PMs MORTOS NO RJ DE 1995 A 2017 (22 ANOS): 3.121 VÍTIMAS
Ø A
taxa de mortalidade entre 1995 e 2016, segundo a PM, é maior do que a de
soldados americanos mortos na Segunda Guerra Mundial.
Só em 2017, 100 PMs assassinados até 26.agosto: média é a maior em
mais de 10 anos no RJ [G1; 26ago2017]
Ø Dados
oficiais da Polícia Militar indicam que 80% das vítimas dos últimos 22 anos
estavam de folga. Especialistas culpam bicos, colapso do estado e política de
confronto pelo grande número de mortes.
Fonte: Grupo GLOBO; Por Felipe
Grandin, Henrique Coelho e Cássio Bruno, Portal G1 Rio; 26/08/2017
10h12 Atualizado 26/08/2017 15h48
Acesso RAS 2018-03-22
|
Fonte:
Polícia Militar/Divulgação
|
Nota
RAS: em 2017 o total de PMs assassinados no Rio de Janeiro foi de 134.
[1] [NÚMEROS DA VIOLÊNCIA NO RIO DE JANEIRO]
O Rio de Janeiro chegou neste sábado (26ago2017)
à
marca de 100 PMs mortos só em 2017. O número indica que um policial é morto
a cada 57 horas, ou pouco mais de dois dias. A média é a maior desde
2006, quando um policial foi assassinado a cada 53 horas.
A 100ª vítima foi morta neste
sábado (26) na Baixada Fluminense. O
SARGENTO FÁBIO CAVALCANTE E SÁ foi baleado próximo ao Largo do
Guedes, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense. Ele, que trabalhava em
Magé, chegou a ser socorrido para a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Nilo
Peçanha, em Duque de Caxias, mas não resistiu a um tiro de fuzil na cabeça. A
informação foi confirmada pela assessoria de imprensa da corporação.
Segundo o coronel FABIO CAJUEIRO, da Comissão de Vitimização da Polícia Militar, a Polícia do Rio está
lutando em uma "guerra inglória". "Eu acredito que a população
do Rio ainda não gosta de criminoso. E a gente tem outro problema: em qualquer
lugar do mundo tem tráfico. Mas narcotráfico associado à arma de guerra e
caçada a policial, a gente só vê aqui no Rio", lamenta Cajueiro.
A Baixada Fluminense é a região
com maior número de mortes. Foram 27 este ano, mais de um quarto do total.
A maior parte das mortes ocorreu entre quinta-feira e domingo.
Em 2017, quase 60% desses PMs
morreram durante suas folgas: 58. Até o dia 25, já haviam morrido em serviço 22
policiais, mais do que em todo o ano de 2015, quando morreram 18.
[2] [MAIS DE] 3 MIL PMS MORTOS EM 22 ANOS
Em média, um policial morreu a cada 64 horas [=2,6
dias] no Rio desde 1995, somando 3.087 vítimas* durante
este período. Essa é a conclusão feita a partir de estatísticas da Polícia
Militar a que o G1 teve acesso. A taxa
de mortalidade entre 1995 e 2016, segundo a PM, é maior do que a de soldados
americanos na Segunda Guerra Mundial.
[* -
Nota RAS: O total de PMs mortos em 2017 foi 134, o que aumenta para 3.121 vítimas
em 22 anos completos]
Nos últimos 22 anos, 3,52% dos 90
mil integrantes do efetivo da PM do Rio morreram. Durante os três anos e meio
da participação americana na guerra, 405 mil soldados americanos morreram, o
equivalente a 2,52% da tropa, composta por mais de 16 milhões de soldados.
"O número é maior do que as
baixas do exército americano na primeira e segunda guerra mundiais. É 765 vezes
mais fácil você ser ferido servindo na polícia do Rio do que estando em guerras
como a Guerra do Golfo", disse o
coronel FABIO CAJUEIRO, oficial
responsável por tabular as estatísticas.
Em 2017, a PM realizou uma
mudança metodológica nos próprios dados: além de contar os policiais mortos em
serviço e os que estavam de folga, a corporação passou a contabilizar também as
mortes dos PMs reformados. Anteriormente, apenas as mortes causadas por
perfurações de armas de fogo eram contabilizadas. Desde 2017, qualquer tipo de
morte violenta também passou a entrar na estatística.
É nas folgas que os policiais são
mais vítimas de mortes violentas. Das 3.087 mortes ocorridas desde 1995, 2.465
ocorreram durante a folga dos agentes, ou seja, 80% dos casos. No período, o
número de policiais mortos em serviço foi de 598.
Se o problema já é antigo, o
aumento entre 2015 e 2016 chama a atenção. Em 2015 foram 91 mortes, entre
mortos em serviço e de folga. Já em 2016, o número chegou a 146, ou 60% mais
que no ano anterior.
