos
deslocamentos humanos e de interesses políticos. Interpreta o papel de capelas,
freguesias, vilas e cidades no controle e produção de territórios
metropolitanos em solos ultramarinos.
Palavras-chave: História
da Urbanização. Capitania de São Vicente. Capitania de Santo Amaro. Capitania
de São Paulo. Séculos XVI-XVIII. Rede urbana.
ABSTRACT
This
essay analyzes the development of urban networks in the Captaincies of São
Vicente and Santo Amaro, later merged into the Captaincy of São Paulo. It
discusses the process of appropriation of the sertão (backcountry), the
commotion and expansion beyond the confines to the tune of population movements
and political interests. The paper also interprets the role of chapels,
parishes, villages and towns in initiatives to create and control metropolitan
areas on overseas soil.
Keywords: History
of urbanization. Captaincy of São Vicente. Captaincy of Santo Amaro. Captaincy
of São Paulo. 16th-18th centuries. Urban networks.
[1] Sobre o conceito de território e suas vinculações com a rede urbana
1. Território e espaço não são noções equivalentes1. O território, com contornos
e limites precisos é uma categoria histórica, construída socialmente. Para além
das fronteiras naturais, a fronteira política é sempre uma linha abstrata e
convencionada por alguns. Às zonas interiorizadas dava-se o nome de
"sertão" - "região apartada do mar, & por todas as partes
metida entre terras" - cabendo à ação humana dilatar-lhe os
"confins"2- "fronteiras" ou
"extremidades de uma terra contígua com outra". Na documentação
oficial, não por acaso, os termos "conquista"3 e
"domínio"4 aparecem
como sinônimos de "colonia" e sempre vinculados à ação humana.
Impérios, reinos, conquistas, províncias, capitanias, comarcas, bispados eram
divisões territoriais convencionadas e historicamente desenhadas de acordo com
a natureza das relações sociais em jogo. O estabelecimento oficial das
fronteiras jurídicas resultava de atos deliberados e acordados politicamente.
2. Conceito de invenção recente, difundido a partir
do século XVIII, o "território"5 tornou-se
um elemento constitutivo dos Estados Dinásticos em processo de formação. Embora tendamos
a naturalizá-lo, trata-se de uma categoria nada espontânea. Neologismo
assimilado em Portugal, território aparece no dicionário etimológico de Raphael
Bluteau, em 1712, como "o espaço de terra, nos contornos, & jurisdição
de huã cidade"6. Ora, as "cidades"7 nas
Ordenações do Reino de Portugal eram as "capitais" - "cabeça,
princípio, & fonte, donde outras cousas se encerram" -, ou seja, os
prolongamentos do aparelho estatal, braços da Coroa, no reino ou nas distantes
conquistas ultramarinas. Estar nos contornos e sob a jurisdição de uma
"cidade" significava ser parte de um reino ou império. Não por acaso,
apenas a Coroa tinha a prerrogativa de fundar "cidades" em seus territórios.
No Brasil-Colônia, as instâncias de poder organizavam-se hierarquicamente em
instituições irradiadas a partir das "cidades reais". Seguindo
padrões portugueses, as instâncias administrativa, jurídica e eclesiástica
sobrepunham seus territórios no espaço. As vilas tinham papel hierarquicamente
inferior às "cidades", mas superior às capelas e freguesias. Todas,
igualmente, eram tentáculos metropolitanos na distante "Conquista",
cumprindo papéis distintos na lógica da rede urbana.
3. A rede eclesiástica8 precedia
a rede civil e, em termos jurídicos, ficava submetida a ela. Através da
Igreja, de suas instâncias de base, umbilicalmente ligadas às do próprio
Estado, a institucionalização de povoados dispersos dava-se, inicialmente, pela
oficialização de sua ermida. A elevação de uma comunidade ao estatuto de capela
curada significava a ascensão de uma região inóspita a núcleo reconhecido pela
Igreja e também a garantia de visita de um pároco (cura). Tanto o acesso à
assistência religiosa como o reconhecimento de fato e de direito perante a
Igreja e o Estado motivavam a solicitação junto ao bispado. A subsequente
elevação à condição de freguesia garantia o acesso ao batismo, ao casamento, ao
amparo dos enfermos, aos sacramentos, aos registros de nascimento, de
matrimônio, de óbito, com todas suas implicações jurídicas e sociais. Para além
do acesso ao rito litúrgico, a elevação de uma capela a freguesia implicava em
usufruto da formalidade civil9. Na freguesia, a antiga ermida
merecia nomenclatura de matriz, ganhando a construção de uma sacristia anexa. Para
lá se dirigia a população das capelas curadas vizinhas, para registro de
nascimentos, matrimônios e óbitos. No entanto, em caso de auxílio jurídico,
ambas - capela ou freguesia -, recorriam à vila de cujo "termo"10 eram
parte.
4. A elevação ao estatuto de vila significava acesso
a uma outra categoria institucional e à autonomia política e administrativa:
5. Crescendo sua expressão populacional, econômica e
edificada,
terá aumentado sua aspiração a outra categoria institucional, a outro tipo de
reconhecimento por parte da sociedade organizada, em meio à divisão territorial
estabelecida pelos poderes constituídos, enfim, por parte do Estado. A sua
aspiração seguinte seria constituir não mais um embrião oficial, a célula menor
eclesiástica e administrativa, porém algo mais, que não se referia apenas ao
tamanho ou à ascensão gradual hierárquica: seria alcançar a autonomia política
e administrativa, seria passar a constituir sede de um município, passar a
zelar por si mesma, aglomeração, e por um território próprio correspondente que
lhe seria designado, seu termo. A autonomia municipal colocaria o povoado, quem
sabe a antiga freguesia ou paróquia, como unidade autônoma dentro do Estado,
fosse o reino como uma de suas colônias, fosse esta como o país já
independente. O povoado se tornaria a sede de uma área territorial bem
definida, entre outras mais antigas ou a serem criadas, termos municipais na
ocasião definidos ou redefinidos. Ganhava então, para todos os efeitos, um
lugar ao sol11.
6. A solicitação de elevação ao estatuto de capela e
freguesia era feita pela população junto ao bispado, que, por
ocasião das Visitações do bispo às capitanias, também podia elevar, a seu
bel-prazer, esse ou aquele a tais categorias. Já a condição de vila era
concedida pelo capitão-donatário ou por Ordem Régia. Em solo urbano, a elevação
à categoria de vila implicava na concomitante edificação de uma casa de câmara
e cadeia e de um pelourinho fronteiro a ela. Símbolos da autonomia municipal e
sede da administração, os vereadores e juízes cumpriam, na câmara, funções
legislativas, executivas e judiciárias. Ao Conselho Municipal cabia zelar pelo
patrimônio público (aí incluso o rossio),
bem como conceder os terrenos urbanos (datas) e rurais (sesmarias) a
particulares. "Lugares da vida segura e conversável" (como
mencionadas na documentação oficial quinhentista), embora diminutas em tamanho
e população, as vilas foram polos culturais, políticos e comerciais em solo
colonial.
7. Os diversos contornos assumidos pelo atual estado
de São Paulo oscilaram ao sabor de interesses oficiais e extraoficiais,
materializando-se numa intricada rede urbana, viária e fluvial, viabilizada
graças à sábia simbiose com os indígenas. Malgrado os avanços da historiografia
recente12, ainda temos pouco a dizer, do
ponto de vista da história da urbanização, acerca dessa simbiótica relação
entre indígenas e portugueses na produção do território do Brasil meridional.
Tampouco dispomos de levantamentos sobre a rede eclesiástica - de capelas,
freguesias - e de aldeias indígenas e jesuíticas em solo paulista, o que muito
elucidaria esse lento processo de apropriação do sertão.
8. A cartografia
representa a simbiose entre indígenas e lusitanos, sobretudo nos topônimos
referentes à natureza e à rede urbana. Abundam nomes indígenas mesclados a
nomes lusitanos, propiciando a visualização de algo que ainda carece de
sistematização e interpretação pela historiografia. Neste artigo, ênfase
especial será dada às vilas e cidades, em detrimento da rede de capelas,
freguesias, aldeamentos indígenas e jesuíticos pré-existentes. Subjaz aqui o
convite para estudos futuros e a expectativa de que a cartografia apresentada
forneça pistas para novas linhas de investigação sobre a história da
urbanização13.
9. A seriação dos
mapas permite constatar que, em fins do século XVIII, os contornos da Capitania
de São Paulo mostravam-se muito distintos dos originais e dos atuais14. O Pe. Manuel Aires de Casal assim
a descreveu em 1817:
10. Confina ao norte
com a [Capitania] de Minas Gerais, de que é separada pela Serra da Mantiqueira,
e com a de Goiás de que é dividida pelo Rio Grande; ao sul com a de São Pedro,
da qual é separada pelo Rio Pelotas; ao ocidente com o Rio Paraná, que a divide
das províncias de Goiás e Mato Grosso; a oriente tem o mar oceano, e as
províncias do Rio de Janeiro na parte setentrional, e a de Santa Catarina na
meridional"15.
11. A Capitania de
São Paulo formou-se a partir da união das antigas capitanias de São Vicente e
Santo Amaro, concedidas respectivamente aos irmãos Martim Afonso e Pero Lopes
de Souza, em reconhecimento aos bons serviços prestados à Coroa em 1532, quando
vieram ao Brasil. Os limites geográficos da Capitania de S. Vicente
estendiam-se desde a barra do rio São Francisco do Sul à ilha de Santo Amaro
(atual Guarujá); os da Capitania de Santo Amaro, desde a ilha de mesmo nome até
a enseada de Ubatuba (Figuras 1-3). Obviamente, essas 150 léguas
(inicialmente) concedidas ao longo da costa sul da América portuguesa foram
alargadas em todos os sentidos durante os três primeiros séculos, decorrendo de
um processo de interiorização e expansão territorial de seus habitantes.
Incorporadas, em 1709, por compra, aos bens da Coroa, durante o reinado de D.
João V, foram denominadas Capitania de São Paulo e Minas de Ouro, tendo por
sede administrativa a vila de mesmo nome, elevada em 1711 à categoria de
Cidade.
12. Em fins do
século XVIII, a Capitania englobava o atual estado do Paraná, parte de Santa
Catarina e do Rio Grande do Sul, apresentando um conjunto de cerca de 34 núcleos16 elevados
à categoria de vila17, e uma cidade18, a saber:
|
1. Os núcleos foram
formados a partir de quatro vilas - São Vicente, São Paulo, Mogi das Cruzes e
Taubaté -, conforme o Quadro do Desmembramento Territorial-Administrativo dos
Municípios Paulistas19:
2. A maioria passou
por estágios anteriores, como capela e freguesia, antes de ser elevado a
categoria de vila. Tal logica de desmembramento municipal esteve vigente em
todo o Brasil, implicando na perda de território (i. e. do termo) por parte da celula mater, certamente
envolvendo conflitos de interesses nesses momentos.
[2]
Os primórdios da urbanização nas capitanias de São Vicente e Santo Amaro
(1534.1711)
3. Em princípios do
século XVI, Portugal e senhor de um vasto império colonial, concentrado
sobretudo no Oriente. Com os olhos voltados as lucrativas rotas comerciais da
África e Ásia, fascinado por produtos ali encontrados, exóticos aos olhos do
mercado europeu, Portugal mostrava-se desinteressado pelo território descoberto
nas Américas em 1500, uma vez que ele parecia oferecer pouco aos famigerados
intentos da política mercantilista em vigor.
4. Nas três
primeiras décadas do século XVI, a Coroa portuguesa empenhou-se em mandar ao
novo mundo apenas umas poucas expedições de reconhecimento da costa,
estabelecendo algumas feitorias que não passaram de meros pontos de escala,
sinais de posse, bases de policiamento da costa, entrepostos de coleta de
pau-brasil - único produto aí encontrado que interessava ao mercado europeu.
Essas feitorias de caráter militar tiveram função econômica insignificante,
muitas delas não chegando a enraizar-se no local em que foram fundadas. Segundo
Aroldo de Azevedo20, não passaram de 12, desaparecendo
posteriormente. Restaram Cabo Frio e Igaraçu.
5. A visitação de
estrangeiros à costa, sobretudo franceses em busca de pau-brasil, foi
estimulada pelo desinteresse português. Assim, em 1532, D. João III decidiu
colonizar a América portuguesa, única forma de manter a posse das terras
descobertas. Enviou o fidalgo Martim Afonso de Souza que, em conformidade com
as instruções trazidas, subiu ao planalto e percorreu a costa sul até o Prata,
distribuiu terras e fundou a vila de São Vicente21 [1532],
que constitui o marco inicial de um novo período.
6. Decidindo-se
pelo sistema (já experimentado em Cabo Verde) de capitanias hereditárias, a
partir de 1534 a Coroa dividiu com fidalgos portugueses o ônus22 do
projeto de colonização. Aos donatários coube a função de fundar vilas, conceder
terras, defender a costa, dinamizar e povoar o território da sua capitania,
portanto, a de viabilizar a colonização.
7. A realidade não
se concretizou da maneira esperada. As adversidades impediram o desenvolvimento
das propostas iniciais. O plantio da cana-de-açúcar (produto também
experimentado em Cabo Verde e São Tomé, então escolhido com vistas ao mercado
externo) só se efetivou em algumas capitanias - São Vicente e Pernambuco. O
fracasso gerou a necessidade de constituição de um governo metropolitano na
Colônia, o Governo Geral (1548/1549), que teve como sede a Cidade de Salvador
da Bahia de Todos os Santos (1549), criada em território reincorporado pela
Coroa. Com o primeiro governador-geral, vieram os jesuítas, que em muito
auxiliaram no processo de adaptação às adversidades da colônia. A política
urbanizadora, decorrente da política de colonização, até meados do século XVII
consistiu apenas na fundação de cidades reais pela Coroa, com função de controle
regional, e no incentivo da formação de vilas por iniciativa e às custas dos
donatários. A Coroa procurou utilizar ao máximo os recursos dos particulares23.
