segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

[594] SOCIEDADE DA CORRUPÇÃO 2: LAVA JATO E CAPITALISMO DE COMPADRIO: O DESAFIO É PERMITIR A EVOLUÇÃO DAS INSTITUIÇÕES [HELIO GUROVITZ; 31dez2016]




LAVA JATO E CAPITALISMO DE COMPADRIO: O DESAFIO É PERMITIR A EVOLUÇÃO DAS INSTITUIÇÕES [31dez2016]


Ø O maior desafio do ano é evitar que a ânsia por recuperar a economia emperre a evolução institucional, essencial para erradicar a chaga dos corruptores

Autor: HELIO GUROVITZ, jornalista, colunista do jornal OESP; da revista ÉPOCA  e do portal G1
Fonte: OESP- 01/01/17.
Original: Helio Gurovitz , 31 Dezembro 2016 | 16h00
http://alias.estadao.com.br/noticias/geral,lava-jato-e-capitalismo-de-compadrio-o-desafio-e-permitir-a-evolucao-das-instituicoes,10000096323
Enviado por Anand Sampurno (José Brussolo jr);
Acesso RAS em 05jan2017.




  1. Milhões foram às ruas protestar contra a corrupção no Brasil em 2016. O alvo inicial era o PT. Depois, os protestos adquiriram caráter pluripartidário, sob a bandeira da Operação Lava Jato. O juiz SERGIO MORO é visto como herói na luta por um novo Brasil. Uma luta imbuída de certezas morais. A população não se vê representada, descrê dos partidos, cansou dos políticos.

  1. A Lava Jato expôs as entranhas do sistema que une empresas, partidos e Estado. Vieram à tona as contas na Suíça e paraísos fiscais, as joias, bolsas e vestidos, lanchas e carros de luxo, sítios e apartamentos, listas de propinas e malas de dinheiro. Bilionários foram presos, viram-se obrigados a falar a verdade. Políticos perderam mandatos, tornaram-se réus, foram para a cadeia.

  1. A julgar pela megadelação da Odebrecht – auge da Lava Jato –, a devassa não acabou. Mas e depois? O que acontecerá se todos os citados forem punidos? Qual será o impacto na democracia? E na economia? Acabaremos com práticas corruptas, em vigor desde o tempo das sesmarias?

  1. A corrupção também é endêmica em países como China, Índia, Rússia ou Itália. Economistas têm até um termo para definir o sistema baseado nela: “capitalismo de compadrio” (tradução do inglês “crony capitalism”). “É um sistema em que os próximos das autoridades recebem favores de alto valor econômico”, diz o economista STEPHEN HABER, da Universidade Stanford. Podem ser empréstimos subsidiados (leia-se BNDES), monopólios, reservas de mercado ou proteção da concorrência por meio de cartéis e barreiras comerciais. O governante corrupto entra em ação para violar a lei e proteger seus “compadres” capitalistas.

  1. Não é uma questão apenas moral, mas de negócios. Para os políticos, o compadrio é – além de óbvia fonte de enriquecimento – um modo de atrair investimentos (em geral, para a infraestrutura), promover crescimento econômico e ampliar a arrecadação. O empresário, ao tornar-se “sócio” dos políticos por meio da propina, compra uma espécie de seguro contra a expropriação de seu capital pelo Estado – risco sempre presente em países de estrutura institucional precária, ainda mais para investimentos de longa maturação como estradas, usinas, ferrovias, telecomunicações ou petróleo.

  1. O compadrio custa caro por três motivos:
Ø  Primeiro, recursos desviados representam capital mal alocado, distorcem o mercado, inibem a competição onde ela poderia reduzir preços, negam oportunidades a empreendedores inovadores.
Ø  Segundo, o sistema é instável; as relações estão ameaçadas pela mudança de quem está no poder.
Ø  Terceiro, monopólios e cartéis têm efeito dramático na distribuição de riqueza. Geram preços artificialmente altos e consomem, em subsídios, dinheiro que o Estado deveria destinar a áreas onde faz falta.

  1. A alternativa ao compadrio são instituições robustas, que limitem o poder dos políticos de expropriar capital ou de mudar regras econômicas a seu bel-prazer: agências reguladoras estáveis e autônomas, Judiciário independente, Legislativo atuante na fiscalização dos contratos públicos, imprensa livre. Mesmo países com instituições maduras demoraram décadas a criar tal arcabouço. Outros tentaram, mas não conseguiram.

