CORRUPÇÃO COMO
INSTRUMENTO DE GOVERNO NO BRASIL DO SÉCULO XXI
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“Há algo pior neste
mundo que o abuso da força: é a complacência servil que essa força encontra
quando é bem-sucedida, essa adulação obsequiosa que esquece o Crime para bajular o Sucesso”.
Léon Blum.
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Citado
por Jurandir Freire Costa:
SOCIEDADE
DA CORRUPÇÃO: O QUE LEVA POLÍTICOS E EMPRESÁRIOS A SE ENTREGAR À INDECÊNCIA
ESCANCARADA? [Blog Aliás; OESP; 31dez2016]
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SOCIEDADE DA CORRUPÇÃO: O QUE LEVA
POLÍTICOS E EMPRESÁRIOS A SE ENTREGAR À INDECÊNCIA ESCANCARADA? [31dez2016]
Ø No
Brasil, corromper se tornou modo de vida, apoiado no tripé Impunidade, Vício e Banalidade.
Ø Mas
o que levou uma legião de políticos, servidores e empresários a se entregar à
indecência escancarada?
Fonte: Blog ALIAS OESP; Jurandir
Freire Costa , 31 Dezembro 2016 | 16h00
JURANDIR
FREIRE COSTA, psicanalista e escritor. Autor, entre
outros livros, de O RISCO DE CADA UM
(Garamond)
- É de Thomas Jefferson a frase: “Estremeço por meu país quando reflito que Deus é justo; que Sua justiça não pode dormir para sempre”.
- Deixemos de lado o tom religioso do apelo feito a Deus por um dos artífices da democracia ocidental. No discurso de Jefferson, o que salta à vista é o temor de que certas iniquidades atropelem a justiça mundana e exijam uma força transcendente para barrar sua expansão.
- No Brasil dos últimos anos, a baixeza da vida política levou igualmente muitos de nós a “estremecer pelo futuro do País”.
- Entre os sinais da
decadência, a corrupção é, certamente, um dos mais preocupantes. O que
levou uma legião de parlamentares, servidores públicos, empresários, a se
entregar à corrupção desabrida? O que aprender com isso?
- Obviamente,
não existem respostas simples para a questão. Penso, entretanto, que a
corrupção no Brasil não se resume a atos pontuais de indivíduos
inescrupulosos. A constância, a extensão e a intensidade com que vem sendo
exercida tornou-a uma verdadeira “cultura” enxertada na vida social
brasileira.
- Defino
cultura da corrupção, neste contexto, como o conjunto de crenças e regras
de ação internalizadas e praticadas por pessoas suficientemente poderosas
para malversar, em benefício próprio, recursos pecuniários destinados ao
bem público. Essa cultura é um modo de vida, e, como tal, apresenta
aspectos típicos de sua forma de sobreviver e se autorreproduzir. Dos
aspectos, três me parecem relevantes: a impunidade, o vício e a
banalidade.
- O
primeiro, a impunidade, é o mais familiar. As oligarquias
político-econômicas brasileiras, fiéis ao seu passado, continuaram a se
apropriar do que é público sem nenhum traço de pudor ou receio de punição.
Ao contrário, nos últimos tempos, refinaram a máquina de extorsão, pondo
políticos imprestáveis e obsoletos a serviço do empresariado
parasito-dependente do Estado e recrutando a ralé de lobistas e asseclas
para otimizar o gerenciamento da corrupção.
- A
expectativa da impunidade da corrupção é, sem dúvida, escandalosa. Porém é
apenas a ponta do iceberg da desigualdade. Um dos efeitos mais nefastos do
abismo social brasileiro é o de impedir que os sujeitos possam empatizar
mutuamente com o ponto de vista do outro. A insensibilidade social dos
corruptos deriva em parte do fosso que os separa da maioria da população.
Essa distância excessiva, aliás, “desumaniza” os dois polos da pirâmide
social.
- Os que estão na base tendem a nutrir um forte ressentimento pelos que estão no topo, e os do topo, a racionalizar a injustiça com argumentos ainda mais ferozes: “se se deixam enganar, é porque são miseráveis, ignorantes, preguiçosos, aproveitadores, vagabundos, sem ambição etc”. Resultado: desespero dos que terminam por recorrer à violência como meio de afirmar suas existências sociais.
- No final, tudo parece confirmar o que disse um
recém-eleito vereador do Rio: num país em que muitos lavam as privadas de
poucos, muitos podem vir a morrer tragicamente por um pífio roubo de
bicicleta ou de celular.
- O
segundo aspecto da cultura da corrupção é a metamorfose do crime em vício.
Explicitando, a maior parte dos corruptos de grande porte era composta de
parvenus ou de membros de grandes famílias oligárquicas. Embora de
extrações sociais diversas, ao longo do tempo, os dois grupos assumiram
uma atitude social comum, a exibição desenvolta dos sinais do crime.
- Os
arrivistas adotaram o estilo de vida ostentatório, indicativo da ânsia por
ingressarem no círculo dos “fortunate few”, e os “bem-nascidos”, a
arrogância de quem manobra políticos como um titereiro manipula
marionetes. Ambos conseguiram construir palcos sociais para seu
ressentimento ou exibicionismo, e assim passaram pouco a pouco de criminosos
a “excêntricos morais”.
- Como
mostrou Hannah Arendt, o desviante social rotulado de criminoso evita o
olhar do público, exceto em lugares e circunstâncias definidos pela
sociedade como domínio do Bas-Fond. No Brasil, o caso dos bicheiros é
exemplar. Os desfiles das escolas de samba e outras atividades ligadas ao
carnaval funcionam como momentos rituais em que o submundo tem permissão
de vir à tona da superfície social. É o espaço do desrecalque; o espaço no
qual os bem-pensantes flertam com a transgressão, com as baixas origens da
“lei”, em suma, com o resto indomado da força pulsional.