8. Rigoroso frio
dominava o planalto da Capitania de São Vicente, frio esse que, aliado às
dificuldades de acesso ao litoral, ali inicialmente inviabilizaram o plantio da
cana-de-açúcar, limitando-o a fazendas na costa. Embora desde o início se
produzisse algum açúcar e aguardente na Capitania de São Vicente, essas
atividades atendiam apenas às necessidades locais, devido às dificuldades de
transporte, e só adquiriram importância na segunda metade do século XVIII 24. Nos inventários das capitanias de
São Vicente e Santo Amaro é revelada extrema austeridade. Como as cartas do
atlas de Albernaz o demonstram, no século XVI e princípios do XVII, a área
efetivamente povoada limitava-se à costa, salvo a Vila de São Paulo de
Piratininga, uma exceção, situada no planalto por ação dos jesuítas. Embora
elevados à categoria de vila, os cinco núcleos quinhentistas - São Vicente,
Santos, Itanhaém, Iguape e São Paulo - eram bastante diminutos; meros povoados
de casas de pau-a-pique25, cobertas de sapé, à maneira
indígena, um pelourinho, uma igrejinha, geralmente cercados por paliçadas
(apenas por ordem do governador-geral D. Francisco de Souza, substituídas por
muros de taipa de pilão). Nesses núcleos primitivos, é marcante a presença dos
jesuítas, que procuravam auxiliar no tratamento com o gentio.
9. Para chegar ao
planalto, havia apenas o chamado Caminho de Paranapiacaba, antiga trilha dos
indígenas. Posteriormente, em 1553, fez-se o Caminho do Padre José, que saía na
altura de Cubatão. Nesses primeiros tempos, a rede urbana era frágil, e a
simbiose com os indígenas, uma estratégia de sobrevivência. Durante os
primeiros séculos, os índios compunham a maior parte da população local, e toda
a expansão se fez através de suas velhas trilhas26. Essa singular combinação de
índios, mestiços e brancos conferiu feição particular aos vicentinos.
10. Os anos da
dominação espanhola, por ocasião da união das coroas ibéricas (1580-1640),
marcaram a consolidação da vitória contra os franceses, sobretudo na costa
norte do Brasil e no Rio de Janeiro. Tal avanço era parte de uma deliberada
política dos felipes, traçada e executada em obediência a planos concretos.
Além de livrar da posse dos franceses grande parte do norte, nordeste e
sudeste, a política felipina promoveu a elaboração sistemática de relatórios
sobre o território colonial - as Relaciones
Geographicas de Indias - e
estimulou a interiorização de sertanistas em busca de metais preciosos,
articulada à abertura de caminhos, ao povoamento e à conquista do sertão em
torno à Vila de São Paulo.
11. Nas antigas
capitanias de São Vicente e Santo Amaro, desde 1624 chamadas de capitanias de
Itanhaém e São Vicente, cinco núcleos - três situados no litoral e dois no
planalto - foram elevados à categoria de vila: São João Batista de Cananeia,
São Sebastião, Exaltação da Santa Cruz do Salvador de Ubatuba, Santana de
Mojimirim (atual Mogi das Cruzes) e Santana de Parnaíba.
12. Os novos núcleos
do planalto deveram-se aos estímulos de buscar metais, encabeçados por D.
Francisco de Souza - 7º Governador Geral do Brasil - que, em 1599, em função
das notícias sobre mineração de ouro e ferro no Jaraguá, transferiu residência
de Salvador para São Paulo, aí falecendo em 161127.
13. No entanto,
havia uma razão específica nesse programa de estímulo à interiorização e
povoamento de novas áreas, concomitante à busca de metais. Nesse período, o
açúcar passou a dominar, em importância, o mercado mundial, assim permanecendo
durante um século. Na segunda metade do século XVI, o império espanhol atingiu
seu apogeu terrestre e marítimo, sendo interessante, inclusive para Portugal, a
união das coroas em 1580.
14. A mudança da
base econômica das especiarias para o açúcar condicionou um aumento do número
de engenhos no Brasil no último quartel do século XVI. Em contrapartida, o
monopólio português na Rota do Cabo encontrava-se, desde 1595, abatido pelos
holandeses e ingleses, que reduziram a menos de 1/3 o comércio dos portugueses
no Oriente. Os carregamentos de especiarias diminuíram, portanto, em 1/3. Em
função da concorrência inglesa e holandesa, cada vez mais aguda, Portugal
simpatizou com a união das duas coroas - as grandes envolvidas nesse comércio
progressivamente ameaçado pela concorrência de outras potências ultramarinas.
15. Em 1612, os
franceses instalaram-se definitivamente no Maranhão. Em 1624 (após o fim da
trégua com as Províncias Unidas dos Países Baixos), a Companhia das Índias
Ocidentais, criada em 1621, fez sua primeira investida na Bahia, sendo os
holandeses expulsos no ano seguinte. Nova tentativa ocorreu em 1627. Em 1628,
Piet Heyn tomou, perto de Cuba, toda uma frota espanhola de carregamento de
prata; em 1630, ocorreram os primeiros ataques a Recife e Olinda; em 1634, à
Paraíba; em 1635, a Capitania de Pernambuco foi totalmente conquistada. Se não
bastasse a tomada da região mais importante de produção de açúcar, os
holandeses ainda atacaram, em 1637, São Jorge da Mina e, em 1638, Angola. Isso
sem contar o apresamento - de 1623 a 1638 - de 547 navios carregados de açúcar.
Resultado: perda do ouro africano e dos tratos do golfo da Guiné; forte
diminuição da área açucareira e tabaqueira; toda a agricultura e comércio do
açúcar gravemente atingidos; Angola ameaçada e a fonte de escravos
comprometida; além de insegurança na navegação através dos oceanos28.
16. Esta conjuntura
internacional condicionou a política felipina de estímulo às
"entradas" e "bandeiras" dos sertanistas, em busca de ouro
e de indígenas escravos (que a África negra agora recusava). A necessidade de
conviver no planalto gerou nos vicentinos desembaraço no sertão. A
familiaridade com o gentio, o aprendizado dos segredos do sertão e dos
mecanismos de sobrevivência, condicionaram um tipo humano, meio português e
meio índio, o mameluco, imortalizado na obra de Sérgio Buarque de Holanda29. Era estratégico acioná-los neste
momento, para dilatar a presença metropolitana em solos do ultramar.
17. Esse estímulo a
interiorizarem-se no sertão, em busca de metais preciosos e escravos, gerou
intermináveis conflitos com a Companhia de Jesus, que dominava, na época,
vastos territórios subtraídos da jurisdição metropolitana, administrando-os
economicamente de maneira autônoma, conforme seus próprios interesses. Tendo
como fundamento assegurar a "liberdade" do índio, os jesuítas
subtraíam abundante mão-de-obra, contrariando brutalmente os interesses
metropolitanos de então. Na década de 1620, agudizou-se o antagonismo. Em 1624,
os paulistas destruíram algumas aldeias e reduções jesuíticas. De 1630 a 1635,
fizeram novas incursões ao Paraguai. Sedes de colégios dos padres jesuítas - no
Rio de Janeiro, Santos e São Paulo - vivenciaram violentos motins, que
culminaram com a expulsão dos padres de São Paulo e Santos. Regressaram a São
Paulo em 1640 e 1653; no entanto, em 1658, os paulistas voltaram a atacar as
missões do Paraguai. A sociedade civil paulista, ansiosa por viabilizar a
colonização mesmo às custas da escravização dos indígenas, pôs-se em luta
contra o Estado teocrático aqui estabelecido. Como deixariam de entrar em
conflito, em tempos de crise, se já no século XVI tantas vezes os interesses e
orientações dos missionários chocavam-se com aqueles dos leigos, colonos e
mercadores. A crise de todo o império hispano-português agravou tensões e
desencadeou enfrentamentos.
18. Em 1640, os
portugueses clamavam pela "Restauração do Trono". As grandes fortunas
de Portugal viram suas expectativas frustradas quanto aos benefícios da união
das coroas ibéricas. Castela não logrou policiar os mares, e não se concretizou
o desejo de associação na exploração das "maravilhosas" minas de
prata da colônia espanhola. Os portugueses - impossibilitados de fornecer
mão-de-obra africana em função da insegurança marítima e da presença dos
holandeses em seus principais entrepostos - colaboraram no declínio da produção
da prata, dada a escassez de mão-de-obra. Consequentemente, em 1640, Castela
impediu a presença de estrangeiros em suas atividades coloniais. Tal atitude
marcava o fim de qualquer esperança de parceria rentável. Afinal, o domínio
espanhol foi uma ilusão e, sobretudo, um mau negócio. O fim dos interesses
marcou o fim da união30.
19. No entanto, no
que tange às capitanias dos herdeiros de Martim Afonso e Pero Lopes de Souza
representou progresso. A mineração de ouro31 estimulou
a caça aos silvícolas, para o abastecimento de mão-de-obra nas minas, gerando
um período extremamente dinâmico na região sudeste da colônia, até então à
margem da economia de exportação. O resultado foi o surgimento de uma série de
novos arraiais, alguns deles merecendo foros de vila. No litoral, as vilas de
Cananeia, Iguape e Paranaguá, amparadas pelos jesuítas (e isoladas do que se
podia chamar de eixo principal de trânsito da capitania: São Paulo-Santos-São
Vicente), começaram a polarizar importante território voltado à mineração de
ouro. O litígio entre os herdeiros dos antigos donatários das duas capitanias
gerou a perda de Santos, São Vicente e São Paulo para os herdeiros de Pero
Lopes.
20. A antiga
Capitania de São Vicente, passou a ser chamada de Capitania de Itanhaém, em
função da transferência da sede de seu governo para a Vila de Nossa Senhora da
Conceição de Itanhaém. As descobertas e explorações dessas minas de ouro de
lavagem na região do vale do Ribeira e baía de Paranaguá dinamizaram a economia
local. A exploração do ouro foi feita com mão-de-obra indígena,amplamente
escravizada para tanto, convertendo-se em excelente negócio, para os paulistas,
aprisioná-los para abastecer as zonas de mineração. John Monteiro32 admite
a existência do tráfico de índios inclusive para outras capitanias, mas refuta
a sua importância. O grosso da mão-de-obra escravizada direcionava-se às minas
locais33. Mesmo assim, quanto à dimensão,
por exemplo, a vila de Iguape era tão humilde e tão pequena, que, em 1679, o
capitão-mor Luiz Lopes de Carvalho, ouvidor de Itanhaém (em edital, em nome do
conde donatário), determinou que, "em vista das poucas moradas que haviam
na vila, fosse cada um obrigado, dentro de um ano, a fazer a sua casa, tendo
cem mil réis de bens para cima, sob pena de dez cruzados de multa"34.
21. Em função da
ânsia de escravização dos indígenas, ao longo de todo o século XVII a luta
contra os jesuítas tornou-se constante, deixando estes de servir para o auxílio
dos indígenas e em seu controle. Agora, o novo período de caça ao silvícola os
convertera em grandes inimigos das lucrativas empreitadas. Mas, sem dúvida, os
inacianos tiveram papel decisivo na ocupação, desenvolvimento e definição do território
paulista. No planalto, deram início à povoação de Piratininga; salvaguardaram a
existência de povoações ao longo da costa, como Cananeia, Itanhaém, Paranaguá,
São Vicente e Santos; foram importantes responsáveis pela sustentação dessa
frágil rede urbana dos primeiros tempos da Capitania. Navegaram rios,
avizinharam-se do Paraguai, abriram rotas e possibilidades de expansão.
22. Em 1553, o padre
Manoel da Nóbrega navegou o rio Anhembi (Tietê), chegando próximo ao Paraguai.
O trajeto pelos rios Tietê, Paraná, até o Prata (Assunção) e vice-versa era
habitual. Durante o governo de Mem de Sá, em função das contínuas lutas contra
os indígenas confederados, diversas vezes se passava por essas regiões. Os
paulistas desciam, os espanhóis subiam o curso do rio Tietê e o comércio
incipiente já se dilatava, tendo por base as trocas de produtos nativos ou
cultivados. O apresamento do silvícola foi, sem dúvida, o maior incentivo às
viagens sinuosas dos intrépidos sertanistas, mas não o único aspecto
determinante da expansão e interiorização.
23. Muitos
procuraram, desde o início, fazer roças mais afastadas, onde houvesse mais
facilidade de encontrar terras melhores e ainda virgens, mantendo o velho
costume indígena da agricultura itinerante. A interiorização foi lenta, mais
progressiva. Os primeiros colonizadores, sobretudo os vindos com Martim Afonso,
obtiveram sesmarias e, nelas, aos poucos criaram agrupamentos, e os
agrupamentos geraram a necessidade de auxílio espiritual (necessário para
aqueles homens estabelecidos em universo tão inóspito). Assim foram fundadas as
primeiras povoações no planalto além da vila de São Paulo de Piratininga.
24. Primeiro,
Santana de Mojimirim (atual Mogi das Cruzes), nas cabeceiras do rio Tietê,
fruto de povoamente estimulado por D. Francisco de Souza por ocasião da
abertura de caminho ligando Boigy (antigo nome do local) a São Paulo, em 1601,
que deu origem à sesmaria solicitada pelo fidalgo português Brás Cubas.
