terça-feira, 17 de outubro de 2017

[484] CENTRO HISTÓRICO DE SÃO LUÍS; BIOGRAFIA DE LUIZ PHELIPE ANDRÈS - O Estivador de Sonhos do Centro Histórico de São Luís do Maranhão - Patrimônio Mundial Unesco.

LUIZ PHELIPE ANDRÈS

O Estivador de Sonhos do Centro Histórico de São Luís do Maranhão - Patrimônio Mundial Unesco.

FACEBOOK RAS 18out2017 (n° 2.725): A INSCRIÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SÃO LUÍS NA LISTA DOS BENS CULTURAIS DO PATRIMÔNIO MUNDIAL DA UNESCO (em 06dez1997) E NOSSA HOMENAGEM AO ENG. LUIZ PHELIPE ANDRÈS (em 02dez2000).

Membros da Delegação Maranhense: Arquiteto Urbanista RONALD DE ALMEIDA SILVA, (à esquerda), e o Eng. LUIZ PHELIPE ANDRÈS; respectivamente (RAS) Coordenador Técnico e (LPA) Coordenador Geral da Proposta de Inscrição do Centro Histórico de São Luís na Lista dos Bens Culturais do Patrimônio Mundial da Unesco 1997;

Responsabilidade Institucional: Proposição por determinação administrativa e vontade política da Governadora ROSEANA SARNEY,  elaborada no período 1996-1997 sob a Supervisão Geral do Secretário de Cultura Dr. ELÉZER MOREIRA FILHO e encaminhada ao Governo Federal (através do IPHAN/MinC). Após aprovação do Ministro da Cultura, FRANCISCO WEFFORT, o Presidente FERNANDO HENRIQUE CARDOSO aprovou e endossou a Proposta do CH-SLZ-MA, autorizando seu encaminhamento oficial aos órgãos de análise da Unesco (Icomos), sendo esta a única proposição do Brasil em 1997.

Local da foto: Escadaria principal de acesso ao Teatro Auditório do Palácio Real de Nápoles, Itália.

Data: semana de 01 a 06dez1997.

Evento: XXI SESSÃO PLENÁRIA DO COMITÊ DO PATRIMÔNIO MUNDIAL DA UNESCO.
Em 06dez1997 foi lavrada a Ata de encerramento do evento, com a formalização da inscrição do Centro Histórico de São Luís na Lista dos Bens Culturais do Patrimônio Mundial da Unesco.

Texto e Foto: Acervo ARS-Arquivo Arquiteto Ronald de Almeida Silva

Texto: Ronald de Almeida Silva, arquiteto urbanista.

Homenagem ao amigo LUIZ PHELIPE ANDRÈS, na cerimônia do IAB-MA em sessão especial no auditório da FIEMA, SLZ-MA, lida pela Arq. Maria Laís Pereira, em 02/12/2000.


            Os caminhos das Minas Gerais, todos levam ao mar.

        É o grande paradoxo de uma terra de morraria sem litoral que espia sobre o ombro alheio as marés atlânticas. E nessa metáfora navega uma singular embarcação que tem ao leme um singular timoneiro. Jovem ainda, esse marinheiro pescador de cores e paisagens marinhas sentiu que na Rua Halfeld, a principal de Juiz de Fora, já não cabia mais a aspiração fremente de ter o mar. Partiu então.

            Deu início a sua particular navegação de cabotagem, como fez o velho lobo do mar das letras, Jorge Amado. O mineiro ávido de mar levou sua canoa de sonhos pro Rio de Janeiro. Com os pés mergulhados na areia macia e os olhos no horizonte infinito, sentia-se enebriado pelo cheiro agridoce de uma maresia pura que aspirava nas suaves madrugadas de Copacabana, na cidade maravilhosa, num Rio nem tão antigo, mas ainda pleno de paz e amor, tal e qual na bela canção de Nonato Buzar e Chico Anísio.

            Como um nadador dos sete mares, lutou bravamente pra não se afogar na paixão pelas artes plásticas, pelos pincéis e tintas que um dos grandes artistas plásticos brasileiros - Ivan Serpa - lhe ensinava a manejar, enquanto cumpria sua obrigação filial de se diplomar em engenharia, coisa prática que todos os pais anseiam para os filhos.