[3] MORTES DE FOLGA, COLAPSO E 'CULPA DO ESTADO'
BRUNO PAES MANSO, doutor em ciência política e especialista
do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da Universidade de São Paulo (USP),
considera que três fatores podem ajudar a explicar os números:
"Você tem uma cultura que
incentiva o bico dentro das polícias. Isso, com o passar do tempo, acabou
ficando institucionalizado. O policial, quando trabalha na corporação, tem toda
uma estrutura. Quando ele está de folga, é ele contra o mundo. Ele fica muito
mais vulnerável. Existe também um medo de os policiais serem executados quando
são roubados, além dos confrontos que acontecem todo dia", explica Paes Manso.
Segundo o especialista, o Rio
adotou durante um determinado período uma política de combate ao crime
relativamente mais eficaz durante a gestão de JOSÉ MARIANO BELTRAME na pasta de segurança pública, entre 2007 e
2016.
"Os traficantes da ADA e do
PCC conversando, eles falavam: 'Quando a gente faz guerra, o estado ocupa,
então a gente parou de entrar em confronto'. Ou seja, tinha uma política
pública, que produzia uma nova forma de se comportar. Hoje, temos uma
fotografia de um estado em crise. É quase como se não existisse mais lei. A
impressão é de que é uma selva, em que quem vence é o mais forte. A solução
passa pelo fortalecimento do Estado e por um governante respeitado. Não adianta
você botar só polícia. ", afirma ele.
A letalidade de policiais está
ligada, segundo o ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais e especialista
em Segurança Pública Paulo Storani, ao fato de o policial se sentir PM 24 horas
por dia, e sempre impelido a agir, colocando-se em uma situação de risco e
desvantagem.
"O policial, de forma geral,
não se encontra na plena capacidade de exercer a sua capacidade, está sempre no
déficit físico e psicológico. Na folga, quando ele deveria descansar, ou está
no bico ou está no trabalho extra. Há então uma superposição de carga de estresse
que logicamente leva a tomar decisões equivocadas. A tendência desse
profissional é agir com a maior força que ele puder agir, e por isso que vários
morrem durante a folga: eles não se omitem", avaliou o especialista.
[4] POLÍTICA DE CONFRONTO
O ex-comandante da Polícia
Militar, Ibis Silva, elege o próprio estado como o principal culpado por todas
essas mortes. "O grande vilão é essa política pública belicista, de guerra
às drogas, que gera morte e ódio. O estado é responsável por essas mortes, tanto
no serviço ativo quanto na folga", afirma ele, classificando a política
como "esquizofrênica", na qual a polícia militar é obrigada a
apreender armas e drogas entrando nas favelas.
"Essa polícia então ela é
empurrada para dentro da favela, para matar e para morrer. Isso para não falar
do cenário federal, com uma política de drogas irracional e com a falta de uma
politica de redução de homicídios e de circulação de armas e munições. Se você
juntar isso tudo, você entende porque as UPPs entraram em colapso,e porque
entramos nesse cenário catastrófico que temos hoje, e com tendência de
alta".
Ibis diz ainda que o número de
mortes de policiais está diretamente vinculado ao aumento de homicídios por
intervenção policial. Segundo os dados do Instituto de Segurança Pública, de
2003 a junho de 2017, havia mais de 12,8 mil casos registrados. De 2015 para
2016, o crescimento foi de 645 para 925, um aumento de 43%. Em março de 2016,
foi registrado o maior número dos chamados autos de resistência em um único mês
desde maio de 2008: 123 casos.
"Esses dois números têm que
ser pensados juntos. A polícia que mais morre é a polícia que mais mata. A
redução de homicídios tem que começar pela redução da letalidade das polícias.
Primeiro porque a Polícia é o estado, e segundo porque não podemos conviver com
o alto índice de letalidade das políticas num estado democrático de direito. E
quando isso acontecer, teremos uma diminuição da vitimização de policiais. Uma
coisa está ligada à outra, ainda mais com essa política pública manchada de
sangue. Se a gente não botar o dedo nessa ferida, vamos continuar produzindo
esses números vergonhosos", finalizou.
PMs,
amigos e familiares foram homenagear o soldado Samir em enterro (Foto:
Reprodução / TV Globo)
|
[5] FAMÍLIAS SOFREM COM A SAUDADE
Os assassinatos dos PMs deixaram
um rastro de dor, sofrimento e saudade. Bianca Marins, de 28 anos, ainda está
de luto. Ela é esposa do 1° sargento MÁRCIO
LEANDRO DO NASCIMENTO MARINS, de 46. Lotado no 22° BPM (Maré) e há 22 anos
na corporação, o policial foi encontrado morto carbonizado em 14 de fevereiro
em um carro próximo à comunidade da Palmeirinha, em Marechal Hermes. MÁRCIO deixou duas filhas, de 7 e 9
anos.