Exercendo o cargo de capitão-mor, lugar-tenente de Martim Afonso (o donatário
da Capitania de São Vicente), Brás Cubas pôde dar origem não só a Santos35 (1545),
mas também a esse agrupamento no planalto, elevado, em 1611, à categoria de
vila. Os mogianos organizaram "entradas" e "bandeiras" ou,
à procura de ouro e à cata de índios, acompanharam-nas.
25. Também fruto da
era martim-afonsiana, após se estabelecer em São Vicente e São Paulo (onde
exerceu cargos administrativos), Manuel Fernandes Ramos, natural de Moura,
recebeu sesmaria de oito léguas ao longo do rio Tietê, nas proximidades da vila
de São Paulo de Piratininga, onde seus herdeiros iniciaram fazenda em 1580.
Ali, seus filhos e esposa distribuíram terras aos parentes e amigos. Assim,
foram aparecendo moradores em torno da capela, então construída às margens do
rio, no trecho em que se tornava encachoeirado. A cultura de produtos de
subsistência e de cana-de-açúcar (que teria vindo de São Vicente) supria as
necessidades básicas e a descoberta de ouro nas imediações estimulou a
permanência desse pequeno núcleo humano. Produtos da lavoura eram permutados
com outros; casas iam surgindo aqui e acolá, cobertas de folhas.
26. Nascia assim
Santana de Parnaíba36. O fundador, padroeiro e
instituidor da capela André Fernandes (filho de Manuel Fernandes), por ordem
régia, fez inúmeras entradas oficiais no sertão - quer na luta contra os jesuítas,
participando da destruição das Missões do Guairá (1629-1630), quer à procura de
índios e metais preciosos. Essa sesmaria compreendia toda a região de Parnaíba,
Itu, Sorocaba e São Roque. Cada um dos filhos de Manuel Fernandes recebeu em
herança uma fração dessas terras, estabelecendo ali ao redor novas povoações
que, ao longo do século, obtiveram da Coroa Portuguesa os foros de vila: em
1657, Nossa Senhora da Candelária do Outu; e, em 1661, Nossa Senhora da Ponte
de Sorocaba37.
27. A ocupação do
sertão seguiu novos rumos. Deixando São Paulo, via Carapicuíba, penetrava-se em
terras de Parnaíba, onde, desde 1580, Suzana Dias e André Fernandes haviam aberto
a mata serrada. Noutra direção, contornando o morro do Jaraguá, no sertão do
rio Jundiaí, foi fundado um povoado, fruto da ação dos parnaibanos. Elevado a
vila em 165538, as origens de Jundiaí são
bastante obscuras, mas sabe-se que até então a civilização paulista terminava
no morro do Jaraguá, onde, em fins do século XVI, Affonso Sardinha descobriu e
extraiu ouro. Foi Jundiaí, portanto, a primeira povoação além-Jaraguá, dando
ensejo a uma série de outras nessa direção.
28. Outra frente de
urbanização, fruto da ação dos mogianos, ocorreu às margens do rio Paraíba,
onde, no século XVII, fundaram Taubaté, Jacareí e Guaratinguetá. Sabe-se que,
desde o período quinhentista, o Vale do rio Paraíba foi não só um eixo de
passagem mas um objetivo. O apresamento de índios teve enorme importância na
incorporação desse sertão à Capitania de Santo Amaro. Foram concedidas
sesmarias nas margens do Paraíba, povoando-se o vale com o auxílio do rio e de
um caminho a ele paralelo. Seguindo trilhas indígenas anteriores, a expansão
deu-se em todas as direções. Outras trilhas indígenas pré-existentes foram
aproveitadas e melhoradas pelos intrépidos mogianos e taubateanos.
29. Em algumas das
sesmarias concedidas, esses caminhos primitivos condicionaram o surgimento de
povoações. O Caminho dos Guainás - que subia de Parati, passando pela freguesia
do Facão (Cunha), atingindo Guaratinguetá - viabilizou o surgimento desses dois
núcleos no planalto e dinamizou o porto de Parati (elevado a vila em 1660),
pertencente à Capitania do Rio de Janeiro. Outras trilhas interligadas a rotas
fluviais ligavam o planalto ao litoral, de Taubaté a Ubatuba e de Jacareí a São
Sebastião.
30. Ao contrário do
que pensaram os portugueses, a "Restauração do Trono" não deu fim à
crise em que estavam mergulhados. Portugal, embora tenha retomado (das mãos da
Companhia das Índias Ocidentais) possessões na África e no Brasil, deparou-se
com a triste realidade da perda progressiva de monopólios importantes. A Rota
do Cabo deixara de ser o eixo do império português, e a economia do açúcar
estava em franco declínio. O Brasil mantinha-se como o maior produtor, mas,
dada a concorrência dos holandeses nas Antilhas, não mais monopolizava o
mercado. Feito um balanço, poucas iniciativas foram tomadas pela Coroa para
socorrer a economia do açúcar. Ao invés disso, concentrou seus esforços em
extrair tudo quanto podia de uma indústria estagnada39.
31. Durante o
reinado de D. Pedro II (1668-1706) [de
Portugal], foram estabelecidos cinco
programas de estímulo ao desenvolvimento da colônia. Na ocasião, com vistas
a aumentar os rendimentos da Coroa, foram desencadeadas ações diretas e
enérgicas no sentido de buscar outras atividades que pudessem dinamizar a
economia colonial:
1. novo programa de incentivo à caça ao ouro;
2. criação da Colônia do Sacramento, visando a
atrair o comércio da prata peruana;
3. encorajamento ao cultivo de sementeiras
transportadas do Extremo Oriente para as capitanias do norte do Brasil,
tentando desenvolver o cultivo de especiarias na América Portuguesa;
4. instituição da Junta do Tabaco, no esforço de
explorar um melhor produto que pudesse ajudar a preencher a lacuna deixada pela
economia do açúcar, em franco declínio;
5. tentativa de recuperar o contrato do monopólio
de fornecimento de escravos africanos.
32. Desses
programas, dois atingiram diretamente as capitanias paulistas: a nova fase de
estímulo à caça ao ouro e a fundação, no estuário do rio da Prata, da pequena
povoação da Colônia do Sacramento (1680)40.
33. Há décadas vinha
se processando a procura da riqueza mineral no Brasil, ocorrendo descobertas de
metais e pedras preciosas nas imediações de São Paulo, de Santana de Parnaíba,
do vale do Ribeira e da baía de Paranaguá, mantendo vivo o sonho da existência
de mais riquezas nas longínquas terras do interior. A partir de 1668, a nova
política metropolitana de estímulo dinamizou a procura. Afonso Furtado de
Castro do Rio de Mendonça (governador-geral empossado) e outros oficiais foram
encarregados de encorajar a descoberta de novas minas.
34. A administração
de Mendonça marcou uma época de grande atividade na busca de ouro, prata e
esmeraldas. Os colonos foram incessantemente estimulados à descoberta de
riqueza mineral. Ofertas de títulos de nobreza e outras formas de recompensa
atuaram como incentivo para os sertanistas que, finalmente, puseram a
descoberto os grandes tesouros das minas de Cataguazes em 1693/1695.
35. Taubaté41, elevada à condição de vila desde
1645, foi um dos polos de irradiação, bem como São Paulo e São Vicente e,
posteriormente, Itu e Sorocaba. Coube aos taubateanos as primeiras descobertas
das minas de Cataguases42. Expedições atravessaram a serra
da Mantiqueira pelas gargantas do Sapucaí ou do Embaú. Do vale do Paraíba
partiram centenas de "entradas" e "bandeiras", dirigindo-se
às minas. Os núcleos ali estabelecidos, já elevados à condição de vila no
período que se seguiu à "Restauração", desenvolveram-se e se
integraram ao novo frenesi de busca de ouro e metais preciosos.
36. De
Guaratinguetá, partiram expedições às minas, bem como da nascente povoação de
Pindamonhangaba. O chamado Caminho Velho para as minas de Cataguases,
apresentava o seguinte roteiro: de Taubaté ia-se até a freguesia de Piedade
(atual Lorena) e dali cruzava-se a Mantiqueira em direção ao sertão das minas.
Não havia um caminho direto entre as minas e o Rio de Janeiro, o que obrigava o
trajeto inverso: Minas / Piedade (Lorena) / Taubaté / Facão (Cunha) / Parati /
Rio de Janeiro. O detalhe da Carta
9a. dos padres matemáticos
revela a trilha percorrida entre Piedade e o porto de Guarauna (Parati),
pontuada por inúmeras capelas (Figura 4).
37. A Casa dos
Quintos (1695) foi destinada a Taubaté43, ponto obrigatório de passagem, e,
a seguir, a Casa de Fundição (1697). O objetivo era combater a sonegação,
legalizando o metal e cobrando a conhecida quinta parte destinada à Coroa.
Durante os fins do século XVII, Taubaté funcionou como o ponto oficial de
manipulação e encaminhamento do metal ao reino. Tudo quanto se dirigisse às
Minas passava por Taubaté, inclusive os próprios baianos que, nos primórdios da
mineração, tendo passe livre no território aurífero, voltavam para sua terra
entrando pelo rio São Francisco através de Taubaté. O mesmo acontecia com os
gêneros alimentícios44, roupas, animais e escravos,
destinados ao longínquo sertão das Gerais. Foram os taubateanos os verdadeiros
abastecedores das minas, e a rota do vale do Paraíba a mais importante em fins
do século XVII e nas três primeiras décadas do século XVIII.
38. Embora
severamente vigiado, sonegava-se o ouro; e tornou-se ineficiente o procedimento
utilizado na Casa de Fundição taubateana, que cunhava as barretas a martelo,
viabilizando a fabricação de cunhos falsos. Portugal determinou, em 1702, que
Taubaté fosse aparelhada com uma máquina de cunhar. Mas as dificuldades do
trajeto (via Parati), dado as péssimas condições do Caminho do Facão,
impossibilitaram o transporte do engenho cunhador para Taubaté. A permanência
da máquina em Parati levou o capitão-mor a transferir a Casa dos Quintos e a de
Fundição para o litoral. Na primeira década do século XVIII, os conflitos nos
territórios auríferos - entre paulistas, reinóis e baianos - são indícios do
fim do monopólio dos primeiros na região descoberta. A pequena sociedade urbana
do vale do Paraíba, que durante décadas fervilhara com o comércio, iniciou seu
período de declínio.
[3]
A Capitania de São Paulo e Minas de Ouro (1711-1765)
39. Em 1709, em
função das descobertas auríferas, a Coroa reincorporou, por compra, os
territórios já bastante dilatados das antigas capitanias de São Vicente e Santo
Amaro, para controlar efetivamente a nova região que, cada vez mais, crescia em
importância aos olhos metropolitanos. Para sede da Capitania de São Paulo foi
escolhida a vila de São Paulo dos Campos de Piratininga, elevada à condição de
cidade em 1711.
40. A criação dessa
Capitania de São Paulo e Minas de Ouro marcou não só o início de um período de
absoluta centralização administrativa de Portugal em relação ao Brasil mas,
principalmente, o menosprezo por aqueles que muito tinham contribuído para a
dilatação da Conquista: os donatários e demais colonos.
41. No final do
século XVII, encontramos a então Capitania de São Paulo e Minas de Ouro com
limites completamente diversos das primitivas Capitanias de São Vicente e Santo
Amaro, que lhe deram origem. A sua própria denominação refletia a mudança. Com
uma rede urbana bastante ampliada e um território em grande parte explorado,
interiorizado, podemos dizer que, de periferia, a capitania passou a grande
polo transformador dos destinos econômicos da colônia. Encerrou esse segundo
século com um conjunto de 14 novas vilas que, sem dúvida, constituem uma
representação espacial da mudança dos interesses metropolitanos em relação à
região.
42. Cada novo
caminho oficial, cada nova vila e cada nova alteração de traçado urbano
consistia na oficialização dos passos dos diversos atores envolvidos no
processo de colonização. A busca de novas fontes de riqueza condicionou essa
interiorização, e cada passo foi oficializado ao sabor dos interesses
metropolitanos, merecendo o estatuto de vila. As novas vilas, portanto, não
nasceram aleatoriamente (FIGURA 5).
43. Após a Guerra dos Emboadas, os paulistas foram
progressivamente expulsos das minas de Cataguases e, por isso, deslocaram-se
para mais longe, descobrindo minas em Mato Grosso (c.1719) e em Goiás (c.
1725).
44. Na lógica da
colonização, a mudança do foco de interesse e a ênfase do controle
metropolitano em determinada região condicionava a redefinição do papel das
demais regiões. À medida que os segredos revelados nos novos sertões foram
merecendo controle por parte da Coroa, houve progressiva decadência em certas
áreas.
45. No fim do século
XVII, Santos estava em situação de pronunciada penúria, com todos os gêneros
custando uma exorbitância, e o nível de vida extremamente difícil para os
desfavorecidos de fortuna. A isso, somou-se a grande epidemia de
"bexigas" (varíola), calamidade que assolou a vila de 1665 em diante.
Essa pestilência matou 1/3 da população e gerou medidas proibitivas de
comunicação, a ponto de ser fechado o Caminho do Mar, interrompendo oficialmente
a ligação de Santos a São Paulo: "por aver três meses que estava o caminho do
mar fechado he com guardas por ordem desta Camara, a requerimento do povo, por
causa de averen bexigas na Vila de Santos"45.
