[102] REVISTA BULA -
O MISTERIOSO MUNDO SECRETO DAS MULHERES SOLTEIRAS
Acesso em 2015-08-31
Era uma vez uma mulher que desde
menina tinha um plano: estudar, se formar, casar e ter filhos; parecia tudo tão
natural, e do jeitinho que haviam lhe ensinado que seria. Mas, depois de tanto
tempo e tantas coisas que aconteceram — e outras que não aconteceram —, seus
sonhos mudaram, assim como ela mudou. E quando ela menos esperava, em meio a
tantos tropeços e dúvidas e receios, ela descobriu como é maravilhoso não fazer
tantos planos.
É que às vezes a vida fica
confusa. As emoções andam em zigue-zague da clareza da alma ao ponto mais negro
da sombra do coração. Porque somos seres de sentimentos opostos, ao mesmo tempo
em que queremos algo, temos medo. Dizemos ‘não’ querendo dizer ‘sim’. E quando
não queremos tal coisa, às vezes, somos obrigados a fazê-la.
Também acontece de termos
certezas, e, depois, nadamos contra correntezas de dúvidas. Como aquela mulher
que se sentia perdida, mas, mesmo assim, preferiu fingir que estava tudo bem
por algum tempo. Porém, um terremoto a destruía por dentro. Era como se ela
fugisse de um fantasma que nunca via, mas sabia que ele estava ali, em algum
lugar dentro do mistério incompreendido dela.
Não. Não estava tudo bem. E
piorava quando alguém vinha corroborar aos seus próprios julgamentos. Eram as
amigas casadas que diziam que ela só se sentiria completa depois que tivesse um
filho, ou o seu ginecologista lhe aconselhando a congelar os seus óvulos porque
a idade reprodutiva estava passando. Também tinham alguns curiosos que queriam
entender como uma mulher bem resolvida profissionalmente ainda não tinha um
marido, enquanto outros lhe traziam informações não requeridas de que
ex-namorados estavam muito bem casados.
Pra que fingir que estava tudo
bem? Envergonhava-se por sentir isso, mas sempre pensava na falta de sorte nos
seus relacionamentos anteriores e no vazio que sentia por não ter um filho. Era
injusto se sentir com um prazo de validade na questão da fertilidade. E ela não
queria ter tanta pressa, quem corria era o tempo.
Até que um dia ela se despertou
dela mesma. Sua tristeza descansou na solidão ao perceber como tantas
expectativas — e cobranças — não eram bem-vindas.
Jane Austen, autora de seis
romances cujos temas abordavam o amor e o casamento, inspirados na época em que
ela vivia, a aristocracia rural inglesa do início do século 19, ela mesma nunca
se casou. Naquela época, a única forma de uma mulher se tornar independente dos
pais era se casando. Austen foi pedida em casamento e chegou a aceitar, mas, no
dia seguinte, ela voltou atrás para não “trair a sua crença de que pior do que
viver sozinha seria se casar sem amor”.
A nossa vaidade muitas vezes nos
engana. Como descreveu Jane Austen, “A vaidade e o orgulho são coisas
diferentes (…). Uma pessoa pode ser orgulhosa sem ser vaidosa. O orgulho se
relaciona mais com a opinião que temos de nós mesmos, e a vaidade, com o que desejaríamos
que os outros pensassem de nós”.
A mulher solteira e bem resolvida
deseja uma mão para segurar no passeio pelo parque; ela quer frases em toques,
e vírgulas que virem histórias. Deseja degustar o amor em sua essência. Não
precisa provar nada para ninguém, e muito menos precisa de aprovação alheia
para as suas escolhas.
Ela quer pisar no tapete novo de
sua casa, aquele que fica na porta de entrada. Limpar seus pés e deixar para
trás o que era para ter sido e não foi. Dar o primeiro passo no chão fresquinho
do presente para viver todos os dias aquilo que é. E, ao acender seu pendente
colorido sobre a mesa da sala de estar, manter acesa a esperança de viver o que
será!
E, sobre a mulher do início do
texto, se ela se casou e não teve filhos, ou se optou por permanecer solteira e
adotou um cachorro; ou, ainda, se viajou o mundo para escrever um livro, ou se
aproveita a vida sozinha enquanto espera encontrar aquele com quem dividirá os
sonhos de constituir uma família… Não importa sabermos. Ela está feliz.
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