"Estou desorientada. Não
seis mais o que fazer. O nosso Dia dos Pais foi terrível. O meu sogro teve que
ir à festa da escola das meninas no lugar do Márcio. Não sei o que é passar um
dia sem chorar" desabafou BIANCA.
Inconformada com a violência no
Rio, a esposa do PM não esconde a vontade de sair do país. BIANCA lamentou a falta de apoio adequado do governo do estado,
principalmente em relação ao atendimento psicológico. Ela contou que recorre à
religião para tentar minimizar a perda do marido, com quem mantinha um
relacionamento de 22 anos.
"Mesmo com parentes e amigos
por perto, nós, viúvas, nos sentimos sozinhas. Depois dos crimes, acabou. É a
gente e mais ninguém. Passa o tempo e os PMs viram estatística. Não temos apoio
psicológico. Não temos apoio de representantes dos Direitos Humanos" disse BIANCA.
Grávida de 8 meses, MICHELE LIMA, de 33 anos, defendeu a
aprovação de leis mais severas a bandidos que matam agentes público ligados à
segurança pública. MICHELE é viúva
do soldado SAMUEL OLIVEIRA DA SILVA,
também com 33. O PM morreu em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, depois
que seu carro foi metralhado em uma suposta tentativa de assalto. Ele era
lotado na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) do Vidigal.
"Se não mudarem as leis, o
Rio vai continuar enxugando gelo. A polícia prende e, depois, é obrigada a
soltar o bandido", afirmou
ela.
Michele revelou temer quando o
filho, que receberá o mesmo nome do PM ao nascer, a perguntar sobre a história
do pai.
"Será um desafio criá-lo.
Nunca imaginei em ter um filho sem pai. A minha maior preocupação é que, quando
ele crescer, queira saber o que aconteceu. Estou vivendo um dia de cada
vez", disse.
Situação semelhante com a de
Lucília Lance, de 29 anos. Em 20 de abril, nasceu Téo, 46 dias depois do
assassinato do cabo da PM Thiago de Oliveira Lance, lotado na UPP Camarista
Méier. Ele foi morto a tiros em 23 de fevereiro por dois homens que estavam em
uma moto, a poucos metros de onde mora a família no bairro de Cordovil. Téo
nasceu com 2,285 quilos e 47 centímetros e não conheceu o pai.
"Sinto que a minha vida está
em suspenso. Eu lido com o luto da perda do meu companheiro e amigo, e lido com
a missão e desafio de receber uma nova vida. Dificuldade que vem sendo
amenizada com passar dos dias e desafios que vou vencendo e adquirindo
maturidade e autoconfiança", relatou Lucília.
[6] SECRETÁRIO PEDE REFORMA NAS LEIS CRIMINAIS
O
secretário de Segurança Pública, Roberto Sá, pediu novamente por mudanças na
legislação criminal após mais um enterro de policiais (Foto: Reprodução/
GloboNews)
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Desde que assumiu o cargo no
lugar de JOSÉ MARIANO BELTRAME, ROBERTO SÁ se acostumou a frequentar
enterros de agentes de forças de segurança. No último sábado, o secretário
esteve no enterro do soldado
SAMIR DA SILVA OLIVEIRA, de 36
anos. Na ocasião, ele pediu reformas na legislação criminal do país e lamentou
os 97 policiais mortos até então.
"É um número alarmante que
nos deixa muito tristes, muito perplexos e que nos leva à seguinte reflexão: é
uma polícia que está nas ruas, é uma polícia que se doa, são heróis que estão
morrendo. Não tenham dúvidas que a tente mergulha nos nossos protocolos, nossas
estratégias, dias após dia, para poder melhorar. Mas, me parece, que isso no
Rio de Janeiro e no Brasil não tem sido suficiente para a gente ter uma
sociedade cujo o criminoso reflita antes de sair praticante crime", disse ROBERTO SÁ.
Segundo o secretário, enquanto as
penas para criminosos não foram modificadas, a sociedade vai continuar a
"sangrar".
"Nós precisamos exigir
reforma na política criminal. Eu vejo reforma tributária, reforma política,
reforma econômica, cadê a reforma criminal? Essa legislação te atende como
cidadão? Você acha que três anos [de pena] inicialmente, para quem porta um
fuzil para sair em 6 meses, é razoável? Vocês acham que quem tira uma vida de
uma pessoa pode progredir de uma pena de 15 [anos] e sair com cinco, seis anos?
Não é razoável".
O mundo não trata o crime assim.
Sociedade que depende só da polícia para evitar isso é uma sociedade que vai
"sangrar".
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