46. Ao contrário de
Santos - nessa época mergulhada em epidemias cíclicas -, São Paulo progredia a
olhos vistos. Foi do planalto que partiram as "expedições" de
interiorização; foi no interior que se multiplicaram os povoados e
concentraram-se todas as atividades de abastecimento dos territórios auríferos,
fatos esses coroados, em 1683, com a transferência, para São Paulo, da sede da
capitania, em confirmação ao foral de 1681, golpe mortal para os santistas (dada
a pobreza da vizinha São Vicente, desempenhara Santos, efetivamente e, durante
muitos anos, as funções de capital da Capitania de S. Vicente). Todos os
produtos importados vindos do Rio de Janeiro passavam pelo porto de Parati, e
não, pelo porto de Santos. Já os muares, bois e cavalos provenientes do sul e
os gêneros de primeira necessidade obrigatoriamente passavam pelo vale do
Paraíba, dinamizando a rede urbana no planalto e no litoral norte. (Figuras 6)
47. No entanto, após
1725, com a abertura do Caminho Novo46, ligando as Minas Gerais
diretamente ao Rio de Janeiro, entraram em franco declínio e estagnação as
vilas do vale do Paraíba. Perdeu-se muito com o deslocamento, para outras
paragens, de um trajeto obrigatório intensamente percorrido por quase meio
século - sobretudo se pensarmos que, ao longo do Vale do Paraíba, havia importante
rede organizada de comércio. O deslocamento da rota levou igualmente à
estagnação dos portos situados no litoral norte da Capitania de São Paulo.
Desde 1720, Parati deixou de sediar a Casa de Fundição. Aos poucos, toda a
população deslocou-se em direção às novas riquezas, permanecendo o litoral
praticamente abandonado e isolado do comércio com as minas do ouro. A partir de
então, todo o escoamento do metal se fez diretamente via Rio de Janeiro.
48. Mesmo assim a
Capitania de São Paulo se manteve viva, funcionando como entroncamento47 de trocas de longa distância com o sul
e o centro-oeste. Não podemos esquecer
da enorme expansão, conquistando os sertões - em direção ao sul, ao Mato
Grosso, e a Goiás -, obra dos paulistas.
49. A presença dos
portugueses no rio da Prata data de 1680, ao ser fundada a Colônia do
Sacramento, com intuito de reforçar a autoridade portuguesa na região e atrair
o comércio da prata peruana. Embora o maior estímulo para tal fundação tenha
sido abrir caminho para o escoamento da prata da América espanhola via América
portuguesa, a realidade e o desenrolar dos fatos demonstraram que o grande
lucro e a maior recompensa deste empreendimento foi a pecuária que ali se
desenvolveu, sob influência dos castelhanos e jesuítas.
50. Além disso,
inúmeras incursões dirigiram-se aos sertões, partindo de Paranaguá, culminando
por revelar a existência de metais preciosos nos campos de Curitiba. Na região,
desenvolveu-se um povoado, elevado à condição de vila em 1693. Sabe-se que o
Caminho de Curitiba, em direção a São Paulo, datava de antes da criação da
vila, sendo ele progressivamente ladeado por sesmarias.
51. A partir dos
primeiros anos do século XVIII, como simples extensão de velhas trilhas
indígenas, esta rota se converteu na via de acesso aos campos do sul e trajeto
de passagem das tropas de bois, muares e cavalos destinadas a Minas Gerais,
Goiás e Mato Grosso, merecendo o nome de Caminho do Viamão, por articular as
vilas de Viamão e Sorocaba48.
52. As descobertas
auríferas ocorridas nos mais diversos sentidos geraram a necessidade de
centralização e controle progressivos. Não por acaso, a Coroa adquiriu, como já
dito, as terras das mãos dos antigos donatários e, em 1709, fundou a Capitania
de São Paulo e Minas de Ouro, com sede estabelecida na Vila de São Paulo,
elevada em 1711 à categoria de Cidade, fato que evidencia concretamente a
mudança de atitude e o interesse que a região despertava na Coroa. As atenções
se concentravam ali; era preciso transferir toda a administração metropolitana
para a região.
53. A nova capital
passara a ser ponto-chave de um território superior a três e meio milhões de
quilômetros quadrados, quase metade do Brasil. Em 1711, a Coroa também iniciou
franca política de urbanização na região das minas de Cataguazes, aspirando a
assegurar o controle da área mais valiosa da América portuguesa, agrupando
indivíduos em povoados consolidados, reduzindo assim as possibilidades de
contrabando. Sob o discurso ideológico de que a ereção de vilas era o melhor
meio de "civilizar" e "desenvolver os rudes povoados", o
programa do governo, num curto período de sete anos, condicionou a criação de
oito novas vilas no território das Minas Gerais: Sabará, N. S. do Carmo
(Mariana) e Vila Rica, em 1711; São João del Rey, em 1712; Vila do Príncipe
(Serro Frio) e Vila Nova da Rainha do Caeté, em 1714; Vila Nova do Infante
(Pitangui), em 1715; e São José del Rey (Tiradentes), em 171849.
54. Em resposta a
quatro estímulos - distribuição de terras; descoberta do ouro; necessidade de
lei e ordem no sertão; e ameaça dos futuros interesses espanhóis -, a Coroa
cobriu o sertão com essa rede de vilas, fazendo de algumas delas cabeças de
Comarca. Os arraiais mineradores que tiveram origem espontânea no decorrer da primeira
década foram assim, progressivamente, elevados ao estatuto de vila, alojando os oficiais
administrativos provenientes do reino.
55. Ao longo das
quatro primeiras décadas do século XVIII, esse imenso território, cuja
administração e jurisdição cabia a São Paulo, foi duplamente ampliado com a
descoberta de novas jazidas de ouro nas regiões de Mato Grosso (c. 1719) e
Goiás (c. 1725), onde modestos arraiais de mineração foram logo igualmente
elevados à condição de vila: Vila do Senhor Bom Jesus de Cuiabá50 (1726)
e, dez anos mais tarde, Vila Boa de Goiás51(1736). Da cidade de São Paulo, uma
rede fluvial e viária espraiava-se em direção ao oeste e ao sul, ultrapassando
- e muito - a Linha de Tordesilhas.
56. A partir de
1720, a dificuldade para controlar tão vasto território levou a Coroa, a
desligar da Capitania de São Paulo (paulatinamente, mutilando-a) as minas e
suas repartições. Foram desmembradas de São Paulo, as regiões de Minas Gerais
(1720), Rio Grande de São Pedro e Santa Catarina (1738), Goiás (1744) e Mato
Grosso (1748).
57. O primeiro golpe
ocorreu na região das minas de Cataguazes, com a transferência para Vila Rica
(Ouro Preto) da Casa dos Quintos e de Fundição, outrora sediadas em Parati. O
desmembramento efetivou-se em 1720, com a criação oficial da Capitania das
Minas Gerais. A partir de então, nota-se a perda contínua de autonomia
política, passando a cidade de São Paulo a ter a presença constante de
delegados régios, sendo Rodrigo César de Menezes o primeiro deles. Embora a
sede do governo se localizasse aí, as atenções foram desviadas para outros
pontos.
58. Desde então, os
governadores empenharam-se em promover o progresso da mineração em Mato Grosso
e Goiás. Quando observamos o número de vilas criadas no período, fica clara a
desatenção em relação ao território paulista. Embora a expansão tivesse elevado
em muito o número de novos povoados, não havia nenhuma preocupação, por parte
da Coroa, de efetivamente controlá-los.
59. Assim, nessa
primeira metade do século XVIII, deparamos-nos com uma única situação de
elevação de um núcleo à categoria de vila e somente porque a concessão, em
1705, dos foros de vila a Pindamonhangaba foi fruto de uma atitude clandestina
de seus fundadores. Sentindo o povoado já em condições de autogerir-se, eles
envolveram um desembargador, que estava de passagem, para, na calada da noite,
estabelecer juízes e oficiais para a câmara e levantar o pelourinho. A atitude
provocou a revolta e protestos de Taubaté, a qual era subordinada a Freguesia
de São José de Pindamonhangaba. Alegavam que, sem qualquer Ordem Régia ou
provisão do donatário da ainda Capitania de Itanhaém, o ato era ilegal.
60. O fato é que, em
1705, a rainha D. Catarina (que substituiu D. Pedro II, gravemente enfermo)
acatou o ocorrido, dirigindo Carta Régia, ao Ouvidor de São Paulo, ordenando
que novamente se criasse a vila de Pindamonhangaba, após repreender severamente
os autores do ato arbitrário. Pindamonhangaba manteve-se como a única vila
criada na primeira metade do século XVIII.
61. Ao contrário da
situação supracitada, foi ao sabor de planos e projetos previamente estabelecidos
que todo o território da colônia visado pela Coroa foi estruturado. Nas mãos
dela, a política de urbanização tornou-se centralizada em territórios que
simbolizavam lucratividade e interesse geopolítico52, gerando tensões e conflitos com a
população local.
62. Embora esses
programas de criação de vilas não dissessem respeito ao território paulista
propriamente dito, engendrou nele muitas melhorias e incrementos, em função da
necessidade de aperfeiçoar-se continuamente o sistema de comunicação com as
novas regiões a ele anexadas. A rede urbana e de caminhos não só se ampliou ao
longo do século, como sofreu inúmeras melhorias.
63. A partir da
cidade de São Paulo, uma rede de caminhos irradiava-se em todas as direções (Figura 7).
64. A descoberta das
Gerais coincidiu com o aumento do trânsito no Caminho de Curitiba. Desde os
primeiros anos do século, passavam por ele boiadas e tropas de muares, então
adquiridas em Curitiba. Era comum também o trânsito de cavalos, produto que, em
vista de sua raridade, era extremamente valorizado nos territórios auríferos.
Mas as principais estrelas desse comércio que começava a se estruturar eram os
muares, criados extensivamente nas regiões dos atuais Uruguai e Argentina, de
onde eram exportados para o Peru. Eram produtos especialmente valorizados, pois
mais afeitos ao transporte de cargas do que os cavalos.
65. O chamado
Caminho do Viamão53 (Figura 8) ligava o Rio Grande a São Paulo,
passando por Sorocaba, último ponto de invernada antes da penetração em mata
profunda. A intensificação do trânsito condicionou o calçamento de parte do
trajeto e o estabelecimento de registros, onde arrematadores cobravam impostos
tanto sobre animais como sobre indivíduos. A descoberta das minas de ouro do
Paranapanema e de Apiaí gerou a intensificação do fluxo no trajeto.
66. Ao longo do
caminho do Paranapanema até Curitiba, foram distribuídas várias sesmarias e
estabelecidos arraiais que logo se converteram em freguesias (Apiaí e
Paranapanema, em função das minas; Itapetininga, em local despovoado, para
estabelecimento de registro, então construído junto do rio de mesmo nome).
67. A cartografia do
período também demonstra a ampliação da rede em direção a Mato Grosso e Goiás.
O trajeto para as minas do Mato Grosso era feito pelos rios Tietê e Paraná, ao
passo que, para Goiás, era basicamente por terra.
68. A rota para
Cuiabá envolvia trecho de três dias por terra, margeando o rio Tietê, de São
Paulo até a freguesia de Araritaguaba (atual Porto Feliz), passando pelas
freguesias de São Roque e Araçariguama, e por Itu. Do porto de Araritaguaba, às
margens do rio Tietê, próximo a Sorocaba e Itu, partiam as principais provisões
dirigidas ao centro-oeste.
69. Desde o século
XVII, tal paragem já era utilizada como porto, sobretudo para as rotas do
Paraguai. Mas foram as "monções" - expedições por via fluvial para
abastecimento das minas de ouro - que intensificaram e dinamizaram o antigo
ponto de partida. Ideal na monção de outono-inverno, correspondente ao período
de seca (abril-maio - junho-agosto), percorria-se o Tietê em canoas, até o
Paraná, de onde se partia em direção ao rio Pardo, e, deste, aos rios Coxim,
Taquari, Paraguai, Porrudos e Cuiabá.
70. Com trechos de
varação54 -
em que as canoas eram carregadas pelos indígenas -, o trajeto era sofrido. Um
total de 531 léguas, ou 3.504 quilômetros, de Porto Feliz a Cuiabá, tornavam o
percurso uma façanha, como podemos constatar no relato de Caetano dos Santos
sobre a viagem do governador Rodrigo Cezar de Menezes, em 1728, dois anos após
a elevação do Arraial do Senhor Bom Jesus do Cuiabá à condição de vila:
71. Chegou a estas
Minas com viagem de quatro meses, desfigurado, com perdas consideráveis ainda
de sua perciza matalotagem, por ser o sertão longevo, áspero, dezabudo, e quasi
intrasavel (sic), experimentando os contratempos delle, expondo-se aos
contínuos riscos de vida, assim por rezão das feras, e gentios como dos rios, e
muitas cachoeiras, e passou as carestias da terra, comprando tudo pêlos preços
comuns, a q. voluntário lho queria vender55.