[1] [EXEMPLOS CLÁSSICOS: ESTADOS UNIDOS]
  1. Nos Estados Unidos, eclodiu em 1872 um escândalo de proporções continentais. A Union Pacific, subsidiada para construir uma ferrovia de Leste a Oeste, tinha uma fornecedora exclusiva, a Crédit Mobilier. Não passava de uma sociedade de políticos para desviar dinheiro por meio de superfaturamento. A investigação atingiu nove senadores, 30 deputados e o então vice-presidente, Schuyler Colfax. As punições foram brandas a ponto de um dos acusados, o então deputado James Garfield, se tornar presidente nas eleições de 1880. Foi só na segunda década do século 20 que o país passou a dispor de uma estrutura institucional eficaz para coibir casos como o Crédit Mobilier, e o incentivo à corrupção sumiu.

[2] [EXEMPLOS CLÁSSICOS: ITÁLIA]
  1. Na Itália, a OPERAÇÃO MÃOS LIMPAS – inspiração da Lava Jato – começou a devassar o compadrio em 1992. Dois anos depois, havia mais de 6.000 investigados (entre eles, 872 empresários e 438 parlamentares) e quase 3.000 mandados de prisão. De 4.320 processos, 1.300 resultariam, em dez anos, em condenação ou declaração de culpa. A reação foi feroz. O empresário SILVIO BERLUSCONI entrou na política para fugir da Mãos Limpas. Não sossegou enquanto não a sufocou. Sob protestos, o Parlamento aprovou leis que restringiram as delações premiadas, a publicação de escutas, facilitaram a prescrição de crimes e dificultaram o trâmite judicial. Hoje, o incentivo à corrupção na Itália é maior que antes da OPERAÇÃO MÃOS LIMPAS.

  1. E o Brasil? Fracassará como a Itália? Ou seguirá o exemplo dos Estados Unidos? Nossos parlamentares têm agido como os italianos. Deputados desfiguraram o pacote anticorrupção de iniciativa popular. Como na Itália, senadores investigados na Lava Jato tramam aprovar uma lei contra o abuso de autoridades. As ruas fazem barulho, mas não há sinal de que eles darão trégua.

  1. BERLUSCONI dizia que a Justiça paralisara a economia. Tal argumento, mesmo falho, prospera também aqui. A Lava Jato coincide com a recessão mais longa no Brasil. O investimento em infraestrutura caiu de R$ 131 bilhões em 2014 (2,3% do PIB) para R$ 106 bilhões este ano (1,7%), segundo a consultoria Inter.B. Nossos parlamentares não parecem preocupados em definir uma agenda que traga esse patamar para o mínimo necessário, uns 5%.

  1. Se tiverem sucesso no “acordão” para melar a Lava Jato, o preço econômico será ainda maior. Novos compadres substituirão quem está na cadeia, e a corrupção continuará a drenar riqueza. “O capitalismo de compadrio é uma criação política e tem consequências políticas”, diz HABER. É por meio da democracia que deve ser combatido. O maior desafio do Brasil em 2017 será evitar que a ânsia pela recuperação econômica emperre o amadurecimento institucional, essencial para erradicar essa chaga.

HELIO GUROVITZ, JORNALISTA, COLUNISTA DO ESTADO, DA REVISTA ÉPOCA E DO PORTAL G1
OESP- 01/01/17.

SOBRE A PÁGINA
http://g1.globo.com/mundo/blog/helio-gurovitz/
Como jornalista, atuou nas editorias de exterior e ciência do jornal Folha de S.Paulo. Na revista Exame, cobriu tecnologia e negócios, lançou e dirigiu o suplemento de nova economia Negócios Exame e foi diretor do Portal Exame. Foi, por nove anos, diretor de redação da revista Época, do GRUPO GLOBO, onde hoje mantém uma coluna semanal. Contatos:
Ø  twitter.com/gurovitz

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NOTA DO EDITOR do Blog Ronald.Arquiteto e do Facebook Ronald Almeida Silva:
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RONALD DE ALMEIDA SILVA
[Rio de Janeiro, RJ, 02jun1947; reside em São Luís, MA, desde 1976]
Arquiteto Urbanista FAU-UFRJ 1972
Registro profissional CAU-BR A.107.150-5
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