            A engenharia venceu a pintura e lá veio o jovem moço – pela mão do destino - praticar sua canoagem cultural e seu mister de engenheiro nas terras do segundo maior e mais dadivoso litoral do país. Aqui aportou em 1977, em São Luís, de onde não mais sairia. Fincou raízes e fez do Maranhão sua segunda pátria, da qual hoje é cidadão honorário, com todos os méritos.

            Como funcionário da Cemar (distribuidora de Energia Elétrica no Maranhão) passou a percorrer o interior do Estado e bateu logo com os costados da sua canoa em Mirinzal, onde viu um Bumba-meu-boi tão lindo, com índias tão faceiras, e um povo tão simples e generoso que pensava até não existir mais. Encantou-se de vez.

            De retorno a São Luís, aportou sua canoa de pesquisa no Projeto Rondon e deu início ao primeiro grande cadastro sistemático de bens culturais do Maranhão, liderando uma animada equipe de universitários e especialistas. Daí nasceu o imprescindível livro “Monumentos Históricos do Maranhão”. A canoa do pescador mineiro começava a carregar.

            Com a ajuda de muitos abnegados pesquisadores maranhenses, o jovem barbudo manteve contatos com os mais diferentes profissionais para levar a cabo a condução de seu primeiro livro.

            Conheceu, assim, o arquiteto norte-americano John Gisiger, que solitariamente aqui desenvolvia um trabalho pioneiro e magistral de pesquisas e proposições, buscando a integração do urbanismo e da sociologia com a engenharia e a arquitetura, como base processo de revitalização física e socioeconômica do Centro Histórico de São Luís.

            O pescador barbudo mineiro logo se envolveu nesse trabalho, a convite do simpático e diligente John. Os dois e mais o arquiteto carioca Ronald Almeida, embarcaram na mais fabulosa pescaria do patrimônio histórico maranhense.

            Assim nasceu, em 1980, o PROJETO PRAIA GRANDE (Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís), por decreto do Governador João Castelo e supervisão do Secretário de Planejamento João Rebelo Vieira.

            A essa fase primordial do Projeto Praia Grande – que aglutinou cerca de 50 profissionais de diversas áreas durante 15 anos - deram depois o nome de Projeto Reviver e depois o renomearam Prodetur. Mas a base é uma só, como dizia Tom Jobim, até hoje [ano 2000] comandada por Luiz Phelipe, desde 1981.

            Enquanto pescava pedras de cantaria, frontões, coruchéus, fachadas e adros de igrejas, na sua infatigável faina da preservação, o mineiro pescador encontrava pérolas de imenso valor.

            Num velho sobrado em ruínas, encontrou em 1982, 166 livros da Câmara colonial de São Luís, livros irmãos dos que pesquisou o poeta Gonçalves Dias e dos quais levou alguns para a Biblioteca Nacional. Neles está assentada boa parte da história do Maranhão dos séculos XVII, XVIII e XIX. Um tesouro inédito, hoje com 30 mil páginas transcritas.

            Mas, outra grande pescaria ainda realizou: por sua iniciativa, reuniu uma grande equipe e partiu para investigar o modo de construir as embarcações de madeira feitas pelos anônimos estaleiros artesanais do Maranhão. Outro tesouro veio à tona, quando publicada a pesquisa.

            O Ministério da Cultura, por indicação do IPHAN, concedeu-lhe o Prêmio Rodrigo de Mello Franco, como o melhor trabalho de pesquisa de 1996.

            Esse trabalho foi publicado em forma de livro de rara beleza - “Embarcações do Maranhão” – e se tornou um marco referencial do gênero, a respeito do qual um dos maiores navegadores do mundo – o brasileiro AMYR KLINK – se pronunciou:

“Tamanha é a importância [do trabalho sobre as Embarcações do Maranhão] para a nossa cultura e, tal a urgência e oportunidade de sua publicação, que não cabe aos seus autores apenas o elogio e o agradecimento. Cabe-lhes a missão de não descansar, de estender esse estudo a todas as regiões brasileiras, da cada navegar cada centímetro do Brasil – costa e interior – e fazer destas preciosas páginas a semente de um contínuo descobrimento. ”

             Assim falou AMYR KLINK sobre o trabalho do pescador que nasceu sem mar.

