segunda-feira, 1 de abril de 2019

[759] BRASIL FERROVIÁRIO (PARTE 2): A ESTRADA DE FERRO DOM PEDRO II E OS BELGAS (1852).



ESTRADA DE FERRO DOM PEDRO II


Inauguração da Estrada de Ferro DOM PEDRO II. Em 29 de março de 1858, foi inaugurada a seção que ligava a Estação Aclamação (na cidade do Rio de Janeiro) à Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Marapicu (atual Queimados), num total de 48,21 km.
  

Estação Central da Antiga Estrada de Ferro Dom Pedro II (Rio de Janeiro; Brasil) 1889.


Estrada de Ferro d. Pedro II teve sua origem no decreto n. 641, de 26 de junho de 1852, que autorizou a concessão, a uma ou mais companhias, para a construção de uma estrada de ferro que partisse do município da Corte (o atual Rio de Janeiro) e terminasse nos pontos das províncias de Minas Gerais e São Paulo, que mais convenientes fossem. A construção das estradas de ferro estava relacionada ao processo de modernização do Império, alavancado a partir da segunda metade do século XIX, quando se observava um maior desenvolvimento da economia, com necessários investimentos na infraestrutura e na urbanização do Brasil.
A primeira ferrovia, a Estrada de Ferro Mauá como é conhecida hoje e oficialmente denominada Imperial Companhia de Navegação a Vapor e Estrada de Ferro de Petropolis, foi implantada no Brasil em 1852 por Irineu Evangelista de Souza, futuro visconde de Mauá. Foi inaugurada em 30 de abril de 1854 em seu trecho inicial, ligando o Porto de Mauá a Fragoso, no Rio de Janeiro, num trecho de 14,5 km. O projeto pretendia ligar o Rio de Janeiro ao Vale do Paraíba e, mais tarde, a Minas Gerais. O percurso deveria ser feito por mar, do Rio de Janeiro até o porto Mauá, na Baía de Guanabara, seguindo de trem até o pé da Serra da Estrela. A partir deste ponto o trajeto seria por uma estrada de rodagem até Petrópolis, onde continuaria novamente por trem.
Em 1856 começou a ser construída a Estrada União e Indústria, visando a ligação de Petrópolis a Juiz de Fora. Essa estrada seria complementar ao projeto de Mauá, até o segundo trecho de sua ferrovia ser concluído. Entretanto, a transposição da serra era um problema técnico difícil de ser superado na época e a demora em concluir a União Indústria, inaugurada apenas em 1861, tornou a ferrovia de Mauá economicamente desinteressante.
O resultado da importação do material de construção da infraestrutura ferroviária da Bélgica correspondeu à expectativa, sendo todos os fornecimentos de melhor qualidade e por preços razoáveis.

Por outro lado, a necessidade de atender os cafeicultores mais a oeste e o interesse em uma linha que saísse da capital impulsionou o projeto de outra via férrea. Desse modo, ainda em 1852 o governo abriu o privilégio para construção e exploração de uma ferrovia que partisse da Corte em direção a São Paulo e Minas Gerais. De acordo com o decreto, a companhia teria um prazo de exploração limitado a noventa anos e o governo ofereceria vantagens diversas, como o direito de desapropriação de terrenos particulares e de receber terrenos devolutos do Estado para a construção de ferrovias, armazéns e estações. O governo concederia ainda madeira e outros materiais dos terrenos devolutos para a construção de caminhos de ferro, isentaria a companhia do pagamento de direitos sobre a importação de trilhos, carvão, máquinas e equipamentos e garantiria juros de cinco por cento sobre o capital empregado na obra, dentre outros benefícios.
Em 9 de maio de 1855, o decreto n. 1.599 aprovou os estatutos da Companhia da Estrada de Ferro de D. Pedro II, sob a direção de Christiano Benedicto Ottoni, que seria uma sociedade composta por acionistas. O governo emitiria 60 mil ações, no valor de duzentos mil réis cada uma. O estatuto tratava de forma minuciosa todas as determinações relativas à implantação da via férrea, tais como o capital da companhia, deveres e direitos dos acionistas, assembleia geral de acionistas, juros, lucros e dividendos das ações. O estatuto também determinou o trajeto da ferrovia, que partiria da cidade do Rio de Janeiro, no ponto que fosse escolhido pelo governo, passando pelos municípios da Corte e Iguassú. Depois, deveria transpor a Serra do Mar e dividir-se em dois ramais na região ente a serra e o Rio Paraíba. Um dos ramais seria em direção ao povoado de Cachoeira, em São Paulo, e o outro ao Porto Novo do Cunha, nos limites entre Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Em dezembro de 1859 chegou da Bélgica o engenheiro Henri Vlemincx, contratado por ordem do governo imperial, a pedido da diretoria, para administrar a linha de ferro. Ele recebeu licença do exército belga aonde era capitão. Até abril de 1866 era inspetor-geral do Serviço de Tráfego da Estrada de Ferro Dom Pedro II. 
Escreve o Jornal do Commércio de 24 de abril de 1866:
"O Sr. Vlemincx não foi útil só ao Brasil, promovendo os interesses da empresa, obteve também resultados vantajosos para seu país. Por proposta sua fizeram encomendas de material para a estrada de ferro, na importância de centenas de milhares de francos a diversas fábricas da Bélgica, e o resultado correspondeu à expectativa, sendo todos os fornecimentos de melhor qualidade e por preços razoáveis. Estrangeiros como o Sr. Vlemincx são sempre bem-vindos."
As obras começaram em 11 de junho de 1855 e, em 29 de março de 1858, foi inaugurada a seção que ligava a Estação Aclamação (na cidade do Rio de Janeiro) à Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de Marapicu (atual Queimados), num total de 48,21 km.
 Nessa época havia cinco estações: Estação do Campo ou Estação da Corte (a partir de 1925: estação Dom Pedro II, mas popularmente chamada de Central do Brasil), Engenho Novo, Cascadura (todas no Município da Corte), Maxambomba (atual Nova Iguaçu) e Queimados, na Província do Rio de Janeiro. 
Em 8 de novembro do mesmo ano 1858, a estrada de ferro se estendeu até Belém (atual Japeri), no sopé da Serra do Mar. Em 1860, foi concluído o Ramal de Macacos (atual Paracambi), a partir de Japeri, que era o ponto de partida para que a Estrada de Ferro D. Pedro II atravessasse a Serra do Mar. Daí começaram as obras de transposição da Serra do Mar, onde foram construídos treze túneis e a estação de Rodeio (atual Engenheiro Paulo de Frontin), inaugurada em 12 de julho de 1863 e, no ano seguinte, à região fluminense do Vale do Paraíba.
É interessante ressaltar a forma de subida da Serra do Mar: Em simples aderência, sem a utilização de engenhosos, porém ineficientes sistemas de planos inclinados ou de cremalheira comparados àquele. É importante transcrever as magníficas palavras de Ottoni: 
"Eu não construo Estrada para o Brasil de hoje, mas para o Brasil do futuro. Não podemos dividir os trens. É preciso que os trens que correm na baixada galguem a Serra para correr no planalto, senão, não haverá desenvolvimento econômico possível para as províncias de Minas e de São Paulo." 
Tão magnífica foi a obra com suas pontes e túneis (destacando-se o Túnel Grande com 2.238m), que mesmo com os avanços da engenharia na época da duplicação da linha da serra do mar, pouco depois que a estrada completara mais de 50 anos, que muito pouco foi preciso mudar para melhorar o traçado.