72. O comércio
interregional era intenso e encabeçado, sobretudo, por sorocabanos e ituanos,
que assim detinham os maiores lucros pelo abastecimento das longínquas minas de
Cuiabá e Goiás. Dadas as dificuldades da rota das monções e o tempo longo da
viagem, preferia-se o caminho por terra de São Paulo a Vila Boa e, dali, a
Cuiabá, passando pelo triângulo mineiro, antiga comarca de Paracatu (Figura 9)
73. O caminho de São
Paulo a Goiás56 era
todo por terra, passando por Jundiaí, por Mogi do Campo, pelas aldeias do rio
das Pedras, de Pissarão, do rio das Velhas e do Lanhozo, por Santa Cruz e Meia
Ponte (atual Pirenópolis), até chegar em Vila Boa (atual Goiás Velho)57. De pousos de sertanistas
derivaram importantes núcleos, como Mogi Mirim, Mogi Guaçu, Campinas, Franca e
Casa Branca (Figura 10). O caminho velho passava pela
região do Triângulo Mineiro, antiga Farinha Podre (atual Uberlândia), com todos
os pousos e passagens minuciosamente delineados no mapa de Francisco Tosi
Colombina (Figuras 11 e 12). É imprescindível lembrar que as rotas
terrestres eram percorridas em redes ou em mulas, por caminhos não calçados,
debaixo de sol e chuva. Boa parte da interiorização se fez com tais meios de
transporte ou simples pés descalços.
Figura 11
|
74. Podemos dizer,
portanto, que na primeira metade do século XVIII, os paulistas contribuíram
muito para a estruturação e viabilização dos intentos da Coroa, que
continuamente os estimulou a descobrir as famosas minas e a interiorizar-se.
Mas, estando tão longe, a Coroa não podia continuar controlando o que tanto a
interessava. Em 1748, decidiu pela criação da capitania de Mato Grosso58, última a ser desmembrada da
Capitania de São Paulo, condicionando sua concomitante extinção. A partir de
então, esta última deixou de ter governo autônomo, ficando como simples
comarca, subordinada à Capitania do Rio de Janeiro. Escapando aos olhos fixos
de Portugal, desenvolveu-se ao sabor das circunstâncias59 (Figuras 13 e 14).
[4]
Da restauração da Capitania de São Paulo à Independência do Brasil (1765-1822)
75. As grandes desculpas para a restauração da Capitania de São Paulo, em 1765, dezessete anos após a sua extinção (1748), foram razões ligadas ao fisco bem como à solução de questões geopolíticas. As condições de São Paulo e do Brasil na segunda metade do século XVIII inviabilizavam uma administração à distância e alienada de suas necessidades.
75. As grandes desculpas para a restauração da Capitania de São Paulo, em 1765, dezessete anos após a sua extinção (1748), foram razões ligadas ao fisco bem como à solução de questões geopolíticas. As condições de São Paulo e do Brasil na segunda metade do século XVIII inviabilizavam uma administração à distância e alienada de suas necessidades.
76. No sul, as
hostilidades espanholas condicionaram a concentração das atenções de Lisboa
nessa região. Aos olhos da Metrópole, em meados do século XVIII, as capitanias
centrais e sulinas representavam grandes desafios. Entre eles, destacava-se a
necessidade de organizar uma ação bélica no rio da Prata, contra as ofensivas
espanholas. Os pontos nevrálgicos eram a Colônia do Sacramento e as
proximidades da lagoa dos Patos. Era necessário manter soberania e controle
sobre a vasta extensão de terras que os sertanistas paulistas haviam dilatado
além Linha de Tordesilhas. A questão dos limites manteve-se em pauta desde o
início do século XVIII60.
77. As autoridades
hispano-americanas vinham procurando impedir essa irradiação luso-brasileira
que fora se processando ao longo dos últimos dois séculos. O esforço maior
concentrou-se nas mãos dos jesuítas a seu serviço. Esses, ao estabelecer
reduções, foram paulatinamente criando uma linha de fronteira perfeitamente
organizada, inclusive militarizada. Os jesuítas utilizavam-se de contingentes
indígenas preparados nas missões. Em contrapartida, o esforço ou a intenção
portuguesa visava à manutenção de toda a área geograficamente acrescentada.
78. A expansão não
podia ser sacrificada com algum recuo que importasse em perdas substanciais de
territórios descobertos - que, agora, constituíam um campo de exploração
econômica definida e necessária aos mercados coloniais e metropolitanos
portugueses. Nesse particular, desde o reinado de D. Pedro II, houve um
propósito oficial português ao se negociar o ajuste entre Portugal e Espanha no
controle do Prata, reconhecendo a Espanha, momentaneamente, o direito português
de ali manter posição.
79. A colonização
dos territórios sulinos impediu o avanço espanhol e deu cobertura à
interiorização dos sertanistas. Os portugueses, paulatinamente, ocuparam a
região do Rio Grande de São Pedro, onde já se fazia, desde a primeira metade do
século XVIII, um intenso comércio de gado bovino, equino e muar; e onde
paulistas realizavam contínuas incursões.
80. No entanto, em
1735, partindo de Buenos Aires contra a Colônia de Sacramento, um ataque
espanhol fez renascer o conflito. Somente as negociações e o estabelecimento do
Tratado de Madri, em 1750, puseram momentaneamente fim ao novo período de crise
de limites. Baseado no principio do uti
possidetis, solucionou-se parcialmente o litígio. O Brasil realizado
geograficamente pelos sertanistas paulistas, pelos sertanistas do norte e pelos
religiosos a serviço do Estado era, agora, legitimamente reconhecido pela
Espanha.
81. Assim, foi
acordado que os luso-brasileiros permaneceriam nos trechos do território onde
já haviam se estabelecido, valendo o mesmo para os hispano-americanos. No
início do governo de D. José I e do futuro marquês do Pombal, seu primeiro
ministro, iniciaram-se os trabalhos de demarcação. Os jesuítas do sul colocaram
obstáculos para a trégua, o que levou, em 1761, à anulação do Tratado (Tratado
de El Pardo).
82. Em consequência
disso, Pombal decidiu promover um povoamento mais intensivo em certos trechos
da fronteira. Foi elaborada assim toda uma política de urbanização, com
características específicas em cada região do território brasileiro. No que
tange à Capitania de São Paulo, então programaticamente restaurada, coube a D.
Luís Antonio Botelho Mourão, Morgado de Mateus, governá-la (1765-1775)61.
83. Em 1763, a sede
do Governo Geral foi transferida para a Cidade de São Sebastião do Rio de
Janeiro, tendo, em seguida, ocorrido a restauração da Capitania de São Paulo
(1765). A região sul da colônia tornara-se importante centro econômico e
estratégico-militar. A restituição da autonomia a São Paulo não obedeceu apenas
a uma necessidade geral, geopolítica e administrativa (a defesa do sul e do
oeste, dada a impossibilidade do Rio de Janeiro de responder por tudo), mas
também atendia a uma necessidade local e econômica. Além de pôr fim aos atritos
sulinos, a metrópole, mais uma vez, buscava novas fontes econômicas, em vista
do escasseamento da produção aurífera a partir de meados do século XVIII.
Passava-se à revalorização das áreas com potencial agrícola, independentemente
do ouro.
84. São Paulo, a não
ser nas pequenas manchas da lavoura de subsistência, era campo virgem e aberto
a um possível renascimento da agricultura. Na segunda metade do século XVIII, a
economia portuguesa apresentava um quadro bastante difícil. A sua feição, na
primeira metade da centúria, era de estabilidade, mas a situação agravou-se,
principalmente a partir de 1772, com a crise do ouro brasileiro. Segundo
Heloísa Belotto62, à frente de um império grande
demais para sustentar-se, com o território metropolitano culturalmente viciado
pelo jesuitismo, carente demográfica e economicamente, Pombal tentou resolver a
crise com um reforço do fisco, com reformas de toda a ordem e com o aumento do
poder central.
85. A luta, em
Portugal, seria pela indústria, contra a mentalidade impregnada do jesuitismo,
contra o domínio inglês no comércio externo, contra o abandono da terra; na
colônia, contra o desleixo no fisco, contra o contrabando e pelo incentivo à
agricultura. Os elementos fundamentais do projeto pombalino63 concentraram-se
no fortalecimento do poder central. Uma dos meios para alcançá-lo foi o
afastamento dos nobres que ocupavam posições destacadas, aliando-se à burguesia
mercantil favorecida pelos monopólios e pelas Companhias de Comércio.
86. Outra medida
tomada foi a expulsão dos jesuítas (1759) e a consequente secularização das
missões. Para recuperação econômica do Estado, Pombal decidiu pela
revitalização da agricultura, criação de companhias de comércio e estímulo à
indústria. No Brasil, as medidas centralizadoras concretizaram-se na extinção
das capitanias donatárias, no reforço das fronteiras e na mudança da capital
para o Rio de Janeiro64, e pelo estímulo à agricultura -
política empreendida por governadores ilustrados, enviados estrategicamente
para cada uma das capitanias.
87. Um corpo
fundamental de instruções de Pombal, constituído por duas Cartas Instrutivas,
ambas datadas de 26 de janeiro de 1765 e dirigidas respectivamente ao Morgado
de Mateus e ao Vice-Rei conde da Cunha65, nortearam os rumos da então
restaurada Capitania de São Paulo. A meta do novo governador da capitania, o
Morgado de Mateus, concentrava-se na defesa do território, no combate aos
espanhóis, no preparo militar necessário para tanto e na expulsão dos jesuítas
(efetuada em 1759) - que, no entender da Coroa e de Pombal, estavam implicados
nas usurpações territoriais e na manipulação dos índios. Quanto à preparação
bélica, chamava novamente à luta o brio dos habitantes de São Paulo. Criou-se
assim ambiente propício para a arregimentação de tropas de milícias ou tropas
de ordenanças, que os graduasse nos vários postos, de modo que estes "se fação apiticiveis a
vaidade dos moradores principaes daquella Capitania"66.
88. Além dos
paulistas, o governo central pensava no aproveitamento dos índios, eles
"devião constituir a principal força e a principal riqueza para nos
defendermos nas mesmas Fronteiras"67.
89. Quando extinta,
a Capitania de São Paulo sobrevivera68 graças
a seu inter-relacionamento com as regiões vizinhas, assegurado pelas
"monções" e pelo tropeirismo, nas respectivas rotas do Cuiabá e do
Viamão. No que tange à agricultura, embora restrita e acanhada, ela ocupava
metade da população, dedicada sobretudo à lavoura de subsistência. A
agricultura era realizada à maneira indígena, no sistema de sítios volantes, e
visava, quando não à própria subsistência, ao abastecimento dos núcleos urbanos
e dos tropeiros.
90. Embora
incipientes, essas várias formas de comércio tinham propiciado a infraestrutura
econômica que possibilitou a obra do Morgado de Mateus. A política do
governador visava justamente a dinamizar essa infraestrutura. No planalto e no
litoral, foi estimulado o plantio da cana-de-acúcar, que prosperou na região de
Itu, Campinas e Piracicaba e no litoral norte, especialmente em Ilha Bela.
91. Na base da
política de urbanização empreendida pelo Morgado de Mateus, estiveram a
necessidade de criar tropas de milícias, associada à de dinamizar toda uma
engrenagem que se estabelecera espontaneamente. Era preciso dinamizar o mercado
interno, que esboçava um enorme potencial. Era preciso agrupar a população
dispersa. A política de Pombal enquadrava a capitania na engrenagem do todo,
mas, pela primeira vez, esboçava uma preocupação com o desenvolvimento do seu
próprio território.
92. Os governadores
anteriores à extinção da capitania pouco permaneciam em território paulista e,
mesmo estando aí, tinham os olhos voltados para as regiões do ouro. A Capitania
era agora, pela primeira vez, objeto de um programa que a beneficiava. Nesse
sentido, estes dez anos foram importantíssimos para a história de São Paulo,
convertendo-se em ponto fundamental de manutenção de uma parte essencial do
território brasileiro - o sul e o oeste.
93. Como vimos,
entre 1705 e 1767, nenhuma vila foi fundada em território paulista. Em seus
primeiros tempos, os reinados de D. João V e o de D. José I estiveram voltados
exclusivamente para as zonas de mineração. Não houve necessidade de expandir a
rede urbana do século XVII; ou sequer interesse nisso. Sem dúvida, tal aspecto
é o que chamamos de prova concreta do descaso da política metropolitana em
relação à Capitania. O próprio Morgado de Mateus o constataria. Ao enviar a
descrição do Estado Político da
Capitania, após um ano e meio de governo, assim comentou a respeito das antigas
vilas:
94. As Vilas e
Povoações Civis que tem esta Capitania quaze todas as fundarão os primeiros
povoadores; aquellas de que pude alcançar a sua fundação quaze todas forão
feitas no tempo dos donatários, e antes do descobrimento das Minas; a última
que se fundou foi Pindamonhangaba, a qual foi feita Villa por ordem de Sua
Magestade de dez de julho de mil setecentos e cinco; tudo consta dos papéis
antigos do Archivo desta Camara; desde esse tempo para cá não houve mais
fundação alguma; porém algumas Villas são Povoações muito pequenas; os mesmos
moradores que nellas se conservão são os que tem citio mais perto, porque os
que tem longe só acodem à Villa pelas festas do anno, ou em solenidades
mayores, fora destes cazos vão seguindo o mato virgem69.
95.
Dentro dos propósitos a que viera, o Morgado de
Mateus compreendia que uma urbanização mais densa facilitaria os planos
propostos para a restauração, seja do ponto de vista militar, econômico,
político ou social. Foram constantes as determinações régias contra a dispersão
e vinham, sobretudo, ao encontro das finalidades de recrutamento e urbanização.
Desde os primórdios da descoberta do ouro, a perseguição aos vadios tornou-se
uma constante. Era necessário um maior controle da população e de suas
atividades, mas, agora, os interesses vinculavam-se às necessidades de
recrutamento em face de um eventual conflito com os espanhóis no sul:
96.