- No
caso do desvio social tornado vício, a dinâmica é outra. A relação da “boa
sociedade” com seu lúmpen passa da esfera do direito para a da “moral”
individual. A atitude do criminoso é julgada por leis válidas para todos;
a do vicioso, do sujeito com desvios morais, pela liberalidade ou
severidade de quem julga. Os corruptos, assim, adquiriram passe livre para
frequentar as “pessoas de bem”, desde que aceitassem ser uma curiosidade,
um caso exótico de “dinheiro fora do lugar”.
- No
mundo da opulência, o crime ganhou o status de vício e os suspeitos morais
acabaram se tornando convidados ad hoc para a festa do poder. Afinal, não
custa ser cortês ou indulgente com quem tem bolsos recheados. Foi o que
foi feito e refeito. Num misto de alheamento, oportunismo e
inconsequência, o “andar de cima” – com perdão da palavra! – virou um
picadeiro para a exposição do espólio da corrupção.
- Em
razão disso, os corruptos foram se sentindo cada vez mais em casa, em suas
práticas ilícitas. A realidade, por algum tempo, parecia curvar-se à
onipotência fantasmagórica. A prepotência do senhoriato empresarial seguia
impune e o arrivismo esbanjava soberba no desfile de joias principescas,
restaurantes e hotéis de luxo, festas milionárias e resorts. Tudo ia no
melhor dos mundos, com a cumplicidade dos caricatos “finzi continis” ao
sul do equador. Até que veio o imprevisível e o desastre conhecido de
todos.
- Em
retrospectiva, o auge da corrupção compulsiva parece ilustrar o que disse
Léon Blum: “Há algo pior neste mundo que o abuso da força; é a
complacência servil que essa força encontra quando é bem-sucedida, essa
adulação obsequiosa que esquece o crime para bajular o sucesso”.
- O
terceiro aspecto, o da banalidade, é o lado mais sombrio da corrupção,
porquanto implica a constatação da incapacidade do criminoso de avaliar a
gravidade de seu crime. A expressão, como a utilizo, é uma extrapolação
aproximada do célebre conceito de banalidade do Mal, criado por Hannah
Arendt.
- Ao
buscar entender a espantosa e apática frieza de Eichmann diante da
monstruosidade que havia cometido, Arendt forjou essa noção. O mal, disse
ela, é aterrador e aberrante em seus efeitos, mas pode ser torpe e
mesquinho em suas motivações. Dito de outro modo, muitas vezes, um
criminoso medíocre como Eichmann é incapaz de se dar conta do horror que
pode causar a estupidez de suas decisões.
- Fique
claro, não se trata de comparar os crimes do nazismo com a corrupção
brasileira, o que seria absurdo. A estupidez do corrupto não é a do
nazista. A intenção é mostrar o que qualquer estupidez moral tem em comum:
a inépcia do estúpido para pensar sobre o sentido ético do que faz. A
banalidade da corrupção é detestável por contribuir para a perpetuação da
miséria material de grande parte dos brasileiros, mas também por degradar
o valor da política na vida cultural. Esse crime é, no limite, quase
indesculpável.
- Por
exemplo, a gestão empresarial da corrupção agia com a ligeireza de quem
administra processos burocráticos de maximização de lucros. Uma das
empresas chegou a criar um departamento de propina com protocolos
padronizados para pagamento aos corruptos. Algo equivalente ocorreu com os
apelidos dados aos políticos pelos funcionários de tais empresas. Além de
degradantes, os apelidos mostram o deboche com que os políticos corruptos
eram tratados pela burocracia empresarial. Pior ataque à política é
difícil de conceber.
- Pode-se
retrucar que eles receberam o que mereciam: desprezo e humilhação. Acontece
que, no exercício de seus mandatos, os políticos são a instância nobre da
autoridade democrática. A estupidez dos corruptos impede-os de ver que não
existe civilização sem hierarquia fundada no respeito à autoridade, e que
a corrupção é um instrumento demolidor da credibilidade de qualquer
governante.
- Com a desmoralização da política, a ordem de valores da sociedade moderna pode vir a pique e, com ela, os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade. Para os corruptos, isso é idiotice hipócrita e pueril. Para outros, sem estes ideais não temos como imaginar um futuro melhor para nós e as novas gerações. Alinho-me aos últimos, e, citando livremente Kafka, diria: “a esperança nos foi dada em consideração aos desesperançados”.
- A estupidez passa, a esperança fica.
JURANDIR FREIRE COSTA, psicanalista
e escritor. Autor, entre outros livros, de O RISCO DE CADA UM (Garamond)
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NOTA
DO EDITOR do Blog Ronald.Arquiteto e do Facebook Ronald Almeida Silva:
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e amarelo
bem como nomes próprios em CAIXA ALTA
e a numeração de parágrafos que
foram introduzidas na presente versão NÃO CONSTAM da edição original
deste documento (artigo; pesquisa; monografia; dissertação; tese ou reportagem).
Esses
adendos ortográficos foram acrescidos meramente com intuito pedagógico de facilitar a leitura, a compreensão e
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está transcrito na íntegra e na forma da versão original.
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O gestor
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nem exerce qualquer tipo de militância político-partidária ou
político-ideológica.
RONALD DE
ALMEIDA SILVA
[Rio
de Janeiro, RJ, 02jun1947; reside em São Luís, MA, desde 1976]
Arquiteto Urbanista FAU-UFRJ 1972
Registro profissional CAU-BR A.107.150-5
e-mail: ronald.arquiteto@gmail.com
Blog Ronald.Arquiteto (ronalddealmeidasilva.blogspot.com)
Facebook ronaldealmeida.silva.1
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