Em contrapartida, devido aos elevados custos da construção da linha na década de 1860, o caixa da empresa foi prejudicado. Porém ao menos foi deixado um traçado muito bom, contribuindo para os futuros prolongamentos da Ferrovia, para o desenvolvimento do país e que ainda é muito utilizado nos dias atuais. (fonte ANPF http://www.anpf.com.br/efcb)
Apesar da rápida expansão, a companhia enfrentava dificuldades financeiras, o que levou à alteração do seu traçado original de bifurcação, que passou a ser em Barra do Piraí, ponto atingido em 1864. O secretário de Estado dos Negócios da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, em seu relatório anual de 1864, apontava os problemas da companhia, que estava à beira da falência, e pedia providências para a continuação da obra. Em 1865, pelo decreto n. 3.503, de 10 de julho, o governo incorporou a empresa, e seus bens passaram para o Estado.
Em 20 de setembro de 1865, o decreto n. 3.515 transferiu ao domínio do Estado, com todos os direitos, privilégios e sem pagamento de indenização, o ramal de Macacos. De acordo com o ministro Jesuíno Marcondes de Oliveira Sá, a via, que também passava por dificuldades financeiras por falta de circulação, tinha ligação com a Estrada de Ferro D. Pedro II.

A ferrovia alcançou Entre Rios, atual Três Rios, em 1867. Com a construção desse trecho, o governo transferiu para a Estrada de Ferro d. Pedro II o tráfego de gêneros e produtos feito pela estrada União e Indústria. A partir dali, seguiu para outros municípios da província mineira, alcançando Queluz de Minas(atual Conselheiro Lafaiete) em 1883. Em 1880, foi construído um pequeno ramal próximo à estação Dom Pedro II para atingir o Porto do Rio de Janeiro, com dois túneis e uma estação chamada Estação Marítima.
Quando da Proclamação da República, em 1889, a Estrada de Ferro D. Pedro II teve seu nome alterado para Estrada de Ferro Central do Brasil (mudança oficializada a 22 de novembro desse ano).
Fontes:
·         Brasil e Bélgica : Cinco séculos de conexões e interações / organização Eddy Stols, Luciana Pelaes Mascaro e Clodoaldo Bueno. - São Paulo : Narrativa Um, 2014. - Fragmento da p. 87
·         Estrada de Ferro Dom Pedro II tabela de partida e chegada: Diário de Rio de Janeiro 10 agosto de 1861, p. 3


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RONALD DE ALMEIDA SILVA
Rio de Janeiro, RJ, 02jun1947; reside em São Luís, MA, Brasil desde 1976.
Arquiteto Urbanista FAU-UFRJ 1969-1972.
Especialização em Desenho Urbano e Planejamento Regional (Universidade de Edimburgo, Escócia, 1981-83).
Registro profissional (1972-2012 = 40 anos) CREA-RJ 21.900-D
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