Aos vadios e facinorozos que vivem como feras,
separados da sociedade civil e do comercio Humano, era ordenado que
abandonassem os 'sítios volantes' e escolhessem lugares accomodados para
viverem juntos em Povoações Civis que pelo menos tenhão cincoenta fogos para
cima70.
97.
Não poderiam desenvolver-se os interesses de Sua
Magestade sem se multiplicarem os Colonos, de que há falta grande, e para que
os poucos que há possa fazer bom uzo e melhor utilidade, hé precizo congregalos
o mais que se puder, em Povoações Civis, fundando-se de novo, e acrescentando
aquela que já temos, porque sem isso nem pode haver commercio nem riqueza
permanente71.
98.
Para evitar a dispersão, que em muito prejudicava
o recrutamento, ordenou-se que ninguém deixasse o local de moradia, sem licença
superior72.
99.
Os índios também foram alvos dessa política.
Deviam ser congregados em aldeias, fossem elas do Padroado Real (Pinheiros,
Barueri, São Miguel, Nossa Senhora da Escada, São João dos Guarulhos) ou
antigos núcleos jesuítas (São José, Nossa Senhora da Ajuda, Mboy, Carapicuíba e
Itapecerica).
100.
As primeiras providências foram tomadas em 1766:
101.
Desejando dar providencia sobre a falta que ha de
Povoações civis nesta Capitania, tenho disposto mandar formar seis em
diferentes partes que me pareceram as mais próprias, e as mais úteis pela sua
cituação, comodidade, e fertilidade do Paiz, e são as seguintes: Huma na Barra
que faz o Rio Pirassicaba entrando no Tietê, dez legoas mais adiante de
Araytaguaba, última povoação em que se embarca para Cuiabá, para que os que
fazem esta viagem tinhão escalla mais abayxo em que possão refazer-se [...]
Outra no Wotucatu, sobre o Rio Paranapanema para tentar-se poder restaurar as
muitas fazendas que se despovoarão naquelle Rio depois que abandonamos a
navegacão delle para Cuiabá, pertendo [sic] juntamente as vargens da Vaccaria
de Guaycuru de que hoje se querem fazer senhores os castelhanos [...]; Outra na
paragem chamada a Faxina sobre o caminho que vay de São Paulo para Curitiba
adiante de Sorocaba que hé a ultima villa, quarenta legoas para ver se
acrescentão para aquella parte mais as povoações por não haver em toda a
distancia daquella Villa até Curitiba [...]em que só tinha alguns moradores
[...] Outra nos Campos de Lagens/em legoas depois de Curitiba no caminho que
vay para Viamão, para ver se juntão os muitos moradores dispersos que ha de
parte de cima da serra da Costa do Mar, fazendo-se fortes sobre as margens do
Rio Pelotas para fortificar aquella paragem contra invazões que ahy podem fazer
os Índios das missões castelhanas, cortando-nos com muita facilidade o passo e
comunicação que possamos ter por terra com os habitantes de Viamão [...] Outra
na costa do mar na enseada de Guaratuba abayxo de Paranaguá para o Sul dés
legoas por ser bom Porto de mar muito farto de peixe, e excelentes terras [...]
Outra no Rio Sabaúna entre Iguape e Cananeia por ser bom porto do mar, muito
farto de peixe, e boas terras, e desejar que todos os Portos desta Costa se
povoem [...] De todos estes lugares mandarei a V. Exª. a carta chorografica
logo que a puder concluir e ajustar para ir com a exactidão, a qual eu mesmo ey
de fazer, e pintar por não ter quem saiba73.
102.
Em 1767, a aldeia de São José do Paraíba (atual
São José dos Campos) foi elevada à categoria de vila: "Portanto Sua Mage foi servido ordenarme nas Instruções
[...] e em outras ordens que fui recebendo, que era muito conveniente ao seu
Real serviço que nesta Capitania se erigissem Villas nas Aldeias dos índios, e
que todos os vadios e dispersos, ou que vivem em citios volantes se
congregassem em Povoações Civis"74.
103.
Em 1769, foi a vez de São João de Atibaya75 e
Mogimirim:
104.
Foi servido ordenarme [...] que nesta Capitania
se erigissem Villas aquellas povoações que fossem mais próprias para o ditto
efeito, e porque huma das mais que se distinguem em os requizitos necessários
para receberem a honra do nome de Villa hé a Povoação de São João de Atibaya
[...] Por ter capacidade e suficiência para se augmentar em mayor povoação pelo
tempo adiante do que a Freguesia de Mogi-guaçu, cuja situação era muito húmida
e com pouco extracção para se povoar, sendo esta de Mogimirim hum plano seco em
se podião estabelecer cazas e terem mayor duração [...] Por ficar este lugar de
Mogimirim quatro dias de jornada de caminho rigorozo, de passagens de rio
distante daquella Villa de Jundiahy76.
105.
Segundo Heloísa Belotto, nos primeiros anos de
governo do Morgado de Mateus, nas tentativas de estabelecer povoações, o
objetivo era preponderantemente estratégico. Lages, Faxina e Itapetininga
estavam dentro da meta de colonização do roteiro do sul, visando a preservar e
a dinamizar uma das mais importantes rotas do século XVIII, assegurando a área
de domínio daquelas paragens. Era preciso fixar o povoamento ao longo do
Caminho do Viamão e controlar o poder dos mandatários locais. Nesse mesmo
objetivo se enquadravam Sabaúna e Guaratuba, visando a garantir a defesa do litoral
sul, zona vulnerável às aproximações espanholas. Serra acima, Piracicaba77 foi
destinada a beneficiar o comércio com os monçoeiros que se dirigiam ao Mato
Grosso; mas, além disso, associava-se ao empreendimento que o Morgado
desenvolvia na região do rio Iguatemi - ponto estratégico da defesa contra os
espanhóis no território hoje conhecido como Mato Grosso do Sul. D. Luís Antonio
visava a estabelecer "uma boa povoação e conseguir a abertura do caminho
para o Ivaí"78. Tratava-se de um projeto absurdo,
do qual, aliás, desistiria pouco depois.
106.
Muitas das localidades prosperaram, chegando a
ser elevadas à categoria de vila. Muitas permaneceram como capelas ou simples
freguesias, tendo sua situação sido definida em época posterior ao governo do
Morgado de Mateus.
107.
Embora pareça fácil, inúmeras correspondências
oficiais do Morgado de Mateus expressam queixas relativas à dificuldade de se
fundar povoações na Capitania de São Paulo:
108.
Não há couza tão útil, e necessária, como
Povoações, principalmente nesta Capitania que hé muita falta. Não ha couza ao
mesmo tempo tão difficil. Não fallo nas difficuldade de mover os novos
habitadores, que huns não querem, outros pedem o que não ha, outros chorão,
outros se escondem, que tudo isso vence, falIo nas muitas vontades que é
precizo conciliar para uma couza tão justa, e necessária, e com as quaes não
podem as minhas forças, nem me hé possível obriga-las79.
109.
É possível estabelecer, grosso modo, os seguintes
rumos de expansão da rede urbana paulista no último quartel do século XVIII.
Segundo Belotto80, na direção sul (correspondendo à
defesa e colonização do Caminho de Viamão e do litoral), ainda que em sua forma
incipiente, o Morgado de Mateus promoveu a integração territorial, procurando
unir os Campos de Vacaria ao eixo Rio-São Paulo-Minas. Era também essa a rota
terrestre para as expedições militares que iam combater os espanhóis no Rio
Grande. Também nesse mesmo rumo estava o interesse ligado aos sertões do Tibagi
e aos Campos de Guarapuava. Se Curitiba era o centro de arregimentação de gente
e irradiação das expedições para aquela região, Santa Ana de Iapó (vila de
Castro), por exemplo, localizava-se entre aquele centro e a região do Tibagi.
110.
Na direção sul, constam os seguintes núcleos
urbanos elevados à condição de vila: Faxina; Itapetininga; Santo António das
Minas do Piai (Apiaí); Santo António da Lapa do Registro de Curitiba (atual
Lapa); Nossa Senhora dos Prazeres de Lages; Santa Ana do lapó (atual Castro); e
São Roque. No litoral: freguesia de São José da Marinha de Ararapira; Vila Nova
de São Luís de Guaratuba; e N. S. da Conceição da Lage (Sabaúna), defronte da
barra do rio Sabaúna, entre as vilas de Iguape e Cananéia. Na direção norte, a
sucessão dos aglomerados urbanos obedeceu uma política de assegurar as
fronteiras com as Minas Gerais, região sempre turbulenta e em litígio. Também
garantiu as imediações da rota para Goiás. As novas vilas foram: São João
Batista de Atibaia; São José de Mogimirim; e freguesia de N. S. da Conceição
das Campinas do Mato Grosso de Jundiaí (depois vila de São Carlos, atual
Campinas)81.
111.
Na direção do Rio de Janeiro, aparecem quatro
centros urbanos em pleno vale do Paraíba, na região montanhosa que levava ao
litoral, junto do porto de São Sebastião: São José do Paraíba (atual São José
dos Campos); Nossa Senhora da Escada (atual Guararema); São Luís e Santo
Antonio do Paraitinga82 (região
por onde se burlava a proibição de transitar ao longo da estrada Cunha-Parati,
na época do Caminho Novo); Caraguatatuba; Santo Antonio de Paraibuna (outro
ponto de acesso ao litoral que merecia controle). Junto a Araritaguaba (atual
Porto Feliz), cuja principal finalidade, seria o abastecimento das expedições
para o Iguatemi: Piracicaba. Num ponto mais longínquo da direção Tietê-Paraná,
estava a povoação de Iguatemi, anexa à fortaleza de mesmo nome, hoje município
vizinho à Amambaí (Mato Grosso do Sul).
112.
Os documentos referentes ao período evidenciam
ainda uma enorme preocupação em relação ao traçado urbano, o que só vem a
reforçar, em nível mais específico, a centralização e o controle que, no
momento, efetuava-se em todos os sentidos. Aparecem evidentes preocupações
quanto às normas de traçado ortogonal das novas vilas fundadas, bem como quanto
à própria disposição dos edifícios:
113.
Porquanto tenho encarregado a Francisco Barreto
Leme formar uma povoação na paragem chamada Campinas do Mato Grosso, distrito
de Jundiaí, em sítio onde se achar melhor comodidade e é preciso dar norma para
a formatura da referida povoação. Ordeno que esta seja em quadras de 60 ou 80
varas cada uma, e daí para cima e que as ruas sejam de 60 palmos de largura,
mandando formar as primeiras cazas nos angulos das quadras, de modo que fiquem
os quintaes para dentro a entestar uns com os outros83.
114.
E porque huma das couzas que as Naçoens mais
cultas costomão ter grande cuidado no tempo prezente hé a semetria, e armonia
dos edifícios que de novo se levantão nas Povoações das Cidades, e Villas para
que da sua disposição não resulte a commodidade publica mas também o agrado com
que se fazem mais appeteciveis, e habeis as povoações, conhecendo-se da sua boa
ordem com q'estão dispostas a policia, e a cultura dos seus habitadores84.
115.
O
relatório apresentado pelo engenheiro
José Custódio de Sá e Faria por ocasião da sua viagem ao sul da Capitania
de São Paulo (1774)85, hoje guardado no Rio de Janeiro,
na Mapoteca do Itamaraty, revela o descompasso entre a teoria e a prática.
Muitas foram as dificuldades do Morgado de implantar os núcleos nas condições
desejadas. A correspondência oficial entre o governador e o Conselho
Ultramarino (Lisboa, Arquivo Histórico Ultramarino), o governador e o vice-rei
(São Paulo, Arquivo do Estado), e o governador e os capitães-mores das vilas
(Rio de Janeiro, Seção de Manuscritos da Biblioteca Nacional) revela as tensões
e conflitos existentes. Serializada e cotejada, essa documentação permite
verificar as dificuldades de viabilizar-se um projeto de tal envergadura numa
Capitania que, historicamente, devido à sua condição economicamente periférica,
gozara de certa autonomia. Enormes foram as tensões entre os planos de Pombal,
os do governador e os interesses da população local.
116.
Passados
dez anos, temos, em 1775, o fim da gestão do Morgado de Mateus. Taunay assim
resume os seus sucessores:
117.
Ao
Morgado de Mateus sucede [...] o perverso e desiquilibrado tiranete Martin
Lopes Saldanha que durante 8 anos, até 1783, flagelaria os governadores com
seus desatinos e arbitrariedades. Felizmente sucedeu-lhe o bom Francisco da
Cunha Menezes em, aliás, curto prazo ao qual os paulistas nos atribuíram o
honroso epíteto de idade de ouro. A Menezes ao cabo de quatro anos substitui o
bom marechal Frei José Raimundo Chichorro da Gama Lobo, Cavaleiro de Malta, que
como Menezes, deixaria aqueles que regia a mais bela reputação a quem a cidade,
assim como ao antecessor, deveu algumas iniciativas ao progresso e civilização
[...]. No governo de Bernardo de Lorena, verificou-se notável surto de
progresso [...] a mais notável obra [...] viria a ser o empedramento da
detestável vereda frequentemente intransitável, graças a qual, pelo Caminho do
Mar, São Paulo e o Planalto podiam comunicar-se com o litoral e Santos86. Tal obra devida a João da Costa
Ferreira, Coronel do Real Corpo de Engenheiros e seus valorosos auxiliares
trouxe imensas vantagens ao progresso paulistano87.
118.
Chegamos
ao fim de uma jornada de três séculos, com a Capitania de São Paulo
apresentando contornos muito distintos, tanto dos originais como dos atuais. A
reconstituição, baseada em mapa por satélite, mostra a dilatação, entre 1765 e
1822, dos limites e da rede viária e urbana em todas as direções. (Figura 15)
119.