            Na sua navegação de cabotagem, o nosso navegador mineiro aportou na ponte de comando da Cultura do Maranhão, quando em 15 de setembro de 1992 foi nomeado Secretário de Estado da Cultura, cargo que exerceu com muita sobriedade, equilíbrio e competente pertinácia, qualidades que marcam sua trajetória e dignificam seu currículo.

            Após longos anos de paciência indômita, sacrifícios pessoais e muitas procelas no mar de problemas que é a preservação de centros históricos e bens culturais no Brasil, o nosso pescador realizou a sua maior pescaria.

            Em 1996, por determinação expressa da Governadora Roseana Sarney, o Secretário de Cultura Eliézer Moreira Filho incumbiu Luiz Phelipe da Coordenação Geral e Ronald Almeida da Coordenação Técnica do grupo de trabalho responsável pela elaboração e complexa montagem da proposta (com dossiê técnico em francês) de inclusão do Centro Histórico de São Luís na Lista dos Bens Culturais do Patrimônio Mundial da Unesco.

            Foi formada para essa missão uma equipe técnica com valorosos companheiros arquitetos e outros especialistas de renome: arquitetos Dora e Pedro Alcântara, Danilo de Azevedo Rocha, Silvia Leal (superintendente do IPHAN/MA), Profa. Zelinda Lima, fotógrafo Albani Ramos e mais Jean-Pierre Halévy e Rafael Moreira (consultores internacionais, respectivamente, de Paris e Lisboa).

            Terminada a tarefa básica, a Governadora Roseana Sarney encaminhou a proposta ao Presidente Fernando Henrique Cardoso (via IPHAN/MinC). Após aprovação formal no Conselho Nacional de Cultura, homologação pelo Ministro da Cultura Francisco Weffort e chancela da Presidência da República, a Governadora autorizou o envio da Proposta à Unesco.

            O trabalho de preservação de São Luís foi analisado preliminarmente pelo órgão consultivo ICOMOS em junho 1997 e foi depois submetido ao debate no plenário anual da XXI Sessão do Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco, na cidade de Nápoles, Itália.

            Em 04dez1997, em coletiva de imprensa, a Unesco anuncia a aprovação da proposta do Centro Histórico de São Luís do Maranhão e no dia 06dez1997 formaliza na Ata do evento sua a inscrição na Lista dos Bens Culturais do Patrimônio da Humanidade. Missão cumprida.

            Apesar de todas essas conquistas, de ser membro do Conselho Nacional de Cultura e de dirigir o maior projeto de preservação do país, o pescador de sonhos aqui presente tem projetos maiores, duas realizações insuperáveis: chamam-se Luiz Francisco e Cristiane, filhos que o zeloso pai adora e não os esquece um só momento.

            Assim é, em poucas palavras, o nosso colega homenageado, Luiz Phelipe, ao qual, além de engenheiro, poderíamos conferir os títulos “honoris causa” de arquiteto – como sempre é honrosamente confundido -, e também de pintor, desenhista, ilustrador e chargista bem-humorado, capaz de captar as mais sutis filigranas da face humana.

            Por tudo isso, neste dia 02 dezembro 2000, o IAB – Instituto de Arquitetos do Brasil, Departamento do Maranhão, ao inaugurar a última exposição de arquitetura no Maranhão no século XX, decidiu prestar uma singela homenagem ao pescador barbudo, pesquisador, estivador de sonhos do patrimônio histórico e engenheiro Luiz Phelipe de Carvalho Castro Andrès.

            Com os agradecimentos de todos que amam a cultura maranhense e o Brasil, só podemos dizer:

Muito obrigado, Mestre Luiz Phelipe. !



Ronald de Almeida Silva, 53, é carioca e reside em São Luís desde 1976. Por concessão da Câmara Municipal é Cidadão Honorário de São Luís desde 1987. Foi o 1º Coordenador Geral [1980-81] do Programa de Preservação e Revitalização do Centro Histórico de São Luís – Projeto Praia Grande; Coordenador Técnico do Projeto Reviver [1988-89] e atua como consultor “ad hoc” do Projeto Prodetur desde 1995.

Nota: O presente texto foi elaborado como Saudação ao Eng. LPA e lido pela Arq. MARIA LAIS PEREIRA por ocasião da entrega do prêmio especial na abertura da Semana de Arquitetura promovida pelo IAB-MA e Escola de Arquitetura/UEMA, em 02 dezembro 2000.



Nenhum comentário:

Postar um comentário