Se
analisarmos os dados que a cartografia põe em evidência, podemos dizer, em termos
de história da urbanização, que uma rede ínfima de vilas articulava um vasto
território, amparada por densa rede eclesiática de capelas e freguesias, pousos
e registros.
120.
A
cartografia aqui exposta documenta cada passo de um longo processo de conhecimento,
dilatação, apropriação e definição do território centro-sul da América
portuguesa, graças ao auxílio dos paulistas que, sempre que houve interesse,
tiveram a Coroa portuguesa no seu encalço.
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Artigo apresentado em 8/2008.
Aprovado em 3/2009.
[NOTAS]
1. Sobre o conceito de território,
consultar Beatriz P. S. Bueno (2003, p. 482-487).
2. Cf. R. Bluteau ( v. 4, 1712, p. 219).
3. "Conquistas - as terras, Províncias, Reynos conquistados." Cf. Idem (v. 2, 1712, p. 471).
4. "Domínios - bens que se possuem & de que se pode usar, & dispor como proprios; possessiones parte de um Imperio". "Império - região muyto ampla, dominada de hum Principe..." Cf. Idem (v. 4, 1712)
5. "'Territoire: rare jusqu'au XVIIe s.; répandu au XVIIIe s.', dit le Littré [...] Le mot est donc d'invention récente, si l'on veut bien prendre l'échelle du temps historique. Pourtant les juristes ont fait du territoire une catégorie quasi universelle: le territoire, lit-on encore aujourd'hui dans bien des manuels de droit consituionnel, est un élément constitutif de l'Etat. Le territoire est ainsi devenu l'expression juridique d'une donnée faussement naturelle. Les juristes ont réussi a confondre territoire et espace, et a naturaliser par ce procédé l'Etat bourgeois. Pourtant, le territoire n'a rien de spontané. Si on se penche sur sa découverte par l 'Etat absolutiste et sur sa production para l'administration d'alors, on doit bien considérer son caractère relatif et contingent. Le territoire n'est pas cette donnée à peu près indiscutable parce que géographique que la doctrine juridique a installée à la base de son analyse de l 'Etat. Il est un des premiers appareils d'Etat que l'administration a su engendrer et reproduire, avant que la Révolution bourgeoise n'en tire le maximum de profit. L'analyse présentée ici n'est rien d'autre qu'une découverte des modes de production de ce territoire faussement innocent; l'histoire d'une invention que nous avons fini par prendre pour notre environnement naturel et spontané". Cf. P. Alliès (1980).
6. Cf. R. Bluteau (v. 8, 1712, p. 128).
7. Idem, v. 2, p. 125.
8. M. Marx, 1991, p. 17-30.
9. Idem, p. 18-19.
10. Território municipal.
11. Cf. M. Marx (1991, p. 52).
12. Ver J. M. Monteiro (1994); M. C. Scatamacchia (1990; 2005); M. C. Scatamacchia e D. P. Uchôa (1993); R. Gianessella (2008).
13. Nessa nova linha de investigação, encontramos apenas a dissertação de mestrado de R. Gianessella (2008).
14. Segundo o Mapa Corographico da Capitania de São Paulo, datado de 1791, do engenheiro militar Antônio Rodrigues Montezinhos, os limites da Capitania de São Paulo eram: com Minas Gerais, a serra da Mantiqueira e o rio Sapucaí; com Goiás, o rio Grande, o rio Pardo e o rio Claro; com o Rio Grande de São Pedro, o rio Pelotas e o rio Uruguai; com Mato Grosso, o rio Paraná; com o mar, a oriente, a Capitania do Rio de Janeiro (na parte setentrional) e a Capitania de Santa Catarina (na meridional).
15. Cf. M. A de Casal (1976, p. 97).
16. Ver A. de Azevedo (1956); e N. G. Reis Filho (2001, p. 85-88).
17. Às vilas soma-se um conjunto expressivo de capelas e freguesias, entre as quais, no século XVIII, despontam São Luis e Santo Antonio de Paraitinga (1773), Piracicaba, Wotucatu, São José da Marinha de Ararapira, N. S. da Conceição da Lage (entre Iguape e Cananéia) e Santo Antonio da Lapa do Registro de Curitiba (Lapa-PR).
18. Consultar: MUNICÍPIOS e distritos do estado de São Paulo (1995); QUADRO do desmembramento territorial-administrativo dos municípios paulistas (1995).
19. Ver pranchas anexas ao Quadro do desmembramento territorial-administrativo dos municípios paulistas (1995).
20. Ver A. de Azevedo (1956 p. 11).
21. A vila de São Vicente, como de hábito ora em diante, foi fundada em sítio abundante de víveres, fértil e estratégico - boca de sertão por meio de peabirus -, já previamente ocupado por portugueses (degredados, náufragos, desertores ou aventureiros), espanhóis, índios aliados dos portugueses e mamelucos envolvidos no apresamento de indígenas. Ver: A. Zequini (2004, p. 36) e R. Gianessella (2008).
22. Ver N. G. Reis Filho (2001).
23. Idem, ibidem.
24. Cf. F. V. Luna e H. S. Klein (2005, p. 26).
25. Cf. N. G. Reis Filho (2004, p. 28): "a Vila de São Paulo com casario modesto, de taipa de mão ou pilão, térreo e coberto de palha, e população girando em torno de 2.000 pessoas na fase inicial".
26. Cf. F. Vidal Luna e H. S. Klein (2005, p. 31; 33). Entre as trilhas abertas na mata, destacam-se os peabirus, sistema de caminhos indígenas que interligava várias localidades da costa brasileira - como o porto dos Patos, Cananéia e São Vicente - ao atual Paraguai.
27. Cf. N. G. Reis Filho (2004, p. 31; 34).
28. Ver S. Sideri (1978); A. A. Bourdon (1973); A. F. Ferreira (1977); C. A. Hanson (1986); e J. B. de. Macedo (1982, p. 11-32).
29. Ver S. B. de Holanda (1994; 1966).
30. Ver S. Sideri (1978); A. A. Bourdon (1973); A. F. Ferreira (1977); C. A. Hanson (1986); e J. B. de. Macedo (1982, p. 11-32).
31. Sobre a mineração nas Capitanias de São Vicente e Santo Amaro nos séculos XVI e XVII, Nestor Goulart desenvolveu estudo recente, ainda inédito, que revela a exploração de ouro no morro do Jaraguá, nos arredores de São Paulo (Guarulhos, Suzano, Osasco, Itapecerica da Serra e Franco da Rocha), em Santana de Parnaíba, Araçariguama, no vale dos rios Sorocaba e Paranapanema, em Apiaí, no planalto curitibano, no vale do Ribeira e na baía de Paranaguá.
32. Cf. J. Monteiro (1994, p. 76-81).
33. Em relatório elaborado para o IPHAN (2008-2009), Nestor Goulart Reis Filho localizou as áreas de mineração paulistas, analisando a concomitante questão da escravização dos índígenas e demonstrando que o grosso sempre se destinou ao mercado local. Texto inédito, gentilmente cedido pelo autor.
34. Ver Revista do IHGSP (1915).
35. Ver F. M. Santos (1937).
36. Ver P. F. da S. Camargo (1971).
37. Ver A. de. Almeida (1969).
38. Ver M. Mazzuia (1976).
39. Ver S. Sideri (1978); A. A. Bourdon (1973); A. F. Ferreira (1977); C. A. Hanson (1986); e J. B. de. Macedo (1982, p. 11-32).
40. Idem, ibidem.
41. Ver G. Martins (1973).
42. Cf. F. Vidal Luna e H. S. Klein (2005, p. 25-53); e C. D. Fonseca (2003).
43. Ver G. Martins (1973).
44. Gêneros de primeira necessidade provinham do Vale do Paraíba; aguardente, escravos e artigos de luxo, do Rio de Janeiro, via Parati; gado bovino, da Bahia; gado bovino, equino e muar, do sul, via Sorocaba. Observa-se a formação de um intenso mercado interno de trocas intercapitanias na Colônia. Ver M. Zemella (1951); M. Ellis (1961); e F. Vidal Luna e H. S. Klein (2005, p. 25-53).
45. Ver P. T. de A. P. Leme (2004, p. 142).
46. O Caminho Novo, concluído em 1725, ligava o Rio de Janeiro direto com as Minas Gerais, envolvendo o seguinte percurso: Rio de Janeiro-Petrópolis-Itaipava-Secretário-Paraíba do Sul-Paraibuna-Simão Pereira-Matias Barbosa-Caetés-Juiz de Fora-Ewbank da Câmara-Santos Dumont-Antonio Carlos-Barbacena-Ressaquinha-Carandaí-Cristiano Otoni-Conselheiro Lafaiete-Ouro Branco-Mariana-Catas Altas-Santa Bárbara-Barão dos Cocais-Cocais-Bom Jesus do Amparo-Ipoema-Senhora do Carmo-Itambé do Mato Dentro-Morro do Pilar-Conceição do Mato Dentro-Itapanhoacanga-Serro Frio-São Gonçalo do Rio das Pedras-Diamantina. Cf. A. G. COSTA (2005).
O Caminho Velho, vigente desde 1702, seguia o seguinte percurso: São Paulo-Freguesia de Nossa Senhora da Penha-Mogi das Cruzes-Jacareí-Taubaté-Pindamonhangaba-Guaratinguetá-Freguesia de Piedade (Lorena) ou Cruzeiro-São Sebastião do Rio Verde-Baependi-Fazenda Traituba-Carrancas-Caquende-São João del Rey-Lagoa Dourada-São Brás do Suaçií-Engenheiro Corrêa-Ouro Preto-Mariana-Catas Altas-Bom Jesus do Amparo-Itambé do Mato Dentro-Morro do Pilar-Córregos-Serro Frio-São João dos Rios das Pedras-Diamantina. Cf. A. J. Antonil (1966).
O Caminho Velho ligava o Rio de Janeiro a Minas Gerais. Conectando-se em Lorena, seguia a seguinte rota: Rio de Janeiro-Parati-Serra da Bocaina-Cunha-Guaratinguetá-Lorena-Minas.
47. Ver I. Blaj (2000).
48. Em 1728, o governador da Capitania de São Paulo, Caldeira Pimentel, determinou ao militar Francisco de Souza Faria o estabelecimento de uma picada a partir do Viamão, subindo a Serra Geral e chegando aos campos da chamada Vacaria dos Pinhais. Dali, até Curitiba, incorporava-se ao trecho já existente de Curitiba a Sorocaba. Em 1732, esse caminho foi retificado, desviando-se um pouco mais para oeste, denominado de "Caminho do Sul", com quase 1.500 quilômetros. Cf. V. A. da Silva (2004, p. 84).
49. Cf. R. M. Delson (1997, p. 29).
50. Ver R. Delson (1987).
51. No local do antigo Arraial de Santana, fundado em 1726-1727.
52. Ver R. Delson (1987).
53. O Caminho do Viamão partia de Viamão, passando por Lages, Lapa, Castro, Itapeva, Itapetininga, Sorocaba, freguesia de São Roque e São Paulo.
54. O varadouro de Camapuã envolvia um percurso terrestre de 14 quilômetros. Cf. V. da Silva (2004, p. 80).
55. Cf. Documentos Interessantes (v. 20, 1896, p. 298).
56. Para a Vila Boa de Goiás, o caminho partia de São Paulo, contornando o Jaraguá, passando por Jundiaí, Campinas, Mogimrim, pelo pouso de Franca e pelos arraiais de Bonfim, Meia Ponte (atual Pirenópolis) e Córrego do Jaraguá.
57. Ver D. M. R. Boaventura (2007).
58. Ver R. M. de Araújo (2000).
59. Ver I. Blaj (2002); e J. M. Monteiro (1994).
60. Ver H. L. Belotto (2007).
61. Idem.
62. Idem.
63. Ver F. J. C. Falcon (1982).
64. Cf. N. G. dos Reis Filho (1995, p. 44-56).
65. Ver Oficio do Morgado de Mateus ao Conde de Oeiras. São Paulo, 23 de dezembro de 1766. In: Documentos interessantes (v. 23, p.4).
66. Idem, ibidem.
67. Idem, ibidem.
68. Ver I. Blaj (2002); J. M. Monteiro (1994).
69. Ver Avisos e Cartas Regias. Arquivo do Estado de São Paulo: lata 62, n. 420, Livro 169.
70. Idem, p. 145.
71. Ver Carta do Morgado de Mateus à Camara de Iguape. São Paulo, 12 de Janeiro de 1767. In: Documentos Interessantes (v. 67, p. 76).
72. Ver Bando para que nenhuma pessoa possa dezertar dos citios em que viverem. Santos, 25 de Fevereiro de 1766. In: Documentos Interessantes (v. 65, p. 48-49).
73. Ver Cartas ao Conde de Oeiras sobre povoações da Capitania. In: Documentos Interessantes (v. 23, p. 40).
74. Ver Documentos Interessantes (v. 23, p. 398; 418).
75. Ver W. F. da Silveira (1950).
76. Ver Documentos Interessantes (v. 34, p.150-202).
77. Ver M. Neme (1943).
78. Ver Documentos Interessantes (v. 4,, p. 104).
79. Ver Documentos Interessantes (v. 23, p. 415).
80. Ver H. L. Belotto (2007).
81. Ver A. da C. Santos (2002).
82. Ver L. Saia.
83. Celso Maria de Melo Pupo (1969, p. 45).
84. Cf. Documentos Interessantes (v. 65, p. 106).
85. Ver outro artigo da autora no presente dossiê, Do borrão às aguadas: os engenheiros militares e a representação da Capitania de São Paulo.
86. A célebre Calçada do Lorena, que, embora não carroçável, favoreceu, e muito, as trocas com o litoral, transportando, no lombo de mulas, sobretudo o açúcar do plantado.
87. Afonso de E. Taunay (1954).
2. Cf. R. Bluteau ( v. 4, 1712, p. 219).
3. "Conquistas - as terras, Províncias, Reynos conquistados." Cf. Idem (v. 2, 1712, p. 471).
4. "Domínios - bens que se possuem & de que se pode usar, & dispor como proprios; possessiones parte de um Imperio". "Império - região muyto ampla, dominada de hum Principe..." Cf. Idem (v. 4, 1712)
5. "'Territoire: rare jusqu'au XVIIe s.; répandu au XVIIIe s.', dit le Littré [...] Le mot est donc d'invention récente, si l'on veut bien prendre l'échelle du temps historique. Pourtant les juristes ont fait du territoire une catégorie quasi universelle: le territoire, lit-on encore aujourd'hui dans bien des manuels de droit consituionnel, est un élément constitutif de l'Etat. Le territoire est ainsi devenu l'expression juridique d'une donnée faussement naturelle. Les juristes ont réussi a confondre territoire et espace, et a naturaliser par ce procédé l'Etat bourgeois. Pourtant, le territoire n'a rien de spontané. Si on se penche sur sa découverte par l 'Etat absolutiste et sur sa production para l'administration d'alors, on doit bien considérer son caractère relatif et contingent. Le territoire n'est pas cette donnée à peu près indiscutable parce que géographique que la doctrine juridique a installée à la base de son analyse de l 'Etat. Il est un des premiers appareils d'Etat que l'administration a su engendrer et reproduire, avant que la Révolution bourgeoise n'en tire le maximum de profit. L'analyse présentée ici n'est rien d'autre qu'une découverte des modes de production de ce territoire faussement innocent; l'histoire d'une invention que nous avons fini par prendre pour notre environnement naturel et spontané". Cf. P. Alliès (1980).
6. Cf. R. Bluteau (v. 8, 1712, p. 128).
7. Idem, v. 2, p. 125.
8. M. Marx, 1991, p. 17-30.
9. Idem, p. 18-19.
10. Território municipal.
11. Cf. M. Marx (1991, p. 52).
12. Ver J. M. Monteiro (1994); M. C. Scatamacchia (1990; 2005); M. C. Scatamacchia e D. P. Uchôa (1993); R. Gianessella (2008).
13. Nessa nova linha de investigação, encontramos apenas a dissertação de mestrado de R. Gianessella (2008).
14. Segundo o Mapa Corographico da Capitania de São Paulo, datado de 1791, do engenheiro militar Antônio Rodrigues Montezinhos, os limites da Capitania de São Paulo eram: com Minas Gerais, a serra da Mantiqueira e o rio Sapucaí; com Goiás, o rio Grande, o rio Pardo e o rio Claro; com o Rio Grande de São Pedro, o rio Pelotas e o rio Uruguai; com Mato Grosso, o rio Paraná; com o mar, a oriente, a Capitania do Rio de Janeiro (na parte setentrional) e a Capitania de Santa Catarina (na meridional).
15. Cf. M. A de Casal (1976, p. 97).
16. Ver A. de Azevedo (1956); e N. G. Reis Filho (2001, p. 85-88).
17. Às vilas soma-se um conjunto expressivo de capelas e freguesias, entre as quais, no século XVIII, despontam São Luis e Santo Antonio de Paraitinga (1773), Piracicaba, Wotucatu, São José da Marinha de Ararapira, N. S. da Conceição da Lage (entre Iguape e Cananéia) e Santo Antonio da Lapa do Registro de Curitiba (Lapa-PR).
18. Consultar: MUNICÍPIOS e distritos do estado de São Paulo (1995); QUADRO do desmembramento territorial-administrativo dos municípios paulistas (1995).
19. Ver pranchas anexas ao Quadro do desmembramento territorial-administrativo dos municípios paulistas (1995).
20. Ver A. de Azevedo (1956 p. 11).
21. A vila de São Vicente, como de hábito ora em diante, foi fundada em sítio abundante de víveres, fértil e estratégico - boca de sertão por meio de peabirus -, já previamente ocupado por portugueses (degredados, náufragos, desertores ou aventureiros), espanhóis, índios aliados dos portugueses e mamelucos envolvidos no apresamento de indígenas. Ver: A. Zequini (2004, p. 36) e R. Gianessella (2008).
22. Ver N. G. Reis Filho (2001).
23. Idem, ibidem.
24. Cf. F. V. Luna e H. S. Klein (2005, p. 26).
25. Cf. N. G. Reis Filho (2004, p. 28): "a Vila de São Paulo com casario modesto, de taipa de mão ou pilão, térreo e coberto de palha, e população girando em torno de 2.000 pessoas na fase inicial".
26. Cf. F. Vidal Luna e H. S. Klein (2005, p. 31; 33). Entre as trilhas abertas na mata, destacam-se os peabirus, sistema de caminhos indígenas que interligava várias localidades da costa brasileira - como o porto dos Patos, Cananéia e São Vicente - ao atual Paraguai.
27. Cf. N. G. Reis Filho (2004, p. 31; 34).
28. Ver S. Sideri (1978); A. A. Bourdon (1973); A. F. Ferreira (1977); C. A. Hanson (1986); e J. B. de. Macedo (1982, p. 11-32).
29. Ver S. B. de Holanda (1994; 1966).
30. Ver S. Sideri (1978); A. A. Bourdon (1973); A. F. Ferreira (1977); C. A. Hanson (1986); e J. B. de. Macedo (1982, p. 11-32).
31. Sobre a mineração nas Capitanias de São Vicente e Santo Amaro nos séculos XVI e XVII, Nestor Goulart desenvolveu estudo recente, ainda inédito, que revela a exploração de ouro no morro do Jaraguá, nos arredores de São Paulo (Guarulhos, Suzano, Osasco, Itapecerica da Serra e Franco da Rocha), em Santana de Parnaíba, Araçariguama, no vale dos rios Sorocaba e Paranapanema, em Apiaí, no planalto curitibano, no vale do Ribeira e na baía de Paranaguá.
32. Cf. J. Monteiro (1994, p. 76-81).
33. Em relatório elaborado para o IPHAN (2008-2009), Nestor Goulart Reis Filho localizou as áreas de mineração paulistas, analisando a concomitante questão da escravização dos índígenas e demonstrando que o grosso sempre se destinou ao mercado local. Texto inédito, gentilmente cedido pelo autor.
34. Ver Revista do IHGSP (1915).
35. Ver F. M. Santos (1937).
36. Ver P. F. da S. Camargo (1971).
37. Ver A. de. Almeida (1969).
38. Ver M. Mazzuia (1976).
39. Ver S. Sideri (1978); A. A. Bourdon (1973); A. F. Ferreira (1977); C. A. Hanson (1986); e J. B. de. Macedo (1982, p. 11-32).
40. Idem, ibidem.
41. Ver G. Martins (1973).
42. Cf. F. Vidal Luna e H. S. Klein (2005, p. 25-53); e C. D. Fonseca (2003).
43. Ver G. Martins (1973).
44. Gêneros de primeira necessidade provinham do Vale do Paraíba; aguardente, escravos e artigos de luxo, do Rio de Janeiro, via Parati; gado bovino, da Bahia; gado bovino, equino e muar, do sul, via Sorocaba. Observa-se a formação de um intenso mercado interno de trocas intercapitanias na Colônia. Ver M. Zemella (1951); M. Ellis (1961); e F. Vidal Luna e H. S. Klein (2005, p. 25-53).
45. Ver P. T. de A. P. Leme (2004, p. 142).
46. O Caminho Novo, concluído em 1725, ligava o Rio de Janeiro direto com as Minas Gerais, envolvendo o seguinte percurso: Rio de Janeiro-Petrópolis-Itaipava-Secretário-Paraíba do Sul-Paraibuna-Simão Pereira-Matias Barbosa-Caetés-Juiz de Fora-Ewbank da Câmara-Santos Dumont-Antonio Carlos-Barbacena-Ressaquinha-Carandaí-Cristiano Otoni-Conselheiro Lafaiete-Ouro Branco-Mariana-Catas Altas-Santa Bárbara-Barão dos Cocais-Cocais-Bom Jesus do Amparo-Ipoema-Senhora do Carmo-Itambé do Mato Dentro-Morro do Pilar-Conceição do Mato Dentro-Itapanhoacanga-Serro Frio-São Gonçalo do Rio das Pedras-Diamantina. Cf. A. G. COSTA (2005).
O Caminho Velho, vigente desde 1702, seguia o seguinte percurso: São Paulo-Freguesia de Nossa Senhora da Penha-Mogi das Cruzes-Jacareí-Taubaté-Pindamonhangaba-Guaratinguetá-Freguesia de Piedade (Lorena) ou Cruzeiro-São Sebastião do Rio Verde-Baependi-Fazenda Traituba-Carrancas-Caquende-São João del Rey-Lagoa Dourada-São Brás do Suaçií-Engenheiro Corrêa-Ouro Preto-Mariana-Catas Altas-Bom Jesus do Amparo-Itambé do Mato Dentro-Morro do Pilar-Córregos-Serro Frio-São João dos Rios das Pedras-Diamantina. Cf. A. J. Antonil (1966).
O Caminho Velho ligava o Rio de Janeiro a Minas Gerais. Conectando-se em Lorena, seguia a seguinte rota: Rio de Janeiro-Parati-Serra da Bocaina-Cunha-Guaratinguetá-Lorena-Minas.
47. Ver I. Blaj (2000).
48. Em 1728, o governador da Capitania de São Paulo, Caldeira Pimentel, determinou ao militar Francisco de Souza Faria o estabelecimento de uma picada a partir do Viamão, subindo a Serra Geral e chegando aos campos da chamada Vacaria dos Pinhais. Dali, até Curitiba, incorporava-se ao trecho já existente de Curitiba a Sorocaba. Em 1732, esse caminho foi retificado, desviando-se um pouco mais para oeste, denominado de "Caminho do Sul", com quase 1.500 quilômetros. Cf. V. A. da Silva (2004, p. 84).
49. Cf. R. M. Delson (1997, p. 29).
50. Ver R. Delson (1987).
51. No local do antigo Arraial de Santana, fundado em 1726-1727.
52. Ver R. Delson (1987).
53. O Caminho do Viamão partia de Viamão, passando por Lages, Lapa, Castro, Itapeva, Itapetininga, Sorocaba, freguesia de São Roque e São Paulo.
54. O varadouro de Camapuã envolvia um percurso terrestre de 14 quilômetros. Cf. V. da Silva (2004, p. 80).
55. Cf. Documentos Interessantes (v. 20, 1896, p. 298).
56. Para a Vila Boa de Goiás, o caminho partia de São Paulo, contornando o Jaraguá, passando por Jundiaí, Campinas, Mogimrim, pelo pouso de Franca e pelos arraiais de Bonfim, Meia Ponte (atual Pirenópolis) e Córrego do Jaraguá.
57. Ver D. M. R. Boaventura (2007).
58. Ver R. M. de Araújo (2000).
59. Ver I. Blaj (2002); e J. M. Monteiro (1994).
60. Ver H. L. Belotto (2007).
61. Idem.
62. Idem.
63. Ver F. J. C. Falcon (1982).
64. Cf. N. G. dos Reis Filho (1995, p. 44-56).
65. Ver Oficio do Morgado de Mateus ao Conde de Oeiras. São Paulo, 23 de dezembro de 1766. In: Documentos interessantes (v. 23, p.4).
66. Idem, ibidem.
67. Idem, ibidem.
68. Ver I. Blaj (2002); J. M. Monteiro (1994).
69. Ver Avisos e Cartas Regias. Arquivo do Estado de São Paulo: lata 62, n. 420, Livro 169.
70. Idem, p. 145.
71. Ver Carta do Morgado de Mateus à Camara de Iguape. São Paulo, 12 de Janeiro de 1767. In: Documentos Interessantes (v. 67, p. 76).
72. Ver Bando para que nenhuma pessoa possa dezertar dos citios em que viverem. Santos, 25 de Fevereiro de 1766. In: Documentos Interessantes (v. 65, p. 48-49).
73. Ver Cartas ao Conde de Oeiras sobre povoações da Capitania. In: Documentos Interessantes (v. 23, p. 40).
74. Ver Documentos Interessantes (v. 23, p. 398; 418).
75. Ver W. F. da Silveira (1950).
76. Ver Documentos Interessantes (v. 34, p.150-202).
77. Ver M. Neme (1943).
78. Ver Documentos Interessantes (v. 4,, p. 104).
79. Ver Documentos Interessantes (v. 23, p. 415).
80. Ver H. L. Belotto (2007).
81. Ver A. da C. Santos (2002).
82. Ver L. Saia.
83. Celso Maria de Melo Pupo (1969, p. 45).
84. Cf. Documentos Interessantes (v. 65, p. 106).
85. Ver outro artigo da autora no presente dossiê, Do borrão às aguadas: os engenheiros militares e a representação da Capitania de São Paulo.
86. A célebre Calçada do Lorena, que, embora não carroçável, favoreceu, e muito, as trocas com o litoral, transportando, no lombo de mulas, sobretudo o açúcar do plantado.
87. Afonso de E. Taunay (1954).
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